terça-feira, 29 de janeiro de 2008

A MÚSICA NA SEMANA DE 22: VILLA-LOBOS

MÚSICA NA PROGRAMAÇÃO DA
SEMANA DE ARTE MODERNA DE 22

(Desenho de Luiz de Almeida: Nanquim sobre papel cartão (80 x 120 cm), elaborado para o Módulo "Música na Semana de 22" da exposição Retalhos do Modernismo).
VILLA-LOBOS
(SÍNTESE BIOGRÁFICA E HISTÓRICA)
 Ilustração 1 - Villa-Lobos



Quando da realização da Semana de Arte Moderna de 1922, a música, principalmente os músicos Guiomar Novaes (1894-1979) e Ernâni Braga (1888-1948), levaram mais público ao Teatro Municipal que os literatos, que na verdade haviam planejado "protestos" e não "apresentação" ou "show" artístico. Enquanto o público "enfrentava" os literatos, os músicos "enfrentavam-se" nos bastidores. Villa-Lobos (1887-1959), o “debussysta zangado”, segundo Oswald de Andrade (1890-1954), escandalizou, mas foi o único dentre os demais músicos participantes que conseguiu, após a Semana, constituir-se num dos maiores músicos brasileiros, idolatrado não só no Brasil até os dias atuais. 
Dentre os músicos que participaram dos Festivais da Semana de 22, destacaram-se: Villa-Lobos, Guiomar Novaes, Ernâni Braga, Fructuoso de Lima Vianna (1896-1976), Lucília G. Villa-Lobos (1894-1966), George Marinuzzi (1901-93), Paulina d’Ambrósio (1890-1976), Orlando Frederico, Alfredo Gomes, Alfredo Corazza, Pedro Vieira, Antão Soares, Frederico Nascimento Filho e Maria Emma.
A Semana de Arte Moderna desenvolveu-se de 11 a 18 de fevereiro, tendo os Festivais nos dias 13, 15 e 17, os mais “quentes”, que causaram todo tumulto, criando adeptos, mas também contrários, principalmente na imprensa conservadora paulistana. Oscar Guanabarino (1851-1937), Galvão Muniz, Galeão Coutinho (1897-1951; pseudônimo Cândido – redator-chefe do jornal A Gazeta), Mário Pinto Serva (1881-1962), da Folha da Noite, por exemplo, tornaram-se ferrenhos contrários aos “moços futuristas” – mas que de nada adiantou tanta polêmica, pois os “detonados futuristas”, mesmo sem nenhum planejamento técnico, propiciaram o parto do Modernismo no Brasil e são, principalmente nos tempos atuais, os protagonistas de intermináveis estudos, teses, ensaios e pesquisas.
Nesta postagem, o Retalhos do Modernismo, seguindo seus objetivos, não traz polêmicas, mas sim uma simples Síntese Biográfica e Histórica daquele que foi e é um dos maiores representantes da música brasileira, o compositor, instrumentista e maestro Villa-Lobos, auxiliando estudantes e demais interessados nas suas pesquisas. Na Internet podemos encontrar vasto material sobre Villa-Lobos, todos importantes, tais como o no site do Museu Villa-Lobos (http://www.museuvillalobos.org.br/), no do Itaú Cultural (http://enciclopedia.itaucultural.org.br/) e muitos outros. Mas não podemos esperar que iremos encontrar tudo na Internet. Para conseguirmos conhecimento macro (caso possamos dizer assim), devemos buscar nos livros. Existe um arsenal de obras publicadas - algumas poderão ser encontradas nas “Referências” e na “Bibliografia” no final desta Síntese.
Agora... É degustar Villa-Lobos.

(Luiz de Almeida – Outubro, 2017)

Sobre a Síntese Biográfica e Histórica:
1 – Em letras azuis está a síntese biográfica de Villa-Lobos;
2 – Para facilitar a descrição e a leitura, salvo em descrição de terceiros, o nome de Villa-Lobos foi abreviado para Villa, em vermelho;
3 – Em todos os anos da vida de Villa, mesmo nos que não foram encontrados dados sobre ele, foram adicionados dois “Adendos”: o “Cultural” e o “Brasil”, onde foram descritos dados relevantes do período em cada área, escolhidos pelo autor da Síntese;
4 – As “Referências” e as “Ilustrações” foram numeradas e estão disponibilizadas no final da Síntese. Outras, porém, estão no bojo;
5 – Toda obra utilizada para a pesquisa está descrita no final da Síntese, em: “Bibliografia”. Outras, porém, estão em “Referências” e no bojo;
6 – Todos os endereços de sites e blogs utilizados para a pesquisa estão descritos, também no final da Síntese, em: “Fontes Pesquisadas na Internet” – outros, porém, no bojo;
7 – Se o leitor tenha interesse na Apostila da Síntese, basta solicitar através do “Entre em Contato”, janela disponibilizada no lado direito superior do Blog. O Blog Retalhos do Modernismo envia por e-mail, em pdf, sem nenhum ônus;
8 – Caso o leitor encontre algum dado equivocado ou tenha outros dados e informações sobre Villa, também poderá notificar o Blog através do “Entre em Contato” – e o adicionamento será postado com as devidas referências.

Notas:

1 – Abreviaturas utilizadas na Síntese:
Villa (Villa-Lobos)
MA (Mário de Andrade)
MB (Manuel Bandeira)
SAM (Semana de Arte Moderna de 1922)
p. (Página)
pp. (Páginas)
2 – Cartas, Notas e Textos: conservada a ortografia da edição original.

SÍNTESE BIOGRÁFICA E HISTÓRICA

1887 – 5 de março: nasce Heitor Villa-Lobos, numa casa da Rua Ipiranga, em Laranjeiras - RJ, filho de Raul Villa-Lobos (professor, funcionário da Biblioteca Nacional, autor de livros didáticos) e Noêmia Monteiro Villa-Lobos, filha de músico: Santos Monteiro. Os pais de Villa eram imigrantes espanhóis. Villa ganha um apelido da família: Tuhu;

1888 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: 10 de janeiro: Nasce no Rio de Janeiro, Ernâni Braga, músico, compositor, escritor e poeta. Participou da SAM. Amigo de Villa.
Adendo Brasil: Abolição da Escravatura no Brasil, em 13 de maio.

1889 – 17 de janeiro: provável data do batismo, na Igreja São José;
Adendo Cultural: Machado de Assis lança um dos seus romances realistas mais lidos: Dom Casmurro. 2 de dezembro: nasce em São Paulo, Anita Catarina Malfatti – artista plástica que se transformaria na protagonista do início do Movimento Modernista no Brasil.
Adendo Brasil: Ano da Proclamação da República, em 15 de novembro. Marechal Deodoro da Fonseca (1827-92), com o apoio dos republicanos, demitiu o Conselho de Ministros e seu presidente. Nesse mesmo dia, o marechal assinou o manifesto proclamando a República no Brasil e instalando um governo provisório, assim composto: Marechal Manoel Deodoro da Fonseca: Chefe do Governo Provisório, Aristides da Silveira Lôbo: Ministro do Interior, Tenente-Coronel Benjamin Constant Botelho de Magalhães: Ministro da Guerra, Eduardo Wandenkolk: Ministro da Marinha e Quintino Bocaiúva: Ministro das Relações Exteriores e Interinamente da Agricultura, Comércio de Obras. Em São Paulo, em 14 de dezembro, termina o governo provisório triunvirato, composto por Prudente de Morais (1841-1902), Rangel Pestana (1839-1903) e Joaquim de Souza Mursa (1833-1893) que teria iniciado em 16 de novembro. É nomeado Prudente de Moraes, como presidente do Estado. Seu governo terminará em 18 de outubro de 1890. O conselheiro Antônio Prado era o prefeito de São Paulo. Sua gestão terminará em 1910.

1890 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: 11 de Janeiro: nasce em S. Paulo, Oswald de Andrade. 24 de julho: nasce na cidade de Campinas (SP), o Poeta, autor de Nós, A Dança das Horas, Messidor e outros: Guilherme de Almeida.
Adendo Brasil: Com a Proclamação da República, o Brasil deixou de ser governado por um monarca para ser governado por um presidente da República, pois passou a ser uma República Federativa. 30 de maio: foi entregue ao Governo o esboço da nova Constituição que, de 10 a 18 de junho realizou minuciosa revisão, efetuada, em especial, por Rui Barbosa (1849-1923), melhorando sua redação e modificando sua estrutura. 15 de setembro: realizaram-se as eleições em todos os estados brasileiros. 15 de novembro: instalou-se a Assembleia Constituinte, no Rio de Janeiro, no Paço da Boa Vista. A nova Constituição seria promulgada no ano seguinte. Foi promulgado o Código Penal Brasileiro, antes da Constituição. O governo, para incentivar a política de imigração estrangeira, para substituir a mão-de-obra escrava, conseguiu a entrada no país de aproximadamente 184 mil imigrantes, maioria se dirigindo ao Estado de São Paulo.
1891 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: 21 de maio: Nasce Antônio Garcia Moya, em Arfete, Granada, Espanha. Vai chegar ao Brasil em 1895. Foi desenhista e arquiteto. Foi denominado de “o poeta da pedra”. Participou da Semana de 22. Foi o realizador da parte arquitetônica do Monumento do Ipiranga, São Paulo e o ilustrador da edição original de Paulicéia Desvairada, de Mário de Andrade (1893-1945), editado em 1922. 12 de abril: Nasce em Genebra, Suíça, o artista plástico John Graz, que participaria da Semana de 22. Faleceu em 1980, em São Paulo. 21 de julho: nasce em Vilma, capital da Lituânia, o artista plástico Lasar Segall.
Adendo Brasil: O Rio de Janeiro, com seus 522 mil habitantes, constituía o único grande centro urbano. 24 de fevereiro: promulgada a primeira Constituição Republicana Brasileira, que estabeleceu os três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, harmônicos e independentes entre si. Em 25 de fevereiro aconteceu a primeira eleição presidencial do Brasil e foi indireta, desobedecendo a Constituição recém-formada. Foram candidatos à presidência: Marechal Deodoro da Fonseca, Prudente de Morais (1841-1902), Marechal Floriano Peixoto (1839-95) e José Higino Duarte Pereira (1847-1901). À vice-presidência se candidataram: o Almirante Eduardo Wandenkolk (1839-1902) e Marechal Floriano Peixoto. Foi eleito para presidente: Marechal Deodoro da Fonseca, com 129 votos contra 97, atribuídos ao paulista Prudente de Morais. A vice-presidência ficou com Marechal Floriano Peixoto. 3 de novembro: Deodoro fecha o Congresso, prometendo para o futuro novas eleições e uma revisão na Constituição. 23 de novembro: Deodoro renuncia. Com a renúncia, Floriano Peixoto assumiu a presidência e governou no regime que ficou conhecido como "mão de ferro" até o final do mandato, em 1894.

1892 – A família de Villa, por perseguição política, passa a residir em Sapucaia – RJ e em Bicas e Cataguases – MG, permanecendo até meados de 1893;
Adendo Cultural: 17 de janeiro: morre em S. Paulo o regente, compositor, pianista e crítico musical, Alexandre Levy. 20 de março: nasce em S. Paulo o escritor Menotti Del Picchia. 30 de maio: Em Fortaleza, na Rua Formosa (atualmente Barão do Rio Branco), Antônio Sales e outros fundam a “Padaria Espiritual”, cujo artigo primeiro, dos quarenta e sete do Programa de Instalação, declara o objetivo principal: “I – Fica organizada, nesta cidade da Fortaleza, capital da Terra da Luz, antigo Siará Grande, uma sociedade de rapazes de Lettras e Artes denominada – Padaria Espiritual, cujo fim é fornecer pão de espirito aos socios em particular e aos povos em geral”[1]. A Padaria Espiritual pode ter sido o primeiro movimento com tendências de cunho modernista no Brasil. 27 de outubro: nasce em Quebrangulo, sertão de Alagoas, o escritor Graciliano Ramos. Nasce em Rio Claro (SP), Ignácio da Costa Ferreira, desenhista que ficou conhecido pelo seu pseudônimo: Ferrignac. 
Adendo Brasil: 26 de janeiro: sancionada pelo presidente Floriano Peixoto a primeira lei eleitoral da República, logo após a promulgação da Constituição de 1891. 6 de fevereiro: regulamentada a primeira lei eleitoral do Estado de São Paulo, de 27 de novembro de 1891. Falece no Rio de Janeiro, em 23 de agosto, o Marechal Deodoro da Fonseca.

1893 – A família retorna a residência para o Rio de Janeiro. Villa começa a aprender clarinete e violoncelo com o pai. Em entrevista concedida em 1957, o próprio compositor irá declarar:
Desde a tenra idade iniciei a vida musical, pelas mãos de meu pai, tocando um pequeno violoncelo. Meu pai, além de ser homem de aprimorada cultura geral e excepcionalmente inteligente, era um musico prático, técnico e perfeito. Com ele, assistia sempre a ensaios, concertos e óperas, a fim de habituar-me ao gênero de conjunto instrumental.
Aprendi também, a tocar clarinete e era obrigado a discernir o gênero, estilo, caráter e origem das obras, como a declarar com presteza o nome da nota, dos sons ou ruídos que surgiam incidentalmente no momento, como, por exemplo, o guincho da roda de um bonde, o pio de um pássaro, a queda de um objeto de mental, etc. Pobre de mim quando não acertava...[1.1]
Adendo Cultural: 19 de janeiro: nasce em Petrópolis (RJ), a pianista Magda Tagliaferro. 16 de maio: nasce no Rio de Janeiro, Ronald de Carvalho (poeta). 9 de outubro: na cidade de S. Paulo, nasce Mário de Andrade, poeta, ensaísta, romancista, contista, epistolográfico, folclorista, contista, pesquisador, musicólogo, professor, crítico de arte, cronista, diretor de cultura, “trezentos, trezentos e cinquenta”, etc.
Adendo Brasil: Iniciava a formação, às margens do Reio Vaza-Barris, no sertão da Bahia, em uma fazenda abandonada, uma povoação conhecida como Arraial de Canudos, liderada por Antônio Vicente Mendes Maciel, conhecido como Antônio Conselheiro (1830-1897).

1894 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: 28 de fevereiro: nasce em São João da Boa Vista (SP), a pianista Guiomar Novaes. No Rio de Janeiro, o autor teatral Arthur Azevedo (1855-1908) lança campanha para construção de um teatro. Foi criada Lei Municipal determinando a construção, mas não foi cumprida, apesar da existência do imposto para arrecadação de fundos, que nunca foi utilizado.
Adendo Brasil: Prudente de Morais assume a presidência da República. Fundação da Escola Polytechina de São Paulo.
1895 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: Nasce na cidade de Itapetininga (SP), Antonio Gomide, artista plástico, cenógrafo e professor. 26 de julho: nasce em de São José dos Campos (SP), Cassiano Ricardo Leite, o poeta. 2 de novembro: nasce em São Paulo, Antonio Paim Vieira, desenhista, retratista, ceramista, ilustrador, professor de Artes. Participou da Semana de 22.
Adendo Brasil: 29 de junho: Morre Floriano Peixoto.
1896 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: 25 de fevereiro: nasce em Nova Friburgo, RJ, o pintor Alberto da Veiga Guignard. Nasce em Lucca, Itália, Alfredo Volpi (faleceu em 1988), Muda-se com os pais para São Paulo em 1897. Irá participar do Grupo Santa Helena em 1930.
Adendo Brasil: Campos Sales (1841-1913): presidente do estado de São Paulo é eleito em 31 de maio.
1897 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: 23 de abril: nasce no Rio de Janeiro, Alfredo da Rocha Viana Filho, o “Pixinguinha”, compositor, flautista, saxofonista e arranjador. 28 de julho: numa sala do Museu Pedagogium, Rua do Passeio (RJ), realizou-se a sessão inaugural da Academia Brasileira de Letras, sob a presidência do escritor Machado de Assis (1839-1908) e com a presença de dezesseis acadêmicos. O discurso inaugural foi feito por Joaquim Nabuco (1849-1910). Nasce em Itapetininga (SP), a decoradora Regina Gomide, irmã do artista plástico Antônio Gomide (1895-1967). Foi casada com o artista plástico suíço John Graz (1891-1980). 3 de setembro: nasce em S. Paulo o compositor, professor e regente Francisco Mignone. 6 de setembro: nasce no Rio de Janeiro: Emiliano Augusto Cavalcanti Albuquerque Mello, o “Di Cavalcanti”. 27 de setembro: nasce Benedito Luís Rodrigues de Abreu, o Poeta, na fazenda Picadão, município de Capivari (SP). 4 de novembro: nasce no Rio de Janeiro o músico, compositor e regente Lorenzo Fernandez.
Adendo Brasil: Janeiro: inauguração do telégrafo submarino entre Rio de Janeiro e Pernambuco. 22 de setembro: morte do Antonio Conselheiro (Antônio Vicente Mendes Maciel). Nasceu em Quixeramobim (Ceará) em 13 de março de 1830 e faleceu em Canudos (Bahia) em 22 de setembro, líder da comunidade da cidade de Canudos (Bahia), onde ocorreu a Guerra dos Canudos. Em outubro: fim da Guerra dos Canudos, que morreram mais de 25 mil pessoas e a cidade de Canudos foi destruída. O escritor Euclides da Cunha (1866-1909) era repórter do O Estado de S. Paulo e foi designado para fazer a cobertura dos acontecimentos em Canudos. No livro Os Sertões, Euclides descreve como era a comunidade de Canudos liderada pelo beato Antonio Conselheiro. Pudente de Morais era o presidente do Brasil. 12 de dezembro: Ouro Preto deixou de ser a capital de Minas Gerais, cedendo lugar para a recém-construída “Cidade de Minas”, que, em 1991, passaria a se chamar Belo Horizonte.
1898 – (Nenhum registro encontrado).
Adendo Cultural: Dia 15 de fevereiro, o Teatro São José, construído próximo ao largo de São Gonçalo (hoje Pça João Mendes), em São Paulo, foi destruído por um incêndio. São Paulo ficava sem teatro. 12 de março, em Santos (SP): nasce o escritor Ribeiro Couto (faleceu em 1963). 21 de março: nasce em S. Paulo o pianista, compositor e maestro João de Sousa Lima. 4 de agosto: nasce em Pinhal, município de Santa Maria (RS), o poeta Raul Bopp (faleceu em 1984), autor de Cobra Norato. 20 de setembro: nasce em S. Paulo o escritor modernista, crítico de artes Sérgio Milliet (faleceu em 1966). 8 de dezembro: nasce em Rio Claro (SP), Yan de Almeida Prado – irá participar da Semana de 22 com trabalhos realizados conjuntamente com Antônio Paim Vieira (1895-1988).
Adento Brasil: Campos Sales inicia seu governo como presidente da República que findará em 1902. Vital Brasil (1865-1950), no Instituto Bacteriológico de São Paulo, descobre o primeiro soro eficaz contra a picada de cobras.

1899 – 18 de julho: falece seu pai, vitimado pela varíola. A pedido da mãe escreve uma cançoneta: Os Sedutores. Passa a tocar violoncelo em teatros, cafés e bailes. Foi sua tia Zizinha (Maria Carolina Rangel) que lhe apresentou os Prelúdios e Fugas do Cravo bem temperado de J. S. Bach, compositor que lhe serviu como fonte de inspiração para a criação das nove Bachianas Brasileiras;
Adendo Cultural: 16 de junho: nasce no Rio de Janeiro, o poeta Dante Milano. 14 de julho: nasce em Campinas (SP), o escritor modernista: Carlos Tácito Alberto de Almeida Araújo (Tácito de Almeida, faleceu em 1940), irmão do poeta Guilherme de Almeida (1890-1969). 10 de Agosto, na cidade de Amparo da Barra Mansa (RJ): nasce Flávio de Carvalho (faleceu em 1973), artista plástico. 19 de dezembro: nasce no Recife, Vicente do Rêgo Monteiro, artista plástico. Faleceu em 1970.
Adendo Brasil: Sugerido por Adolpho Lutz (1855-1940), o Governo do Estado de São Paulo criou, na capital, o Instituto Soroterápico (futuro Butantã), que seria dirigido por Vital Brasil.

1900 – Inicia o Curso de Humanidades no Mosteiro de São Bento. Escreve A Panqueca, para violão;
Adendo Cultural: Nasce, em Belo Horizonte (MG), a artista plástica modernista Zina Aita (faleceu na Itália em 1967). Nasce em Belém do Pará, o artista plástico Ismael Nery.
Adendo Brasil: Comemorações do IV Centenário do Descobrimento do Brasil. 7 de maio: em São Paulo, foi inaugurada a primeira linha de bonde elétrico, que partia do Largo São Bento com destino ao bairro da Barra Funda.

1901 - A família muda-se para MG, primeiro para Bicas e depois para Cataguazes;
Adendo Cultural: 17 de maio: nasce em S. Paulo, o Poeta Luís Aranha. 25 de maio: nasce em S. Paulo, o escritor António Castilho de Alcântara Machado d’Oliveira. 3 de junho: nasce José Lins do Rego, escritor paraibano. Em Juiz de Fora (MG), nasce Murilo Mendes (poeta). 7 de novembro: no Rio de Janeiro nasce Cecília Meireles (poeta).
Adendo Brasil: 19 de outubro: Santos Dumont (1873-1932), pilotando o balão nº 6, dá a volta em torno da torre Eiffel, em Paris, percorrendo 11 quilômetros.

1902 – Inicia o aperfeiçoamento da técnica de violoncelo com Benno Niederberger, concertista e professor;
Adendo Cultural: Anita Malfatti (1889-1964) inicia seus primeiros estudos de desenho e pintura com a mãe. 25 de julho: foi inaugura a primeira exposição coletiva nacional de relativa significância realizada em São Paulo, capital, a “Exposição de Belas Artes e Artes Industriais”, em um edifício localizado no Largo do Rosário, exibindo 406 trabalhos de pintura, escultura, artes industriais, cerâmica, cutelaria, desenho, arquitetura e fotografia, de artistas nacionais e estrangeiros residentes no País. Tarsila do Amaral (1886-1973), com 16 anos, viaja à Europa com os pais, matriculando-se no Colégio Sacré-Coeur, em Barcelona, quando inicia suas primeiras experiências com pintura. 24 de janeiro: nasce em Porto Alegre (RS) aquele que seria o “divulgador da estética modernista” no Rio Grande do Sul, Augusto Meyer. 31 de outubro: nasce em Itabira (MG), o poeta Carlos Drummond de Andrade, ano que foi publicado Os Sertões, de Euclides da Cunha.
Adendo Brasil: 15 de novembro: Rodrigues Alves (1848-1919) assume o poder e começa a reconstruir e sanear o Rio de Janeiro. Irá governar até 1906.

1903 – Vai morar com sua tia Zizinha. Começa a frequentar os “chorões”;
Adendo Cultural: 5 de junho: início das obras do futuro palco da Semana de Arte Moderna de 1922, o Teatro Municipal de São Paulo, projeto de Ramos de Azevedo. 29 de setembro: Nascimento do artista plástico Cândido Portinari, numa fazenda próxima de Brodowski (SP). Com 9 anos, chega ao Brasil, Victor Brecheret (1894-1955). 15 de outubro: o prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos (1836-1913), nomeado pelo presidente Rodrigues Alves, lança edital com Concurso para a apresentação de projetos para a construção do Theatro Municipal. 7 de novembro: nasce Ary Barroso, em Ubá (MG).
Adendo Brasil: 28 de maio: em São Paulo, realiza-se o II Congresso Socialista (o I é de 1892), que funda o Partido Socialista do Brasil. No Rio de Janeiro acontece novo surto de febre amarela. Também no Rio, em agosto, acontece uma greve geral pela jornada de 8 horas e por melhores salários. Oswaldo Cruz (1872-1917) inicia campanha de saneamento para combater a febre amarela no Rio de Janeiro.

1904 – Matricula-se no curso noturno do Instituto Nacional de Música, RJ, para estudar violoncelo. Não existem registros que Villa realmente frequentou as aulas;
Adendo Cultural: Inaugurado o primeiro cinema brasileiro no Rio de Janeiro. 15 de julho: nasce na cidade de Lambari, Minas Gerais, a poetisa Henriqueta Lisboa.
Adendo Brasil: 1º de maio: Jorge Tibiriçá Piratininga (1855-1928) é eleito presidente do estado de São Paulo. Irá governar até maio de 1908. 31 de outubro: Aprovada a lei de vacinação obrigatória contra a varíola. No Rio de Janeiro explode a revolta popular contra a vacinação obrigatória. Washington Luís (1869-1957) é eleito deputado estadual por São Paulo. 15 de novembro: Rodrigues Alves sancionou a nova lei eleitoral da República, que tomou o n° 1.269, conhecida pelo nome de Lei Rosa e Silva. Essa lei revogou a Lei Eleitoral n° 35 de 26 de janeiro de 1892.

1905 – Vende parte dos livros herdados do pai e inicia, com o dinheiro arrecadado e o violoncelo debaixo do braço, sua primeira viagem ao Norte (passou por Espírito Santo, depois Bahia e Pernambuco), pesquisando seu folclore e entrando em contrato com musicas diferentes das que estava acostumado a ouvir: as modas caipiras, tocadores de viola sertaneja, repentistas, o aboio dos vaqueiros e outros tipos que mais tarde viriam a universalizar-se através de suas obras. Encantou-se mais com as regiões norte e nordeste, com paisagens e ruídos diferentes do que estava acostumado. [Nota: Existe entre os biógrafos uma dúvida muito grande quanto às viagens de Villa pelo Brasil - esta no Norte e as outras que vieram nos anos posteriores. Alguns chegam afirmar que algumas das viagens não tiveram o itinerário mencionado pelo próprio Villa – este, acreditam, inventou muita coisa a respeito – e também afirmam até mesmo que algumas viagens não foram realizadas. O escritor Paulo Renato Guérios, no seu: Heitor Villa-Lobos: o caminho sinuoso da predestinação. Ed. do Autor, Curitiba (PR), 2009, faz um relato espetacular a respeito desse assunto.];
Adendo Cultural: 2 de janeiro: início das obras para construção do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. O artista plástico Lasar Segall (1891-1957) inicia estudos de arte na Academia de Desenho (em Vilna), do mestre Lev Antokolski (1872-1942). Surge no Rio de Janeiro a primeira revista brasileira de histórias em quadrinhos para crianças: O Tico-Tico. Ano da inauguração da Pinacoteca do Estado de São Paulo, gestão do presidente paulista Jorge Tibiriçá Piratininga, com a participação do mecenas e senador estadual Freitas Valle (1870-1958). 17 de dezembro: nasce o escritor Érico Veríssimo.
Adendo Brasil: Lançadas as candidaturas para presidente e vice-presidente de Afonso Pena (1847-1909) e Nilo Peçanha (1867-1924). A Light, empresa canadense fundada em 1899, começa sua atuação no Rio de Janeiro. Já atuava na cidade de São Paulo. Washington Luís integrava ativamente a Assembleia Nacional Constituinte defendendo a autonomia dos municípios frente aos governos estaduais e federal.

1906 – Recebe a proposta do pai da moça que então namorava, para tornar-se representante de sua indústria no Sul – não deu certo: nem a representação e nem o namoro;
Adendo Cultural: Criado em S. Paulo o Conservatório Dramático e Musical. Ocorre mudança na direção da Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, com Eliseu Visconti (1866-1944) sendo eleito para substituir Henrique Bernardelli (1858-1936). 12 de julho: morre no Rio de Janeiro o músico, compositor, regente, organista e trompetista Henrique Alves de Mesquita. 10 de outubro: morre o compositor mineiro Francisco Magalhães do Valle.
Adendo Brasil: No Rio de Janeiro acontece a Conferência Pan-Americana. 23 de outubro: primeiro voo em avião por Santos Dumont, em Paris. Em Taubaté (SP) é assinado o “Convênio de Taubaté”, visando favorecer os cafeicultores. 15 de novembro: posse do presidente da República Afonso Pena e o vice Nilo Peçanha. Irão governar até 1909.

1907 – Curta passagem pelo Instituto Nacional de Música do Rio de Janeiro (depois Escola de Música da UFRJ). Meses depois, abandona o trabalho acadêmico e inicia então a sua terceira viagem que o levaria a Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso;
Adendo Cultural: 1º de fevereiro: nasce em Tietê (SP), o músico, maestro, compositor e pianista Camargo Guarnieri. No Rio surge a revista Fon-Fon! - que foi o reduto dos simbolistas. O artista espanhol Pablo Picasso (1881-1973), (Registrado com o nome: Pablo Diego José Francisco de Paula Juan Nepomuceno María de los Remedios Cipriano de la Santísima Trinidad Martyr Patricio Clito Ruíz y Picasso), lança o Cubismo.
Adendo Brasil: Em maio: começa uma greve geral em São Paulo, onde os trabalhadores reivindicam a jornada de 8 horas de trabalho e aumento salarial. A greve durou um mês.

1908 – Conclui os Cânticos Sertanejos. Muda-se para Paranaguá – PR, provavelmente buscando trabalho. Nessa cidade chegou a participar de uma banda da Associação dos Empregados do Comércio que animava os bailes da região e foi nessa cidade que Villa fez sua estreia como maestro, no extinto Teatro Santa Cecília;
Adendo Cultural: 29 de setembro: morte de Machado de Assis, escritor e fundador da Academia Brasileira de Letras. No Rio de Janeiro é lançado o filme do cinematógrafo Pathé, Nhô Anastácio Chegou de Viagem, considerado a primeira comédia nacional. Surge no Rio a revista Careta, reduto dos parnasianos.
Adendo Brasil: 7 de abril: o socialista Gustavo de Lacerda (1854-1909), funda a Associação de Imprensa, mais tarde Associação Brasileira de Imprensa (ABI), com objetivo de defender a liberdade de expressão e os interesses dos jornalistas. Em maio: aprovada é aprovada a Lei do Serviço Militar obrigatório, iniciativa do marechal Hermes da Fonseca (1855-1923), então Ministro da Guerra.

1909 – Retorna ao Rio de Janeiro. 6 de junho: participa, no Instituto Nacional de Música, de uma apresentação tocando violoncelo e acompanhado por Ernesto Nazareth, na peça O Cisne, de Saint-Saens;
Adendo Cultural: Felipo Tommaso Emilio Marinetti (1876-1944), escritor italiano, lança o Primeiro Manifesto Futurista no jornal Le Figaro, que irá influenciar os escritores modernistas, principalmente Oswald de Andrade (1890-1954), ano que este inicia sua carreira de jornalista. 14 de julho: inauguração do Teatro Municipal do Rio de Janeiro pelo presidente Nilo Peçanha com capacidade para 1.739 espectadores. 15 de agosto: assassinato do escritor Euclides da Cunha. 13 de novembro: Guiomar Novaes chega a Paris (França), com bolsa outorgada pelo Governo do Estado de São Paulo, para estudar durante quatro anos. Munida de uma carta de apresentação de Luigi Chiaffarelli (Nasceu em Isernia (Itália), em 2 de setembro de 1856. Considerado o maior pedagogo do piano, chegou no Brasil em 15 de agosto de 1880. Faleceu em São Paulo, em 16 de junho de 1923), ao seu colega Isidor Philipp (1863-1958). Guiomar inscreveu-se no concurso de admissão ao Conservatório, sendo aprovada em primeiro lugar entre 388 candidatos para 11 vagas, das quais somente duas reservadas a estrangeiros. Novembro: Joaquim José de Carvalho (1850-1918) funda a Academia Paulista de Letras.
Adendo Brasil: 15 de junho: morre o presidente Afonso Pena. Posse de Nilo Peçanha. Seu governo terminará no ano seguinte. A campanha para presidência da República, em 1909-10, foi a primeira efetiva disputa eleitoral da vida republicana. O marechal Hermes da Fonseca, sobrinho de Deodoro, saiu candidato com o apoio do Rio Grande do Sul, de Minas Gerais e dos militares. São Paulo, na oposição, lançou a candidatura de Rui Barbosa, em aliança com a Bahia. Santos Dumont, em 13 de novembro, em Paris, apresenta outro avião construído por ele, o Demoiselle, oito vezes menor que o 14-Bis, e capaz de voar a 96 km por hora.

1910 – Viaja com um grupo de mambembe pelas cidades do litoral, até dissolver-se em Recife, por dificuldades financeiras. Villa continua viagem para o Norte, com escala em Fortaleza, onde se apaixonou por uma cearense, Carmem. Ficou sem dar notícias da sua vida para ninguém e nem para a mãe Noêmia. Esta, informada de que ele morrera, havia mandado celebrar missa pelo repouso da alma inquieta do filho[2]. Começa a escrever Danças Características Africanas;
Adendo Cultural: Anita Malfatti, em agosto, financiada pelo seu tio e padrinho, Jorge Krug (falecido em 1919), embarca para Alemanha no navio Cap Arcona, chegando a Berlim no dia 7 de setembro. Iniciou os estudos de pintura no ateliê do artista Fritz Burger (1867-1916), o seu primeiro mestre, onde estudou o “segredo da composição da cor” e as teorias de subdivisão da cor. Em Londres acontece a primeira Exposição Pós-Impressionista (Manet e outros pós-impressionistas), organizada por Roger Fry. Após o manifesto geral dos pintores futuristas, a Igreja da Europa impõe ao clero um “juramento anti-modernista”. Ano que o expressionismo alemão ganha força. A Pinacoteca do Estado de São Paulo é constituída oficialmente. 11 de dezembro: nasce no Rio de Janeiro, Noel Rosa – compositor, cantor, bandolinista e violonista.
Adendo Brasil: 1º de março: Hermes da Fonseca vence as eleições para presidente e em 15 de novembro toma posse, abalando a “política do café com leite”, pondo em prática a chamada “política das salvações”, visando assim acabar com as oligarquias cafeeiras e concentrar o poder. Durante o governo de Hermes da Fonseca ocorreu a Revolta da Chibata, no Rio de Janeiro, de 22 a 27 de novembro. Foi um levante de cunho social, realizado em subdivisões da Marinha, sediadas no Rio de Janeiro. O objetivo era por fim às punições físicas a que eram submetidos os marinheiros, como as chicotadas, o uso da santa-luzia e o aprisionamento em celas destinadas ao isolamento. Os marinheiros requeriam também uma alimentação mais saudável e que fosse colocada em prática a lei de reajuste de seus honorários, já votada pelo Congresso. Hermes da Fonseca governou até 1914. O ano de 1910 a tuberculose, considerada Mal do Século, matou mais 3 mil pessoas no Rio de Janeiro.

1911 – Conclui suas viagens e retorna ao Rio de Janeiro;
Adendo Cultural: Anita Malfatti matricula-se na Academia Lewin Funcke, cujo professor era Franz Heinrich Louis Corinth, que utilizava o pseudônimo de Lovis Corinth (1858-1925), pintor expressionista alemão. Na XXII Exposição da Primavera em Berlim, o termo expressionismo foi aplicado pela primeira vez. Em agosto: Oswald de Andrade funda o semanário humorístico O Pirralho. Mário de Andrade (1893-1945) ingressa no Conservatório Dramático e Musical, em São Paulo. 12 de setembro: com apresentação da ópera Hamlet, de Ambrósio Thomas, é inaugurado o Teatro Municipal de São Paulo. A Lei nº 1.271, de 21 de novembro, assinada pelo então presidente do Estado de São Paulo, dr. Manoel Joaquim de Albuquerque Lins (1852-1926), no seu bojo, dispõe sobre a organização da Pinacoteca do Estado de São Paulo e, em 14 de dezembro, acontece a I Exposição Brasileira de Belas-Artes. 14 de setembro: Morre o poeta Raimundo Correia.
Adendo Brasil: Ano de lançamento da pedra fundamental da nova catedral de São Paulo, a Catedral da Sé, que levaria 41 anos para ser inaugurada. Hermes da Fonseca, eleito presidente da República, põe em prática a chamada “política das salvações”, visando a acabar com as oligarquias cafeeiras e a concentrar o poder.

1912 Villa retoma os estudos das partituras dos compositores clássicos e românticos. Viaja para Bahia. Em abril (15) apresenta-se em Belém do Pará, no Teatro da Paz.  Em julho (23) e setembro (7), em Manaus, no Teatro Amazonas. Escreve a ópera Izaht, fusão de duas óperas: Aglaia e Elisa (1910). Regressa ao Rio de Janeiro. 1º de novembro: é convidado a tocar na casa de Lucília Guimarães (formada em solfejo, piano e canto coral e conhecedora da música erudita), com quem se casará em 1913. A própria Lucília narra esse encontro com Villa:
- Foi no dia de todos os santos (01/11/1912) que recebemos a visita de Villa-Lobos trazido por um amigo de meus pais, Arthur Alves, o motivo era que iríamos ouvir um rapaz que tocava muito bem violão (...). A noitada de música correu muito bem, extremamente agradável e, para nós foi um sucesso o violão nas mãos de Villa-Lobos. Terminando sua exibição, Villa-Lobos, manifestou desejo de ouvir a pianista, e toquei, a seguir, alguns números de Chopin, cuja execução me pareceu ter impressionado bem na técnica e na interpretação. Villa-Lobos, porém se sentiu constrangido; talvez mesmo inferiorizado, pois naquela época o violão não era um instrumento de salão, de música de verdade, e sim instrumento vulgar de chorões e seresteiros. Subitamente, vencendo como que uma depressão, declarou que seu verdadeiro instrumento era o violoncelo, e que fazia questão de combinar uma reunião em nossa casa, para se fazer ouvir em violoncelo.[2.1]
Adendo Cultural: Oswald de Andrade viaja para a Europa. O Senador José de Freitas Valle, político paulista influente, passa a receber na sua residência, na Vila Kyrial, toda a intelectualidade paulista (escritores, músicos, artistas plásticos, arquitetos, etc.). Oswald de Andrade retorna da Europa com o “Manifesto Futurista” do poeta italiano Marinetti, publicado pelo jornal Le Figaro, em 1909. Acontece a Exposição Futurista em Paris. 22 de abril: Criação do Pensionato Artístico do Estado de São Paulo, através do Decreto nº 2.234, sociedade que promovia concertos e espetáculos com virtuosos, conjuntos de câmara e orquestras sinfônicas.  
Adendo Brasil: Em S. Paulo, 17 de maio: devido o aumento da infração, começam as greves operárias reivindicando aumento de salário.

1913 – Casa-se com Lucília Guimarães. O casamento acontece no dia 12 de novembro, a contra gosto da mãe de Lucília. Permanece morando com a família de Lucília na Rua Fonseca Teles, n.º 7, em São Cristóvão. Ganha a vida tocando, de dia, na Confeitaria Colombo e, à noite, no Assírio – restaurante localizado no Teatro Municipal. Morre a mãe de Lucília;
Adendo Cultural: Mário de Andrade é contratado como professor do Conservatório de São Paulo, para lecionar História da Música. Em março: Lasar Segall realiza sua primeira exposição em São Paulo, inaugurada no dia 2 de março e encerrada a 5 de abril, à Rua São Bento, 85. Expos também em Campinas (SP), em junho, no Centro de Ciências, Letras e Artes. 19 de outubro: Nasce no Rio de Janeiro, Vinícius de Moraes.
Adendo Brasil: 28 de junho: morre o ex-presidente Campos Sales.

1914 – Compõe Farrapos - op. 47, solo para piano. Essa composição, em 1917 passa a fazer parte das Danças características africanas, transformada em Farrapós – op.47 nº 1. Compõe também: Tarantella;
Adendo Cultural: Em Zurique, Nova Iorque e Paris, surgem as primeiras manifestações do Dadaísmo. Lima Barreto (1881-1922) publica Numa e a Ninfa. Cassiano Ricardo (1895-1974) publica Dentro da Noite. Anita Malfatti, preocupada em conseguir uma bolsa do Pensionato Artístico do Estado para aprimorar seus estudos em Paris, preparou sua primeira mostra individual, inaugurada no dia 23 de maio, num salão no primeiro andar da Casa Mappin Stores, Rua 15 de Novembro, 26, em São Paulo, permanecendo aberta até junho, com o título: “Exposição de Estudos de Pintura Annita Malfatti”. Expos 33 obras: gravuras, desenhos, esboços, aquarelas e óleos. 25 de junho: Guiomar Novaes estreia oficialmente no Municipal do Rio de Janeiro. No final do ano, Anita Malfatti viaja aos Estados Unidos, Nova York, para continuar seus estudos. 18 de novembro: nasce em Restinga Seca (RS), Iberê Camargo.
Adendo Brasil: 15 de janeiro: Washington Luís toma posse como prefeito da cidade de São Paulo. Deixará a prefeitura somente em 16 de agosto de 1919. 1º de março, Venceslau Brás (1868-1966) elege-se presidente da República e toma posse em 15 de novembro. É o retorno da política do “café-com-leite”. 4 de agosto: a Alemanha declara guerra à França. Inicia-se a Primeira Grande Guerra.

1915 – Em janeiro e fevereiro estreia como compositor e realiza os primeiros concertos com suas obras, em Friburgo, acompanhado de Lucília e Agenor Bens. Na ocasião, ele ao violoncelo, Lucília ao piano e Agenor na flauta, tocou-se o Trio em dó menor. Lucília tocou um Estudo de Chopin e uma das Danças Africanas, de 1914: Farrapos. Em julho, estreia no RJ, em concerto patrocinado pela Sociedade de Concertos Sinfônicos e sob a regência do patriarcal Francisco Braga, no Teatro São Pedro (João Caetano). Atuou como violoncelista na orquestra. 13 de novembro: realiza o primeiro concerto com obras exclusivamente suas, no salão do Jornal do Commercio. Participaram desse concerto, além de Lucília ao piano, a convite do próprio Villa: Sylvia de Figueiredo (pianista), Humberto Milano (violinista), Frederico Nascimento Filho (barítono) e Oswaldo Allionni (violoncelista);
Adendo Cultural: No final de 1914, Anita Malfatti retornara aos EUA. Em Nova York, matriculou-se na tradicional escola Art Students League, onde teve aulas com Georg Brant Bridgman (1864-1943) e Dimitri Romanovsky (s.d.–1971). Não teve nenhum interesse em estudar gravuras e então matriculou-se na Independent School of Art. Lá conheceu o pintor e filósofo Homer Boss (1882-1956). 11 de novembro: Guiomar Novaes participa do recital no Aeolian Hall, em Nova York.
Adendo Brasil: Nilo Peçanha toma posse com a retaguarda das tropas federais. É aprovado o Código Civil Brasileiro, disciplinando o Direito privado. 8 de setembro: o gaúcho Pinheiro Machado, nascido em 8 de maio de 1851, político influente na esfera federal, é assassinado no Rio de Janeiro. Devido a carestia reinante, as greves operárias são intensificadas em todo o país.

1916 – Compõe, em memória de Mozart, uma “Sinfonia” (1ª Sinfonia - Op. 112 - ?). Essa afirmação de compor em memória de Mozart foi dada pelo próprio Villa a Arnaldo Estrela[3]. Compõe: Naufrágio de Kleonicos;
Adendo Cultural: 28 de fevereiro: Guiomar Novaes estreia em Boston. Em 6 de junho faz sua estreia com orquestra no Festival de Norfolk. Em 18 de julho, acompanhada pela Civic Orchestral Society, apresenta-se no Madison Square Garden para um público de aproximadamente 6 mil pessoas. Em agosto, Anita Malfatti retorna ao Brasil. Tarsila do Amaral começa a trabalhar no ateliê de William Zadig (1884-1952). No Rio de Janeiro acontece a Exposição Geral de Belas Artes.
Adendo Brasil: É publicado por Álvaro Bomilcar (1874-1957) estudo sobre o preconceito de raça no Brasil. Altino Arantes Marques (1876-1965), em 1º de maio assume como presidente eleito do estado de São Paulo. Governará até maio de 1920. Promulgado o Código Civil Brasileiro que fora aprovado em 1915, e Implantado o Serviço Militar Obrigatório no território nacional.

1917 – Compõe a 2ª Sinfonia – Op. 160. Fevereiro: realiza o segundo concerto com obras exclusivamente suas, também no salão do Jornal do Commercio. É apresentado a Darius Milhaud, compositor francês, secretário do Embaixador da França no Brasil, Paul Claudel. Compõe os bailados Amazonas e Uirapuru, primeiros marcos do seu estilo definitivo. Compõe também: Myremis e Tédio da Alvorada. A partitura de Myremis está extraviada, não podendo assim determinar se ela foi mesmo composta em 1917;
Adendo Cultural: Di Cavalcanti muda-se para São Paulo e começa a frequentar a Faculdade de Direito do Largo São Francisco – e realiza sua primeira exposição individual, em abril, na redação de A Cigarra, localizada na Rua Direita, em São Paulo. Começa a frequentar o ateliê do pintor impressionista alemão George Elpons (1865-1939). 17 de maio: Freitas Valle dá início ao 1º Ciclo de Conferências na Villa Kyrial, terminando em 16 de agosto. Tarsila do Amaral, em São Paulo, estuda com Pedro Alexandrino (1856-1942). Em 12 de dezembro, Anita Malfatti organiza nova exposição em sala térrea cedida pelo Conde Lara [Antônio de Toledo Lara – empresário do ramo de café e empreendedor. Nasceu em Tiete (SP), em 21/12/1864 e faleceu em São Paulo, em 20/4/1935], na Rua Libero Badaró, 111 – considerada a primeira exposição de Arte Moderna do Brasil. Expõe 53 obras, maioria com tendência impressionista, obras realizadas nos Estados Unidos (período: 1915/16), e outras realizadas em São Paulo (período: 1916/17). Também expos algumas obras de pintores amigos norte-americanos. Suas obras chocaram o público. Na primeira semana vendeu oito obras. Em 20 de dezembro, Monteiro Lobato (1882-1948) publica, na pág. 4, da edição vespertina do jornal O Estado de S. Paulo, o artigo: “A Propósito da Exposição de Malfatti” (Lobato transcreveu em 1919 no seu livro “Idéas de Géca Tatú”, Edição da Revista do Brasil, com o título mais explícito de: Paranoia ou Mistificação? - e subtítulo: A Propósito da Exposição Malfatti), em Artes e Artistas, artigo em que condena a mostra com críticas duras e severas. Essa exposição foi a que serviu para aglutinar os “moços de 22”, dentre eles: Di Cavalcanti, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Brecheret, Guilherme de Almeida e outros. MA publica: Há uma Gota de Sangue em Cada Poema, seu livro de estreia, sob o pseudônimo de Mário Sobral. MB publica: A Cinza das Horas, seu primeiro livro. Guiomar Novaes apresenta-se no Carnegie Hall, acompanhada pela Filarmônica de Nova York.
Adendo Brasil: Em São Paulo, greve geral imobiliza todo parque industrial. No Brasil acontece a famosa “queima” de 3 milhões de sacas de café com alegação de evitar a queda de preços no mercado internacional. O Brasil declara guerra à Alemanha.

1918 – 19 de maio: participa como instrumentista, de concerto promovido pela Associação Brasileira de Imprensa, executando Grieg e Lacombe. Esse concerto foi promovido em prol do Retiro dos Jornalistas Inválidos. Outro concerto de Villa em prol desse Retiro aconteceu no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 15 de Agosto. Segundo consta esse concerto foi um grande fracasso de público. Oscar Guanabarino, no Jornal do Commercio, não perdeu a oportunidade para criticar. Villa conclui a ópera Izaht. Compõe a Prole do Bebê n.º 1, Suíte pianística. É apresentado a Arthur Rubinstein. O famoso pianista polonês deixa-se conquistar por esta suíte – sobretudo pelo número final, Polichinelo, passando a executá-la em suas turnês artísticas;
Adendo Cultural: Em Agosto: acontece a 25ª Exposição Geral de Belas Artes, na Escola Nacional de Belas Artes (ENBA), Rio de Janeiro. Cândido Portinari (1903-62) matricula-se na ENBA, onde já estuda Ismael Nery (1882-1948). Vicente do Rego Monteiro (1899-1970) expõe em Recife. Anita Malfatti, ressentida com a crítica de Monteiro Lobato, recua para o impressionismo. Monteiro Lobato, em maio, adquiri a Revista do Brasil, que a manteve nos sete anos seguintes, até a falência dos seus negócios em 1925, totalizando 113 números. - 30 de Novembro: nasce em Curitiba - PR, o maestro, compositor e pianista Alceo Bocchino. 18 de dezembro: morre o poeta Olavo Bilac. Tarsila do Amaral, temporariamente, pinta no ateliê do mestre alemão Georg Elpons.
Adendo Brasil: A “gripe espanhola” faz milhares de vítimas. Em São Paulo morrem mais de 8 mil pessoas no mês de outubro. No Rio de Janeiro, a situação foi mais grave, pois morreram aproximadamente 17 mil pessoas. 1º de março: Rodrigues Alves é eleito presidente e, vitimado pela epidemia da “gripe espanhola”, falece em 16 de janeiro de 1919, sem tomar posse. Posse de Delfim Moreira da Costa Ribeiro (1868-1920), interinamente na presidência da República. Maria José Rebelo (1891-1936) é aceita no Ministério do Exterior, tornando-se a primeira mulher diplomata brasileira.

1919 – Tem início a divulgação das suas obras no exterior, apresentando o Quarteto Op. 15, em Buenos Aires. Compõe as Canções Típicas Brasileiras para voz e piano. Passa a residir na Rua Dídimo, nº 10, centro do Rio;
Adendo Cultural: Acontece no Rio de Janeiro a 26ª Exposição Geral de Belas Artes, na ENBA, em agosto. Tarsila do Amaral, em definitivo, inicia estudos de pintura com George Elpons. Vicente do Rego Monteiro continua com sua exposição em Recife. Ferrignac (Ignácio da Costa Ferreira – 1892-1958) expõe em Roma. MA a Minas Gerais. Cecília Meireles (1901-64) publica sua primeira obra literária: Espectros. Lima Barreto publica Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá. MB publica Carnaval. Guilherme de Almeida publica A Dança das Horas e Messidor. 21 de maio: nasce em S. Paulo, Sílvio Mazzuca, maestro, pianista e compositor.
Adendo Brasil: 2 de janeiro: Delegação brasileira parte para a Conferência de Paz, em Versalhes. 16 de janeiro: vitimado pela gripe espanhola, morre, no Rio de Janeiro, Rodrigues Alves. Epitácio Pessoa (1865-1942), em eleição extraordinária, vence Rui Barbosa e é eleito presidente. Toma posse em 28 de julho.

1920 – Compõe o Choro n.º 1, para violão e a Lenda do Caboclo, para piano. O pianista polonês, Arthur Rubinstein (1887-1982), de volta ao Rio de Janeiro, em entrevista a A Notícia, disse:
“É justo, porém, já que se me apresenta esta oportunidade, declarar, ainda, que me surpreendeu o sr. Villa-Lobos. Um grupo de amigos desse compositor brasileiro proporcionou-me o ensejo de ouvir trabalhos seus e dessa audição ficou-me a convicção de que seu país tem nesse compositor um artista eminente, em nada inferior aos maiores compositores modernos da Europa. Tem todas as características de um gênio musical. Do que necessita ele é viajar, para tornar-se conhecido noutros países. Vou fazer executar nos Estados Unidos, por Thibaut, Pablo Casals e eu o Trio nº 3, de sua autoria, que me foi dado ouvir na referida audição”.[4]
- Em julho: Weingartner, maestro alemão, chega ao Brasil e inclui em seu concerto: Naufrágio de Kleonicos, de Villa;
Adendo Cultural: Acontece no Rio de Janeiro a 27ª Exposição Geral de Belas Artes. Tarsila do Amaral viaja para Europa fixando-se me Paris e frequenta a Académie Julian, e estuda com Emile Renard (1873-1951). Em maio: Vicente do Rego Monteiro, pintor pernambucano, após sua exposição em Recife, expõe em São Paulo. 16 de outubro: morre no Rio de Janeiro o compositor, pianista, organista e regente Alberto Nepomuceno. Em dezembro, MA começa escrever Paulicéia Desvairada. Victor Brecheret realiza exposição da primeira maquete do Monumento às Bandeiras, na Casa Byington, em São Paulo. Chega ao Brasil: John Graz, artista plástico suíço, e participa com obra na 27ª Exposição Geral de Belas Artes. Expõe, em dezembro, no Salão do Cinema Central, em São Paulo, juntamente com Regina Gomide Graz (1897-1973), decoradora, esposa de Antônio Gomide. Graz irá participar em 1922, da Semana de Arte Moderna. Em 6 de dezembro, Menotti Del Picchia (1892-1988), no Correio Paulistano, escreve o artigo Futurismo, assinando como Hélios, trazendo à tona a nova estética. Anita Malfatti realiza nova exposição individual, a terceira, iniciada dia 18 de novembro até 4 de dezembro, no Clube Comercial de São Paulo, com o objetivo de ganhar uma bolsa de estudos. O governo reconheceu seu talento, mas quem recebeu a bolsa foi o escultor Victor Brecheret. Zina Aita (1900-67) realiza sua primeira exposição individual no Palácio do Conselho Deliberativo, na cidade de Belo Horizonte. Essa exposição é identificada como um evento que revela os primeiros traços da modernidade artística em Minas Gerais. Zina Aita também realiza exposição individual no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro e participa ainda da 27ª Exposição Geral de Belas Artes, Rio de Janeiro.
Adendo Brasil: A Ford instalou sua primeira fábrica de montagem no Brasil. Nesse mesmo ano, foi inaugurada a primeira linha de ônibus urbanos de São Paulo. Em 1º de maio, Washington Luís Pereira de Souza toma posse como presidente eleito do estado de São Paulo. Irá governar até maio de 1924. 7 de setembro: criada a Universidade do Rio de Janeiro. Epitácio Pessoa proíbe a participação de jogadores negros no selecionado brasileiro.

1921 – 13 de junho: Villa apresenta seu segundo concerto sinfônico no Teatro São Pedro, promovido por Laurinda Santos Lobo (1878-1946) dama da alta sociedade carioca. Nesse concerto o presidente Epitácio Pessoa esteve presente. Oscar Guanabarino, na edição do dia 14 do Jornal do Commercio, inicia seus ataques ao Villa. Em outubro: Villa executou mais um concerto promovido pela Sra. Laurinda Santos Lobo. Compõe a Prole do Bebê n.º 2, para piano. 21 de outubro: no São Nobre do Jornal do Commercio, RJ, estreia do Quarteto Simbólico para flauta, saxofone, harpa, celesta e coro Feminino, na interpretação de Pedro de Assis, Antão Soares, Rosa Ferraiol e Lucília Villa-Lobos – o mesmo concerto será repetido num dos Festivais da SAM, em fevereiro de 1922. Nessa obra, Villa, pela primeira vez no Brasil, em execução de Música de Câmara, utilizou jogos e projeções de luzes sugerindo “ambientes estranhos de bosques místicos, sombras fantásticas”. 20 de outubro: Mário de Andrade (1893-1945) e Oswald de Andrade (1891-1954) chegam ao Rio de Janeiro, um dia antes do concerto de Villa. Villa recebe a visita em sua casa no Rio de Janeiro de: Graça Aranha (1868-1931), Ronald de Carvalho (1893-1935) e Paulo Prado (1869-1943), que foram convidá-lo para participar de um evento que aconteceria em S. Paulo no início do próximo ano (a Semana de Arte Moderna). O compositor confirmou presença. - O maestro Francisco Braga (1868-1945), de indiscutível destaque na vida musical do Rio, foi a um cartório e passou um curioso “atestado de competência artística”:
“O senhor Villa-Lobos tem um enorme talento musical. De uma capacidade produtora enorme, tem uma bagagem artística considerável, onde existem obras de valor, algumas bem originais. Não é mais uma promessa, é uma afirmação. Penso que a Pátria muito se orgulhará, um dia, de tal filho. Cinco de dezembro de mil novecentos e vinte e um. Francisco Braga”.[5]
Adendo Cultural: Sérgio Milliet (1898-1966) e Rubens Borba de Moraes (1899-1986) voltam da Europa e divulgam os autores europeus de vanguarda. Graça Aranha e Plínio Salgado (1895-1975) aderem ao modernismo. Graça Aranha publica A Estética da Vida. 9 de janeiro, realizou-se um banquete no Palácio Trianon, São Paulo, para comemorar o lançamento da obra As Máscaras, de Menotti Del Picchia. Nesse evento, Oswald de Andrade faz um discurso criticando os autores passadistas e exaltando a arte moderna. 8 de março: tem início o 2º Ciclo de Conferências na Villa Kyrial, organizado por Freitas Valle, terminando em 15  de junho. Também em março: Anita Malfatti realiza exposição individual no Vestíbulo do Politeama Rio Branco, em Santos (SP). É criada em São Paulo a “Sociedade Paulista de Belas Artes”, com a finalidade de incentivar o gosto pela arte. Em 27 de maio, Oswald de Andrade, no Jornal do Comercio de São Paulo, o artigo “O Meu Poeta futurista”, envolvendo MA num grande escândalo. Segundo Mario da Silva Brito: “O poeta (Mário de Andrade) sofre, então, em nome da literatura moderna, os mesmos vexames sofridos, poucos anos antes, por Anita Malfatti, em nome da pintura avançada”. Victor Brecheret, em 14 de junho, parte para a França. 23 de junho: morre no Rio de Janeiro, aos 40 anos, o escritor João do Rio, que usava o pseudônimo de Paulo Barreto. Di Cavalcanti expõe, em novembro, os desenhos originais do livro Fantoches da meia-noite, na O Livro, em São Paulo, Rua 15 de Novembro. Nessa exposição conhece o escritor Graça Aranha, como também iniciou as conversas com os futuros moços e intelectuais paulistas. Di promoveu a aproximação dos modernistas cariocas logo após o encerramento de sua exposição. Surge definitivamente a ideia de organizar a Semana de Arte Moderna. Criada a Sociedade Concertos Sinfônicos - teve, em seu concerto inaugural apenas umas quarenta pessoas; durante o ano seguinte, a plateia cresceu extraordinariamente (cf. a revista “Musica” – S. Paulo, Ano I, nº 2, setembro de 1923).
Adendo Brasil: 14 de novembro: morte da princesa Isabel (nasceu em 1846), no Castelo d´Eu, na França. Artur da Silva Bernardes (1875-1955) é eleito presidente.  

1922 – Participa da Semana de Arte Moderna de S. Paulo. A SAM aconteceu nos dias 11 a 18 de Fevereiro. Três dias: 13 (segunda-feira), 15 (quarta-feira) e 17 (sexta-feira), foram destinadas à música. A programação é a que segue:
- Dia 13: Graça Aranha profere, inicialmente, uma conferência sobre o tema A Emoção Estética na Arte Moderna, ilustrada com música e poesia. A parte musical ficou a cargo do pianista, regente, compositor, professor e folclorista Ernâni Braga, que executa D’Edriophtalma, segunda peça da sequência Embryons Dessechés de Errik Satie e uma peça de Francis Poulenc. A seguir, desenvolve-se a primeira parte do programa musical: Villa-Lobos (Sonata nº 2, para violoncelo e piano, de 1916. Intérpretes: Alfredo Gomes, no violoncelo e Lucília Magalhães Villa-Lobos no piano); Trio nº 2, para violino, violoncelo e piano, de 1915. Intérpretes: Paulina d’Ambrósio no violino, Alfredo Gomes, violoncelo e Frutuoso Viana, piano. A segunda parte desse dia abre com uma conferência de Ronald de Carvalho sobre o tema a Pintura e a Escultura Moderna no Brasil. Na sequência dessa noite, mais Villa-Lobos com: Valsa Mística, para piano, da Simples Coletânea, de 1917/19; Rodante, para piano, da Simples Coletânea; A Fiandeira, para piano, de 1921. Intérprete: Ernâni Braga; e finalmente: Danças Características Africanas (transcrição do original para piano, composto em 1914/15, para octeto), com as seguintes Peças: Farrapos (Dança dos Moços – Dança Indígena nº 1), Dankukus (Dança dos Velhos – Dança Indígena nº 2) e Dankikis (Dança dos Meninos – Dança Indígena nº 3). Intérpretes: Paulina d’Ambrósio (violão), George Marinuzzi (violão), Orlando Frederico (viola), Alfredo Gomes (violoncelo), Alfredo Corazza (contrabaixo), Pedro Vieira (flauta), Antão Soares (clarinete) e Frutuoso Viana (piano).
- Dia 15: O segundo festival teve início com uma palestra de Menotti Del Picchia. A seguir: Au Jardin Du Vieux Serail, para piano, da Suíte Andrinople, com E. R. Blanchet. Após, Villa-Lobos: O Ginete do Perrozinho, para piano, da coletânea Carnaval das Crianças, de 1919/20. Debussy, com La Soirée dans Grenade, para piano, das Estampes; Minstrels, para piano, do Livro I dos Préludes. Por insistência da plateia, a intérprete executou ainda: L’Arlequim, para piano. Intérprete: Guiomar Novaes. A segunda parte da noite foi iniciada com uma palestra de Mário de Andrade, no saguão do Teatro. Na sequência, Renato Almeida: “Perennis Poesia” (alocução omitida em vista agitação da plateia). Retorna Villa-Lobos; Festim Pagão, para canto e piano, de 1919 – poesia de Ronald de Carvalho; Solidão, para canto e piano, das Historietas, de 1920 – poesia de Ribeiro Couto; Cascavel, para canto e piano, de 1917 – poesia de Costa Rego Júnior. Intérpretes: Frederico Nascimento Filho (canto) e Lucília Guimarães Villa-Lobos (piano); Quarteto nº 3, para cordas, de 1916. Intérpretes: Paulina d’Ambrósio (violão), George Marinuzzi (violão), Orlando Frederico (viola) e Alfredo Gomes (violoncelo).
- Dia 17: Na primeira parte, Villa-Lobos: Trio nº 3, para violino e piano, de 1918. Intérpretes: Paulina d’Ambrósio (violão), Alfredo Gomes (violoncelo) e Lucília Guimarães Villa-Lobos (piano); Lune D’Octobre, para canto e piano, das Historietas – poesia de Ronald de Carvalho; Eis a Vida, para canto e piano, dos Epigramas Irônicos e Sentimentais, de 1921/23 – poesia de Ronald de Carvalho; Jouis Sans Retard, Car Vite S’écoule La Vie, das Historietas – poesia de Ronald de Carvalho. Intérpretes: Maria Emma (canto) e Lucília Guimarães Villa-Lobos (piano); Sonata-Fantasia nº 2, para violino e piano, de 1914. Intérpretes: Paulina d’Ambrósio (violão) e Frutuoso Viana (piano). Na segunda parte da noite figuraram as seguintes obras de Villa-Lobos: Camponesa Cantadeira, para piano, da Suíte Floral, de 1916/18; Num Berço Encantado, para piano, da Simples Coletânea; Dança Infernal (ou Bailado Infernal); para piano, de 1920 – do projeto de ópera Zoé. Intérprete: Ernâni Braga; Quarteto Simbólico (Impressões da Vida Mundana, de 1921). Intérpretes: Pedro Vieira (flauta), Antão Soares (saxofone), Ernâni Braga (celesta), Frutuoso Viana (piano em lugar de harpa) e Coro Feminino. Essa obra está registrada no catálogo do Museu Villa-Lobos sob o nome de Quatuor. Tem como Movimentos: Allegro Con Moto, Andantino e Allegro Deciso. A obra Quatuor dura cerca de 20 minutos.[6]
- José Miguel Wisnik, no seu O Coro do Contrários: a música em torno da semana de 22, nos oferece uma bela descrição sobre Villa na Semana:
(...).
Villa-Lobos, que, como já vimos, era com Gallet o compositor no Brasil com uma bagagem mais tendente à modernização àquela altura, contribuiu para a Semana com vinte peças de variado fôlego, todas incluídas na órbita da música de câmera, já que não se mobilizou no momento nenhum aparato sinfônico.
Composto em épocas diferentes dentro do período que vai de 1914 a 1921, o repertório de Villa-Lobos para a Semana formou-se com duas sonatas, dois trios, dois quartetos, um octeto (nas Danças africanas), seis peças para canto e piano e sete peças para piano-solo. A mais antiga entre todas era “Farrapos”, datada de 1914, e as mais recentes, o Quarteto simbólico e A Fiandeira. Mesmo as peças novas não estavam sendo apresentadas pela primeira vez na Semana, e, ao contrário, a maioria delas já havia passado mais de uma vez pelos programas de concerto de Villa-Lobos, no Rio de Janeiro. “Farrapos”, por exemplo, teria sido executada já nos primeiros concertos de Villa-Lobos, em 1915, por Lucília Guimarães Villa-Lobos. Registram-se já as primeiras apresentações da Segunda Sonata para violoncelo e piano em 1917, e do Segundo Trio, “Kankikis”, Terceiro Quarteto, “Festim pagão”, “Cascavel”, de 1919. O Quarteto simbólico, o Terceiro Trio e as Historietas foram apresentados em primeira audição num só concerto realizado no Rio de Janeiro no dia 21 de outubro, em homenagem a Madame Santos Lobo, a quem o compositor dedicou o Quarteto (Mais tarde, em abril de 22, pouco depois da Semana, Villa-Lobos também apresentaria em São Paulo, em concerto sinfônico de obras suas, uma peça em homenagem ao conselheiro Antônio Prado, denominada Verde Velhice).[6.1]
- Em 12 de fevereiro, Oswald de Andrade, no Jornal do Commercio (SP), publica na coluna “Semana de Arte Moderna”: Carlos Gomes Versus Villa-Lobos, cf. descrição parcial:
Carlos Gome é horrível. Todos nós o sentimos desde pequeninos. (...).
(...).
Felizmente, a Itália, que chegou a dar a degradação verista, tem hoje a genialidade moderníssima de Malipiero e Casella. Felizmente nós temos hoje a imprevista genialidade de Heitor Villa-Lobos.
Vi-o anteontem no Municipal, nos primeiros ensaios para a Semana de Arte Moderna.
Os seus olhos – oh! os olhos dos homens que compreendem e amam os homens – traziam-me de novo a vizinhança das tragédias supremas. Villa-Lobos movia-se irrequieto, perturbado, carregando todo o sofrimento da vida. E os seus músicos espalhavam pelo palco, sem  fim, a sonoridade solene e estranha dos seus acordes feitos de cérebro e alma, de canção torturada e de alegre amargura. Que violência suave, que rompimento de velhos mundos estáticos, que sensibilidade cantante através de todas as desordens, de todos os choques, de todos os saltos frios, de todas as invasões abismais.
Villa-Lobos é o filho comovido de seu tempo. Faz a ofensiva musical dos renovamentos com os Seis da França, que têm a direção jovial e agressiva de Jean Cocteau, com o russo Stravinsky, com os grandes meninos da Itália – Malipiero, Casella, Castelnuovo-Tedesco, Victor de Sabata.
São Paulo vai ouvi-lo. E como São Paulo é a cidade dos prodígios – herdeira das migrações e das entradas – vai aceita-lo. O nosso velho e caduco ambiente de musicalidade decadista e convencional estalará ao peso da mão genial do compositor de Kankukus e Kankikis.[6.2]
- Em 17 de fevereiro, Ronald de Carvalho publica no O Estado de S. Paulo, o artigo “A música de Villa-Lobos”:
(...).
Quando asseveram, por exemplo, que a música de Villa-Lobos é um puro artifício de timbres e sonoridades sem harmonia, dispostos caprichosamente, ao sabor de uma fantasia desmedida, ou que falata às telas de Van Dongen uma construção precisa, estamos em presença do famoso equívoco entre o crítico e o artista. Villa-Lobos sente a vida como uma criação contínua. Sua arte é masculina, imperiosa; estabelece uma série de problemas que somos obrigados a resolver rapidamente, como se estivéssemos ante a multiplicidade das massas de uma paisagem vista de um aeroplano. Ele compreende a realidade como uma sucessão contínua de instantes, onde cada instante se degrada em um torvelinho de movimentos infinitos. Ele não quer ser novo nem antigo, mas simplesmente Villa-Lobos. Fara exprimir o turbilhão vital, inventa os ritmos que os motivos quotidianos lhe sugerem. Sua lógica esta na forma que, de espaço a espaço, surge enriquecida e renovada da sua sensibilidade.
O tecido do seu contraponto é opulento, cheio de combinações inesperadas e originais, o mesmo acontecendo com os seus ornamentos harmônicos de uma simplicidade requintada. Essa riqueza de técnica, entretanto, só lhe dá mais força à inspiração, pois lhe oferece uma soma de recursos enorme. Seus desenvolvimentos não são repetições mais ou menos mascaradas, não são desenvolvimentos exteriores, mas lógicos e profundos. O desenho melódico de Villa-Lobos revela uma inteligência aguda, mordaz, um espírito ágil que voa e revoa sobre o espetáculo universal, sem se fixar, sem se deixar prender um só minuto. Ele não conseguiria ver a realidade intensamente, se aceitasse a receita imposta pelo crítico. Assim, não a fragmenta, não a divide artificialmente em partes boas e más, mas a subjuga inteiramente.
Mostra-se, ao mesmo tempo, um caricaturista e um decorador, um satírico e um poeta cheio de melancolia. Interessa-lhe toda a realidade. Combina, às vezes, o ridículo e a dor com um poder de emoção e uma opulência de imagens realmente admiráveis. No Quarteto Simbólico podereis apreciar esse aspecto do seu temperamento. É uma página em que a imaginação e o raciocínio se equilibram constantemente. Há nessa peça extraordinária, além das qualidades de colorido e sobre o luxo de instrumentação, peculiares ao seu engenho, um profundo comentário das vaidades humanas, feito num claro-escuro de ironia, remoque e piedade, à maneira de um “capricho” de Goya, ou de um desenho agudo de Beardsley. Baseia-se a composição desse Quarteto em dois motivos: um de mágoa, de penetrante melancolia, que se desenvolve principalmente no Andantino, e aparece, aqui e ali, em todas as partes da obra, e outro de “humour”, de inquieta e crua mordacidade, que se mistura, num riso claro de flauta, celeste e saxofônio, à frase nostálgica da harpa e das vozes instrumentadas. Há aí um pouco da tristeza do criador em face das criaturas, um pouco daquele “Albatroz” de Baudelaire.
Villa-Lobos ama a vida. Procura nos seus aspectos raros ou triviais a substância da sua arte. Aos que o julgam apressadamente dá apenas uma ideia de exuberância plástica, de fulgor impressionista. (...). Ele é, sobretudo, um criador de ambientes, de mundos e paisagens espirituais. Os temas que o inspiram são meros pontos de referência, onde, de trecho a trecho, paira uma fantasia móbil como a onda. Sua arte é um contínuo milagre de imprevistos e surpresas. Transmite-nos, ora, rápidas anotações da existência cotidiana, da graça ou da amargura das coisas, como na série deliciosa das Historietas, e nos Epigramas ou, como no Terceiro Trio, o grito desesperado do instinto diante da realidade misteriosa do universo.
(...).
A música de Villa-Lobos é uma das mais perfeitas expressões da nossa cultura. Palpita nela a chama da nossa raça, do que há de mais belo e original na raça brasileira. Ela não representa um estado parcial da nossa psiquê. Não é a índole portuguesa, africana ou indígena, ou a simples simbiose dessas quantidades étnicas que percebemos nela. O que ela nos mostra é uma entidade nova, o caráter especial de um povo que principia a se definir livremente, num meio cósmico digno dos deuses e dos heróis. (...).
Villa-Lobos veio demonstrar, mais uma vez, que a verdadeira tradição, em arte, é o respeito à antiguidade e o horror aos métodos do passado. Somente se renova aquele que tem a coragem de se libertar. (...).[6.3]
- Em 18 de fevereiro, o Correio Paulistano publica Semana de Arte Moderna, um dos poucos artigos elogiosos na época:
Com o festival de ontem, preenchido exclusivamente com composições da lavra do maestro Villa-Lobos, encerrou-se a série de saraus da Semana de Arte Moderna.
Bem mais concorrido que os anteriores, o sarau de ontem teria deixado melhor impressão não fora a atitude de hostilidade assumida em razão, valha a verdade, no começo e no fim do concerto, por uma parte diminuta da assistência.
Felizmente, essa atitude foi francamente condenada pela grande maioria, que obrigou ao silêncio os demais.
As composições do maestro Villa-Lobos, de épocas e gêneros diferentes, produziram, em conjunto, ótima impressão, devendo salientar-se porém, a Sonata Segunda para violino e piano, trabalhada com felicidade e em que não escasseiam lindas frases musicais. Apesar de uma ou outra extravagância e de umas tantas preocupações de modernismo a música de Villa-Lobos revela desde logo um temperamento e um talento dignos de nota, em que não falta também certa originalidade, como se evidenciou no Quarteto Simbólico para flauta, saxofone, celeste e piano.
Tanto a Villa-Lobos, como a seus intérpretes, e principalmente a Paulina d’Ambrósio, Ernâni Braga e Maria Ema, a assistência premiou com farta messe de aplausos.[6.4]
- Após a SAM, Villa permaneceu em S. Paulo para reger, em 7 de março, um concerto sinfônico só com obras suas, sob os auspícios da Sociedade de Cultura Artística. Em 3 de março: O Estado de São Paulo, publica “Sociedade de Cultura Artística”, em “Artes e Artistas”:
O concerto de Villa-Lobos é patrocinado pela Sociedade de Cultura Artística, que se dispõe a realizar uma série de promoções “aproveitando as oportunidades que surjam pela presença em São Paulo de artistas de valor e pelo concurso de elementos locais que se disponham a auxiliá-la nas suas tentativas artísticas”. “Igualmente prejudicado pelos seus admiradores inconscientes e os seus detratores apaixonados, Villa-Lobos é um musicista de qualidades excepcionais. A Sociedade de Cultura Artística faz muito bem em apresentá-lo ao nosso público para que o julgue tranquilamente num ambiente de tolerância e respeito”.[6.5]
- Em 18 do mesmo mês volta ao Rio para reaparecer em S. Paulo em abril, e no dia 14 realiza um concerto, só com obras suas, numa promoção da Sociedade de Concertos Sinfônicos. No dia 17, realiza-se um concerto com música de câmera do compositor. Segundo depoimento de Fructuoso Vianna (1896-1976), que mais tarde viria a se impor como compositor, sua participação no movimento dependeu unicamente de sua ligação pessoal com o autor de Danças africanas, e não de eventuais preocupações modernistas prévias:
“Eu havia me interessado pela figura de Villa-Lobos, que já tinha dado vários concertos no Rio, em homenagem a Epitáfio Pessoa, inclusive. Villa-Lobos tinha participado da composição de uma peça em três partes: “A Guerra”, “A Vitória” e “A Paz”, das quais compôs a primeira, J. Otaviano a segunda e Francisco Braga a terceira. Participei da Semana apenas como intérprete, em função da amizade de Villa-Lobos, nada mais que isso”.[7]
- Um dos episódios mais divertidos da apresentação no Municipal (nos festivais da SAM), é a aparição de Villa de casaca, como mandava o figurino, mas de... chinelo:
“Achava-se ele na ocasião atacado de ácido úrico nos pés e tendo um deles enfaixado, apoiado em um guarda-chuva, entrou em cena”, conta a violinista Paulina d’Ambrósio. A plateia, supondo tratar-se de “futurismo” apresentar-se assim, aproveitou a oportunidade para bagunçar o concerto. Contudo, segundo a maioria dos cronistas da Semana, a música de Villa-Lobos, apesar das vaias generalizadas, acabou se impondo”.[8]
- Dois depoimentos importantes: o primeiro a ser descrito, da violonista Paulina d’Ambrósio; o segundo de Ernâni Braga (onde manifesta uma certa distância, menos acentuada, dos propósitos modernistas, ao discordar de Villa sobre a pedalização de uma peça, o que motivou um pequeno incidente na sua apresentação):
- (Paulina d’Ambrósio): “Fazíamos ensaios diários, executando sonatas, trios, quartetos e outros conjuntos num abrir e fechar de olhos. Além de músicos e outros artistas, muitos dos quais prematuramente desaparecidos e que, reunidos na casa de Villa-Lobos, penetravam pela noite em saraus inesquecíveis. (...). Os ditos engraçados e pitorescos que adiante relatarei e que tiveram lugar no teatro Municipal de S. Paulo, motivaram momentos jocosos em nossas reuniões. Cumpre assinalar que as realizações no referido teatro foram tumultuosas; - metade da plateia delirava aplaudindo e restante vaiava. (...) Quanto a mim, antes de começar a tocar uma sonata (aliás muito aplaudida) no levantar a alça do meu vestido que estava fora de lugar, gritaram: - “Quem tem alfinete aí?”– o que me fez chorar de nervosismo, sendo acalmada pelas boas palavras e olhares de advertência do querido Villa. Achava-se ele na ocasião atacado de ácido úrico nos pés e tendo um deles enfaixado, apoiado em um guarda-chuva, entrou em cena. Nessa mesma ocasião o insuperável artista Nascimento Filho (vulgo “Pequenino”) começou a cantar e então um gaiato nas galerias gritou: -“Ridi Pagliaccio”, e o Nascimento replicou: - “Desse para eu lhe ensinar como se canta”, e o Villa, com a ponta do guarda-chuva espetou-o para que se calasse. No dia seguinte, Nascimento apareceu com um dos olhos arroxeados, produto de sua singular lição de canto”.[9]
- (Ernâni Braga): “Lembro-me que tinha de tocar a “Fiandeira” de Villa-Lobos, entre muitas outras cousas. Dias antes executara uma peça, que era a mais recente do meu querido amigo, em casa do professor Luiz Chiaffarelli, para um grupo de discípulas suas e convidados. Villa-Lobos estava presente. Quando eu acabei, ele se levantou, de olhos arregalados, e declarou energicamente no meio da sala que aquilo que eu tocava não era dele.
Foi um sucesso. Expliquei, então, aos ouvintes que o autor exigia na peça, e principalmente no final, um pedal contínuo que me parecia insuportavelmente cacofônico. Chiaffarelli pediu “bis” para a “Fiandeira”, com o pedal do autor. Fiz a vontade do velho mestre. E todos pareceram muito contentes com a cacofonia, inclusive Villa-Lobos que me abraçou entusiasmado. Só quem não gostou o Chiaffarelli. Tomou-me a um canto, e me aconselhou: - use o pedal como da primeira vez; o Villa – não é pianista; você é quem está com a razão. – Pois bem, quando no meio da perturbação em que eu estava pelos incidentes daquela noite fatídica, chegou o momento da “Fiandeira”, fiquei sem saber o que devia fazer. Com pedal ou sem pedal? Villa-Lobos ou Chiaffarelli? Seguindo o conselho do mestre acatado podia provocar um protesto do autor, e desta vez diante de um público já meio zangado. Ataquei a peça litigiosa em plena turbação de sentidos. E reduzi-a à quarta parte, porque me perdi no meio, e me achei sem saber como, na última página. O auditório gostou daquela peça tão viva, tão extravagante e... tão curtinha. Por isso aplaudiu muito, não dando tempo a Villa-Lobos de protestar. Chiaffarelli depois me felicitou por eu ter encontrado a fórmula exata de resolver o problema. Além de mestre admirável de arte pianística, era Chiaffarelli sutilíssimo na arte da ironia”.[9.1]
- Sobre o que foi o acontecimento da SAM, Villa escreve ao amigo Arthur Iberê de Lemos, publicado no Jornal do Brasil em 6 de setembro de 1967.  Eis apenas um trecho dessa sua carta:
“Quando chegou a vez da música, as piadas das galerias foram tão interessantes, que quase tive a certeza de a minha obra atingir um ideal, tais foram as caias que me cobriram de louros. //No segundo, a mesma coisa na parte musical, e na parte literária a vai aumentou. //Chegamos ao terceiro concerto, que era em minha homenagem. Que susto passaram os meus intérpretes, vais ver... //Organizei um bom programa, revestido dos melhores intérpretes. Começamos pelo 3º Trio, que, de quando em quando, um espectador musicista assobiava o principal tema, paralelamente com o instrumento que o desenhava. A Lucília e a Paulina queriam parar, eu me ria e o Gomes bufava, mas foi até o fim. Nos outros números, novas manifestações de desagrado, até ao último número, que foi o quarteto simbólico, onde consegui uma execução perfeita, com projeção de luzes e cenários apropriados a fornecerem ambientes estranhos, de bosques místicos, sombras fantásticas, simbolizando a minha obra como a imaginei. Na segunda parte desse quarteto, lembras-te? o conjunto esclarece um ambiente elevado, cheio de sensações novas. Pois bem. Um gaiato qualquer, no mais profundo silêncio, canta de galo com muita perícia. Bumba... //Pôs abaixo toda a comoção que o auditório possuía, provocando hilaridade tal que a polícia (finalmente) interveio prendendo os graçolas e mais duas latas grandes de manteiga cheias de ovos podres e batatas. Esses moços, ao serem interrogados, declararam que aqueles presentes estavam destinados a coroarem os promotores da Semana de Arte Moderna de S. Paulo, como se fossem flores e palmas, mas que tal não fizeram porque respeitavam os intérpretes que na maioria eram paulistas. Uf!... chega”.[10]
- Sobre a reação do público na SAM, é importante não esquecer que era um público muito conservador e, logicamente, não poderia gostar das músicas apresentadas, que tinham uma semelhança às do compositor impressionista francês, Debussy. Villa teve, logo após a SAM, um combatente ferrenho com o jornalista e crítico carioca Oscar Guanabarino – que o criticou em várias crônicas nas edições do Jornal do Commercio. Só para exemplificar, segui parcialmente uma das publicações de Guanabarino, em 22 de fevereiro, intitulada Pelo Mundo das Artes:
(...).
Nada conhecemos na pintura, na escultura e na poesia, ente os artistas brasileiros a que se posa dar o título de futuristas. Existe, é certo, um músico de talento ainda não cultivado bastante, que se esforça para enveredar por esse caminho tortuoso: é o Sr. Villa-Lobos, que procura esconder nessa ausência de bom senso, das suas partituras, o que lhe falta em estudos de harmonia o que lhe falece em inspiração, o que da música só se aproveita dos elementos som e ritmo, de modo que, no seu poma sinfônico A Guerra, conseguiu belos feitos imitativos, grandeza onomatopaica e rajadas descritivas no terreno da confusão, do alarido, da gritaria, da guerra, enfim, nada mais tem produzido que mereça uma classificação entre os mestres. A sua música rítmica é puramente africana, sem melodias e sem harmonias, de modo que não resiste à menor análise harmônica sem que o crítico o classifique de disparatado e absurdo.
E tanto isso é verdadeiro, tanto a sua música é privada de bom sendo que um pistonista bem conhecido no Rio de Janeiro, tomando parte num ensaio sob a regência do próprio autor, o Sr. Villa-Lobos, executou, por troça, uma canção popular sem causar escândalo nem chamar a atenção do autor.
Isso prova que tudo quanto estava sendo executado era uma barulhada sem pés nem cabeça.
Tivemos aqui um futurista: o Sr. Milhaud que foi vaiado em Paris, temos agora o Sr. Villa-Lobos que ouviu assobios e gaitadas em São Paulo.
É doloroso.[10.1]
- Villa foi defendido por Menotti Del Picchia (1892-1988), que rebateu as provocações de Guanabarino. Esse crítico também atacou vários outros participantes da SAM. 15 de abril: Sérgio Milliet (1898-1966), publica no Lumière, Anvers, nº 7, Uma Semana de Arte Moderna em São Paulo. Segue descrição parcial:
(...).
Você já ouviu falar de Villa-Lobos, minha amiga, pois ele fez executar suas obras em Paris com sucesso (Ver Nouvelle Revue Française). É um compositor vagamente ligado ao grupo dos “Seis” e, entretanto, ainda com um não sei quê de Debussy, mas o maior músico do Brasil assim mesmo. Naturalmente ele era ainda completamente desconhecido no país dos cafeeiros.
Muito bem executadas, suas obras obtiveram uma consagração definitiva da elite e foram copiosamente vaiadas pela maioria do público.
A notar seu Trio (1916) cujo andante é muito pessoal, as Danças Africanas (Kunkukus e Kankikis) e Terceiro Quarteto (instrumentos de corda – 1916) cujo scherzo satírico (pipocas e potocas) é uma pequena maravilha de verve e o adágio uma bela peça.
A música de Villa-Lobos é uma das mais perfeitas manifestações da alma brasileira. Feita de melancolia e de humor, ela traduz o que caracteriza este povo jovem saído de um povo triste. A linha melódica, infinitamente variada, derrotou o público. Villa-Lobos não desenvolve uma frase. Ele sintetiza e seu espírito plana sobre o mundo das sensações que ele exprime à maneira de um Masereel em pintura.
O público, hostil e refratário, diante da calma olímpica dos artistas sentiu-se, perto do final, petrificado.
(...).[10.2]
- Em julho: o deputado Arthur Lemos apresenta no Congresso projeto que previa a liberação financeira para que Villa realizasse 24 concertos de artistas brasileiros nas metrópoles europeias. O valor previsto no projeto era de 108 contos de réis. O projeto não foi aprovado. Os favoráveis ao projeto propuseram uma emenda para que o valor fosse reduzido para 40 contos de réis. Aprovado, Villa recebeu a primeira parcela de 20 contos de réis. A segunda parcela não recebeu. Aficionados de Villa, naquela ocasião, para ajudar financeiramente a viagem, organizaram concertos no Rio e em São Paulo. Somente assim conseguiu viajar para a Europa no ano seguinte. Em 6 de dezembro, no Rio-Jornal, Rio de Janeiro, é publicada entrevista com Villa, com o título: Os Grandes Movimentos da Atualidade. Pelo fato da entrevista ser muito longa, na sequência apenas a apresentação da matéria:
(...).
Villa-Lobos é, entre os compositores da sua geração, o nome mais alto, e o mais querido. Combatido a princípio, ele já é uma individualidade que ninguém tem o direito de negar ou discutir. A sua arte, fina, profunda e original, constitui, agora, um padrão de glória para a música brasileira. Porque foi ele, temperamento rebelde de renovador, quem trouxe par o Brasil os métodos e os processos da música nova. A obra de Villa-Lobos é dessas que nos honram e engrandecem.
Convencido disso, foi que o governo brasileiro lhe confiou, ainda agora, a alta missão de ir à Europa dar uma série de concertos de música brasileira. Villa-Lobos, assim, vai ser o embaixador da arte nacional nos grandes centros do Velho Mundo.
(...).[10.3]
Adendo Cultural: MA é nomeado para a cátedra de História da Música no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo. Publica Paulicéia Desvairada. Em fevereiro, em São Paulo, são realizados os festivais da Semana de Arte Moderna, no Teatro Municipal. Os três dias principais foram: 13, 15 e 17. Era o início do Movimento Modernista no Brasil. O pernambucano Vicente do Rego Monteiro, teve 10 obras expostas no evento, mas não esteve presente. Entre os literatos a grande ausência foi a de MB, na ocasião estava impossibilitado de viajar do Rio até São Paulo. Da. Olívia Guedes Penteado (1872-1934), desde 1919 na Europa, retorna a São Paulo depois da Semana de Arte Moderna, da qual tomou conhecimento através do amigo Paulo Prado (1869-1943). Inicia-se em 15 de maio, a publicação da Revista Modernista Klaxon, em São Paulo. Com capa criada por Guilherme de Almeida, Klaxon termina em janeiro de 1923 com as edições números 8/9. René Thiollier (1882-1968), um dos mecenas da Semana de Arte Moderna, financiou o aluguel do Teatro Municipal para a realização do evento, publica seu primeiro livro O Senhor Dom Torres. 22 de março: Tem início o 3º Ciclo de Conferências na Villa Kyrial, organizado por Freitas Valle, terminando em 21 de junho. Em junho, Tarsila do Amaral retorna ao Brasil e, em São Paulo, é apresentada aos modernistas por Anita Malfatti. Forma-se o “Grupo dos Cinco”, composto por Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Menotti Del Picchia, Mário e Oswald de Andrade. Em 2 de Agosto é assinado o Decreto Nº 15.596, Ato de criação do Museu Histórico Nacional. Em setembro acontece em São Paulo o I Salão da Sociedade Paulista de Belas Artes, no Palácio das Indústrias, e Tarsila e Anita participam. Em 12 de outubro é inaugurado o Museu Histórico Nacional. 1º de Novembro: morre no Rio de Janeiro o escritor Lima Barreto. Em novembro: Tarsila do Amaral parte para a Europa e é aceita no Salon officiel des artistes français. Cândido Portinari expõe pela primeira vez uma obra sua no Salão Nacional de Belas-Artes, no Rio de Janeiro. MA publica Paulicéia Desvairada.
Adendo Brasil: 5 e 6 de julho: Revolta do Forte de Copacabana. Os jovens tenentes revoltosos marcham pela Av. Atlântica e são fuzilados pelas tropas do Governo, escapando da morte apenas dois tenentes. Dezesseis mortes, dentre elas a de um civil que aderiu à Marcha. Era o início do “tenentismo”. 7 de setembro: primeira emissão de rádio no Brasil durante as Comemorações do Centenário da Independência, realizada no alto do Corcovado, no Rio de Janeiro, transmitindo o discurso do então presidente Epitácio Pessoa. (Embora na cronologia da comunicação eletrônica de massa brasileira o surgimento do rádio no Brasil é marcado com a fundação da Rádio Clube de Pernambuco por Oscar Moreira Pinto, no Recife, em 6 de abril de 1919). Realiza-se no Rio de Janeiro a exposição comemorativa do Primeiro Centenário da Independência. Ano da fundação do Partido Comunista do Brasil. Em 15 de novembro: Arthur Bernardes (1875-1955) é o novo presidente do Brasil.

1923Compõe Noneto. 29 de abril: Novamente em S. Paulo, Villa rege, sob o patrocínio da Cultura Artística, um concerto sinfônico com obras exclusivamente dele. 30 de junho: inicia sozinho, a bordo de um navio francês “Groix”, a sua primeira viagem à Europa: “Vim mostrar o que eu fiz. Se gostarem, ficarei, senão voltarei para a minha terra”, declarou ao chegar a Paris. E Paris passou a ser sua segunda cidade. Lá chegou e encontrou o apoio daquela que seria a grande artista do modernismo e da antropofagia no Brasil, Tarsila do Amaral (1886-1973). Em 22 de abril, MA escreve a MB, mencionando Villa, conforme trecho que segue:

S. Paulo, 22 [de abril de 1923].

Querido Manuel.

Há muito tempo não te escrevo!
(...).
(...)... O Villa-Lobos só conseguiu duas casas vazias e “déficit”... Nos jornais: cabala para diminuir-lhe o valor. “Moço de talento”, “Músico interessante” e outros pedantismos pesados, conselheirais...12 Burros! Mais que burros, porque são maus. Infames! E sofro. Aqui em casa riem de mim porque ando a sofrer males alheios. (...).
Trabalho atualmente numa conferência: “Paralelo de Dante e Beethoven”, para o Vila Kyrial13.
E vou almoçar. Um adeus abraçado do
Mário.

- Nota 12: No mês seguinte, MA assinava na Revista do Brasil nº 89, a crônica musical “Villa-Lobos”, contrapondo o valor singular à inabilidade do músico carioca de se exprimir através de juízos críticos-teóricos. O texto fixa o particular interesse de MA por Heitor Villa-Lobos (1887-1959) que se tornava “cada vez mais músico brasileiro”. O crítico expande o julgamento: “Porém esse nacionalismo que o dignifica, não é nacionalismo exterior de Ligas patrióticas [...]. É qualquer coisa de mais seguro e menos moda.” As raízes desse caráter musical brasileiro de Villa-Lobos alimentaram-se de vertente da canção popular urbana, que se aliou ao aprendizado erudito, com estágios no clarinete e violoncelo, este sob a tutela de Benno Niederberger. Outros ramis de encontro com a cultura nacional se deram nas quatro grandes viagens do autor das Bachianas pelo Brasil, antes de 1912. A ligação com os modernistas de S. Paulo foi propiciada por Graça Aranha e Ronald de Carvalho, que o convidaram a aderir à Semana de 22, onde, para escândalo de todos, em decorrência de uma dorida afecção no pé, apresentou-se descalço. A celebridade, contudo, chega via Paris. Lá desembarcando em 1923, dispara a habitual excentricidade: “Não vim estudar com ninguém; vim mostrar o que eu fiz”. E venceu.
- Nota 13: Nota MB: Vila Kyrial: a casa de José de Freitas Valle, o poeta Jacques d’Avray, muito amigo do grupo modernista. A chácara da Domingos de Morais, nº 10, denominada Vila Kyrial, “um dos mais luxuosos palácios de S. Paulo”, foi residência do deputado e poeta José de Freitas Valle. (...).[11]
- Em maio: MA publica o artigo “Villa-Lobos”, na Revista do Brasil nº 89, São Paulo:
Villa-Lobos é tão perseguido pelo desamor e impertinência da crítica indígena, que lhe nasceu o medo duma universal incompreensão e a mania de explicar suas intenções. Como si sua arte magnífica não bastasse para justificá-la, mete-se em explicações nem sempre claras ou exatas, pretendendo principalmente minuciar uma por uma as sutilezas que pôs nas suas construções – sutilezas que na realidade a música não pode transmitir (...). Combarieu percebeu muito bem essa verdade quando deu à música a definição conciliatória de arte de pensar, sem conceitos, por meio de son. Ora aos que tiveram com Villa-Lobos uma comunhão mais íntima ressalta o contraste ente a essência de sua música e o valor comotivo que ele lhe dá. às vezes mesmo, (...) atinge pormenores de tal maneira objetivos, que um julgamento mais leviano dar-lhe-ia às composições uma intenção programática. Mas Villa-Lobos felizmente está um século adiante desse romantismo. Sua musicalidade intensíssima e indissoluvelmente da essência da música, sem nenhuma ligação intelectual.[11.1]
- 20 de maio: MA escreve para Tarsila do Amaral que se encontrava em Paris, mencionando Villa. Segue apenas o trecho e a nota:

São Paulo, 20 de maio de 1923.

Querida Amiga.

Esta é a terceira carta que te escrevo. (...) Para começar, mando-te esta impressão do Tédio de Alvorada do Villa-Lobos6:

Nota 6: De acordo com informação do estudioso Vasco Mariz sobre a peça Tédio de Alvorada, trata-se de poema sinfônico, com a duração de 15 minutos, escrito em 1916, no Rio de Janeiro. Não foi editado. Estreou no Rio de Janeiro, no Teatro Municipal dessa capital a 15 de maio de 1918, com a orquestra do maestro Soriano Robert. Já dentro da linha nacionalista, e daí o interesse suscitado em Mário de Andrade, foi transformado posteriormente (1918), no Bailado Uirapuru. O Museu Villa-Lobos possui o autógrafo do Tédio de Alvorada. Depoimento telefônico de Vasco Mariz à A. em 11 mar. 1998.

TÉDIO DE ALVORADA

A primeira voz da mata goteja das franças, úmida de orvalho.

O arrepio da brisa
murmúrios
cochichos
asa trépida no vale vasto, adormecido pela noite de estio.

Tudo acorda e se queda num bafo lânguido de sumo e de suor.

                                                                                              SUSPIRO.

É o dia mais uma vez.
O dia outra vez.
Vai se repetir a maravilha fantástica do dia.

Já surge no céu desnublado do oriente o pincel verde do sol.
E ele virá de novo pintar a mesma paisagem...
As mesmas árvores vão equilibrar-se no quadro...
O mesmo ribeirão nacionalista, com o sombrio das águas fundas...
De manhã riscarão o céu sempre gritos...
Ao meio-dia a natureza morrerá...
De tarde o pormenor romântico dum veado...
O Dia mais uma vez!

                                                                                              SUSPIRO.

A madrugada enjoada vira-se no leito elevado.
Dá as costas à Terra, para não ver.
Seus cabelos duros de noite
caem pesadamente pelas lombadas dos morros macios,
descobrindo-lhe o corpo.
E sobre as almofadas de horizonte, preguiçosa,
ela move as hercúleas coxas róseas.

//Que tal?
Dá um grande beijo em Paris por mim.
E o meu beijo nas tuas mãos.

Mario.

Rua Lopes Chaves, 108.[12]

OBS:- No livro citado “[12]”, na página 69, Nota 11, referente a uma carta que Tarsila do Amaral escreve a MA, de Paris, em 23 de maio de 1923, surge o nome de “Vera Janacopoulos”. A Nota 11, explica:
- Vera Janacopoulos, cantora e intérprete de Villa-Lobos, foi a estimuladora da ida do compositor para a Europa. Seu marido, Alfred Staahl, e Arthur Rubinstein apresentaram-no ao editor Max Eschig, da casa Éditions Max Eschig, Paris, “e, em suas tournées a famosa contara começou a divulgar-lhe as canções, em seus recitais em vários países vizinhos” (ver Vasco Mariz, Heitor Villa-Lobos/ Compositor Brasileiro, 5 ed., Rio de Janeiro, Ministério da Cultura, Fundação Nacional Pró-Memória: Museu Villa-Lobos, 1977, p. 71-7). (...).
- 11 de outubro: Sérgio Milliet envia carta de Paris a Yan de Almeida Prado (1898-1987), mencionando Villa. Segue trecho:
Meu caro Yan, recebi três cartas ao mesmo tempo. Ontem foi um dia de festa brasileira. (...). Falas-me no incidente Vila-Oswald? Acho que foste mal informado. Em realidade o Oswald não deu conselhos ao Vila. Mas quis mostrar-lhe, por amizade, o movimento moderno francês e, naturalmente, sendo extremista, expôs idéias extremistas que o Vila refutou violentamente. É tudo. (...). O Vila que entrou com o pé direito em Paris e que já tem sucesso seguro é um músico genial mas, nós o sabemos, um filósofo mulo e um péssimo crítico de arte. O estilo dele em literatura é pompier, grandiloquente, bombástico. Não quero dar razão a Oswald nem ao Vila. Apenas exponho os fatos. É natural que o Vila não tenha uma cultura literária e artística como a do Mario, mas é também natural que o Oswald não conheça música. O que acontece é que ambos não sabem discutir e vivem com malentendidos entre si. Mas tudo isso já passou e eles já se dão muito bem de novo. Eu assisto a todas essas intriguinhas com uma deliciosa ironia. É muito difícil ver dois brasileiros discutirem idéias sem que se ataquem no fim pessoalmente! Que povinho extraordinário. (...).[13]
- 24 de outubro: Sérgio Milliet escreve novamente para o Yan, mencionando Villa:
Recebi ontem mais uma carta tua. (...). Jantamos ontem em casa de Tarsila com o Cocteau que apresentamos ao Vila Lobos. Fecha. Vila impossível com teoria geniais. Cocteau blagueur e sutil. Não podiam se entender. Boa tarde assim mesmo. Aliás Vila não precisa de Cocteau. Tem tido muito sucesso aqui e vai ser logo tocado pelo Colonne, etc. É verdade que o meio avançado olha-o com pouca confiança e muita simpatia.[13.1]
- 17 de novembro: Villa envia carta a Yan de Almeida Prado:
“Yan, bom amigo.
Desde o dia em que pizei (com o pé direito) em Paris, senti-me inundado pelo olhar radiante da boa estrella. E agora, vem augmentar esse contentamento uma interessante carta tua.
Parece impossível, mas esse endiabrado adivinho, que me citas com tanta graça, buliu-me na tecla da minha vida. Somente, notei, que tu azulavas de tinta a tua carta, com teu maduro cultivo de história e resplandecente talento, de quem observa tudo atravez (talvez ainda) das redondas vidraças de uns americanicos óculos, que se equilibram (um pouco distante como a lei da atração) de uns fiapos endurecidos (como uma escova de dentes) que o vulgo chama de bigode.
Mas, ficaria mais radiante, se me mandasses notícias desses queridos amigos de São Paulo. Do Tacito, Couto, Mario, Paulito, os dois Vicentes, os Aranhas e etc. Sobre a minha pessoa, nada te posso dizer aqui, porque ainda não consegui o que pretendo, o que saberás certamente, logo que foi deliberado. Sobre as minhas impressões é completamente impossível descrevê-las numa carta, mesmo reduzindo. Só escrevendo um livro ou descrevendo pessoalmente.
Em todo caso, la vae alguma cousinha:
Paris, é Paris. Move-se continuamente. A sua vida exhorta a conquista e a conquista surda e cega se ampara na novidade. É uma lucta terrível que subjuga a sinceridade e os dons cultivados em favor do homem que substitue todas as cousas pelo cérebro, como se a própria arte não fosse uma interpretação e sim uma acção fisica, material.
Compreendo perfeitamente toda intenção dos exagerados artistas daqui, cujo effeito, noto com a minha nervosa calma de observador, um circulo vicioso, em que nem mesmo se entendem.
São inimigos uns dos outros, e cada qual acha que sua arte e opinião e uma sentença definitiva.
Quanto a mim, vejo-os do quinto andar da minha modesta morada intellectual de Paris, como se visse um desordenado cordão carnavalesco atravessando fanaticamente a nossa pequenina avenida Central. Tranquilamente vou-os deixando passar.
Longo abraço do teu Villa”.[14]
Adendo Cultural: 21 de março: Tem início o 4º Ciclo de Conferências na Villa Kyrial, organizado por Freitas Valle, terminando em 20 de junho. O ano de 1923 foi quando realmente o Modernismo no Brasil começou a ter seu momento áureo. Tarsila do Amaral, em Paris, estuda com o pintor cubista e também escultor André Lhote (1885-1962), na escola de Monstparnasse. Frequenta o curso de Albert Gleizes (1881-1953), teórico do cubismo, e estagia no ateliê de Fernand Léger. Nesse ano ela pinta A Negra. Em agosto: Anita Malfatti viaja para a França (Paris) para cursar desenho, onde encontram-se outros artistas brasileiros: Di Cavalcanti, Brecheret, Rego Monteiro (1899-1970), Sérgio Milliet, Antonio Gomide e Tarsila. Lasar Segall muda-se para o Brasil, residindo na cidade de São Paulo. No final do ano, dezembro, Tarsila retorna ao Brasil. Realiza-se no Rio de Janeiro o “I Salão da Primavera”.
Adendo Brasil: 1º de março: morre Rui Barbosa. 21 de abril: Edgard Roquete Pinto (1884-1954) e Henry Morize (1860-1930), fundam a primeira estação de rádio brasileira, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro. Em 9 de setembro, falece Hermes da Fonseca.
                         
1924 – Compõe o Choros n.º 2 e o Choros n.º 7. Em Lisboa, dias 9 e 16 de março. O compositor realiza concertos na Bélgica, em 3 de abril. Em Paris, participa de outros concertos, dias 7, 9 e 11 de abril.  30 de maio, em Paris, na Salle Des Agriculteurs, Villa realiza outro concerto, dedicado inteiramente à suas obras. A embaixada do Brasil na França foi a patrocinadora do evento. Participaram: o pianista Arthur Rubinstein, Vera Janacopulos, Souza Lima, Coro Misto de Paris e Societé Moderne d’Instruments à Vent. A direção coube a Villa. Arthur Rubinstein, fez questão de interpretar Prole do Bebê nº 1. MB,  na revista Ariel (S. Paulo), anuncia a volta de Villa ao Brasil, em setembro. A revista foi publicada no mês seguinte. MB menciona na crônica um depoimento de Villa:
“(...). Em Paris, uma cousa o abalou perigosamente: o Sacre Du Printemps, de Stravinsky. Foi, confessou-me ele, a maior emoção musical da sua vida”.[15]
- 10 de outubro: MA escreve para MB:

[S. Paulo], 10 de outubro de [1924].

Manuel

         Sem dúvida deves mandar o teu livro ao Paulo que não conserva contra ti o mínimo ressentimento. (...). //Apesar da tua Santa Teresa alta e longínqua tens de me fazer um favor. Desce ao Rio. Compra-me-ás uma Lenda do caboclo do Villa-Lobos. Preciso dela com urgência para ser estudada por uma aluna minha. (...).[16]
- 31 de outubro: MA escreve a MB mencionando Villa:

[S. Paulo], 31 de outubro de 1924.

Manuel,

recebi as coisas que mandaste pra Ariel78. Tomei a liberdade de mudar o título “Cartas do Rio” pra “Villa-Lobos”, porque chama mais a atenção e para variar. Serve. O escrito está excelente. O artiguete “Futurismo” creio que não sairá no próximo número por não haver Sinfonieta. Há matéria demais. Farei reproduzir os maravilhoso olhos da Heloísa79. //Aqui vão Primeiro Andar e “Cenas de crianças”80. Estas foram escritas como férias à Paulicéia no mês seguinte do da escritura primeira e tumultuária desta. Não lhes dou a mínima importância e nunca as publicarei81 creio. Talvez alguma servisse pro Villa musicar. Villa que surpreendeu mais que ninguém no Brasil, na América, quase que no mundo, sendo-lhe superior apenas Mussorgski82, o material musical da criança. (...).
(...).

Mário

Notas:
- 78: Nota MB: Ariel: revista musical que se publicava em S. Paulo e da qual fui correspondente no Rio.
- 79: A crônica “Villa-Lobos”, noticiário sobre a chegada de Villa-Lobos ao Brasil, conta os sucessos do músico em Paris. MB mostra uma personalidade genial, dotada de “imaginação alucinatória”, trocando em miúdos algumas das declarações polêmicas de Villa-Lobos: “Noto aqui, maliciosamente, que o nosso querido amigo voltou brabo com os modernos. Não é moderno! [...] Eu não tenho estilo! [...] Aqui há um mal entendido sobre palavras.” (...).
- 80: Nem MA, nem MB conservaram em seus arquivos o manuscrito do poema aqui referido como “Cenas de crianças”.
- 81: Nota de MB: De fato nunca as publicou. Sempre achei que mereciam ser publicadas.
- 82: Modest Petrovitch Mussorgsky (1839-1881), compositor russo. [17]
- 16 de novembro: MB escreve a MA mencionando Villa:

[Rio de Janeiro], 16 de novembro de 1924.

Mário.

     Então Ariel semi-morreu. E morreu para nós. Tenho pena, também. Tinha meu fraco por Ariel. (...) //Ontem num concerto encontro-me com o Villa (Breve aparecerá aí por S. Paulo). Fomos depois juntos à casa do Guilherme, onde se despedia o Ronald, de partida para Peru, (...). //Saímos eu, Graça, Villa e Sérgio. (...) Eu recitei para o Villa o “Rola-Moça”, o “Coronel Antonio de Figueiredo Leitão” (com, por algo, a ponte “Eu quisera contar todas as histórias, etc., etc.”). Villa ficou assanhado.
(...)
Que quer dizer Ciao? Adeus italiano?... Pois Ciao!

M.[18]
- Carta sem data de MA a MB mencionando Villa:

[S. Paulo, dezembro de 1924].

Meu caro Manuel.

(...).
//Uma coisa: Não me saber dizer nada do Villa? Me escreveu que vinha para cá, marcou dia, até hora de chegada. Isso fazem quase duas semanas já137. E não veio. E não escreveu mais. Não fui na estação. (...).

Adeus.

Mário.

Nota:
- 137: Villa-Lobos, em bilhete de 20 de dezembro de 1924, informava sumariamente a MA: “embarco aqui infalivelmente terça-feira 23 do corrente e te pedir (sic) para comunicares aos nossos amigos”. (Arquivo MA, Série Correspondência).[19]
- 18 de dezembro: MA escreve a MB mencionado Villa:

[S. Paulo, post. 18 de dezembro de] 1924.

Manuel

(...).
Villa chegou139. Como sempre: chega, vê e vence. E cansa também. Vence por aquela força que tem, aquela inconsciência no agir em negócios que o tornam singularmente cômico nesta cidade negociante. Domina por isso. Creio que conseguiremos que ele arranje por aqui uns cobre e em troca dê uns concertos. Vamos a ver! Mas ao mesmo tempo que domina a gente pela música e pelo jeito, cansa, meu Deus! Quando ele começa a falar e diz teorias, críticas etc. é um pavor. Nunca vi cabeça mais embrulhada que aquela. Às vezes tem críticas finíssimas, acertadíssimas. Mas isso vem de embrulho com uma porção de nefelibatismos, erros e até tolices. Mas não faz mal. A gente agüenta a conversa dele porque lembra-se da música. Já estivemos juntos duas vezes. Hoje jantaremos em casa de Dona Olívia. Vai ser uma boa noitada com Souza Lima, Segall, creio que Paulo Prado também. Ando numa roda viva de prazeres e gostos. (...).
Conta-me coisas e me abraça.

Mário

Não tem jeito mesmo de vires ao concerto do Villa? Vê se arranjas isso. Está verão aqui. Até fins de janeiro, data do concerto, já não terá mais chuva. S. Paulo estará grandiosa.

Nota:
- 139: “O Villa chegou ontem aqui em S. Paulo”, escreve MA, em 10 dez. 1924 a Sérgio Milliet em Paris. Contudo, os concertos dele só se realizam no início de 1925. Em outra carta, sem data, agora para Prudente de Moraes, neto, MA menciona a apresentação de Villa-Lobos: “S. Paulo está cheia do Villa-Lobos. Já deu o 1º concerto. Estupendo. O só de músicas dele vai ser dia 19 de fevereiro. O Noneto, o Trio para instrumento de sopro, enfim o que ele tem de melhor entre as coisas modernas. Moderníssimas. Acredito que ele não escapa da vaia”. Despedindo-se de prudente nessa mesma carta, MA se queixa de abatimento e doença. No dia do tão esperado concerto, 18 de fevereiro, a doença ganha proporções de cama e então, a carta endereçada a Carlos Drummond de Andrade documenta o dissabor: “Devo estar bem doente. Hoje inda por cima, estou triste. A estas horas o concerto de obras do Villa deve estar pelo meio. Não fui.” (18 fev. 1925). [20]
- 18 de dezembro: MA escreve a MB mencionando Villa:

[S. Paulo], 29 de dezembro de 1924.

Manuel,

(...).

Bem, tua carta acabou. E a minha também. Vê se te resolver vir pro concerto do Villa. Estive ouvindo umas coisas do Noneto e da peça pra piano e orquestra. Fantástico. Se estiveres aqui eu te mostrarei as maravilhas que tem lá dentro. O que é mais engraçado é que o Villa está fazendo justamente o que nós queremos e o Z... não quer – Primitivismo pau-brasil. Não conte pro Villa isso. Era capaz de fazer música universal e integrar-se no Cosmos.

Mário [21]
Ilustração 2 - Capa do programa de uma das primeiras
apresentações de Villa-Lobos em Paris.

Adendo Cultural: 5 de fevereiro: Blaise Cendrars (1887-1961) chega ao Brasil, no Rio de Janeiro, é recebido por Graça Aranha, Ronald de Carvalho (1893-1935), Prudente de Moraes, neto (1904-77), Guilherme de Almeida, Sérgio Buarque de Holanda (1902-82) e outros. No dia seguinte segue para Santos (SP). Em Santos é recepcionado por Sérgio Milliet, Luís Aranha (1901-87) e Rubens Borba de Moraes. As autoridades brasileiras impediram o desembarque de Cendrars porque ele não tinha um braço. Nenhum imigrante mutilado podia adentrar o solo brasileiro nessas condições, ainda que resultantes de um ferimento de guerra. Horas depois, com a intervenção de Paulo Prado, Cendrars desembarcou e vai para São Paulo, onde é recebido por outros modernistas, entre eles, Couto de Barros (1896-1966). 8 de fevereiro: Lasar Segall abre à visitação pública do seu ateliê, à Rua Oscar Porto, nº 31, em São Paulo, onde recebe a visita de modernistas, entre eles Da. Olívia Guedes Penteado, o senador Freitas Valle, Godofredo da Silva Telles (1888-1980), dr. José Manuel de Azevedo Marques (1865-1943), entre outros. Em março, na Rua Álvares Penteado, 24, Segall realiza Exposição Individual. 21 de fevereiro: Cendrars realiza sua primeira conferência na casa do senador Freitas Valle e outra no salão do Conservatório Dramático e Musical, em São Paulo. 9 de março: Tem início o 5º e último Ciclo de Conferências na Villa Kyrial, organizado por Freitas Valle, terminando em 17 de junho. Em abril: Oswald de Andrade lança o “Manifesto Pau-Brasil”. 23 de março: Segall realiza Exposição Individual à rua Álvares Penteado, 24, em São Paulo e retorna a Berlim. Acontece a viagem do grupo modernista: Mário e Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Blaise Cendrars às cidades históricas de Minas Gerais. Em São Paulo é realizado o “VI Ciclo de Conferências da Vila Kyrial”, com palestras de Mário e Oswald de Andrade, Blaise Cendrars, Lasar Segall e outros. 19 de junho: Graça Aranha profere na Academia Brasileira de Letras a conferência “O Espírito Moderno” e, em seguida, desliga-se da Academia. Com a eclosão da revolução de Isidoro Dias Lopes (1865-1949) em São Paulo, contra o governo central da República, Tarsila e Oswald se refugiam com sua família na Fazenda Sertão, propriedade do pai de Tarsila. Setembro: foi lançada no Rio de Janeiro, a revista Estética, fundada por Sérgio Buarque de Holanda e Prudente de Moraes, neto. No exterior, em Paris, Vicente do Rego Monteiro realiza sua primeira exposição individual, na Galerie Fabre. Tarsila regressa, em setembro a Paris. Zina Aita deixa o Brasil fixando-se em Nápoles (Itália). Anita Malfatti participa do Salão de Outono de Paris, no Grand Palais e também participa da Exposition d’Art Latin Américain, no Musée Galleria.
Adendo Brasil: Em março, 31, falece Nilo Peçanha. 1º de maio: Carlos de Campos (1866-1927) é o presidente eleito do estado de São Paulo. Em julho: Revolução Tenentista, de Isidoro Dias Lopes (1865-1949), em São Paulo. Bombardeio em São Paulo e recuo das tropas até Catanduva, interior de São Paulo. Após a ocupação do centro da cidade pelas forças rebeldes, Carlos de Campos refugiara em Guaiaúna, pequena estação de trens, próxima à Vila Matilde. O presidente da República, Artur Bernardes determinou o bombardeio da capital, a despeito dos esforços do prefeito e de lideranças civis, que tentaram evitar a tragédia. A Revolução teve início no dia 5 de julho e termina no dia 23.

1925 – 3 de janeiro: MA escreve a MB mencionando Villa:

[São Paulo, post. 3 de janeiro de 1925].

Manuel.

Aproveito uma estiada do abatimento e escrevo pra você. (...). //Fiquei triste com a notícia de que de certo você não vem a São Paulo. Não sei quando será o concerto das obras do Villa. Talvez mesmo em fevereiro. Se você estiver com o Couto, ficará bem fácil dar um pulo até aqui. Se o programa valer a pena mando falar. O Villa talvez não possa dar quase nada das coisas novas que tem. É tudo dificílimo e requer concertistas consumados. Depois, ficam horrorizados com o modernismo e fogem com o corpo. É uma pena. Um dos meus maiores desejos seria ouvir o Trio para oboé, clarineta e saxofone. Me parece uma obra-prima. Ontem estive com o Villa de manhã. Coitado, de cara inchada, creio que um abcesso. Já soube que rasgou, pelo Rubens. Mas não fui lá, nem tive coragem pra telefonar. Passei hoje o dia inteirinho deitado. (...).

Mário [22]
- Em fevereiro, 8, 18 e 20, em S. Paulo, rege concertos somente com obras suas. 18 de fevereiro: quando Villa realizava concerto em S. Paulo, MA escrevia carta a Prudente de Moraes, neto (1904-77). Segue a descrição apenas dos dois primeiros parágrafos onde MA refere-se ao concerto de Villa:

18 de fevereiro 1925

Prudente

Castigo do céu... O concerto de Villa deve ter principiado agorinha mesmo...
Pra disfarçar esta raiva de não ir escrevo aos amigos. (...).[23]
- Villa realiza também concerto no Rio de Janeiro. Compõe o Choros n.º 2, nº 3, n.º 8 e o n.º 10. Compõe também as Serestas, para voz e piano. Em maio: viaja para a Argentina. Após concerto é apresentado pelo embaixador brasileiro, Pedro de Toledo (1860-1935). 26 de julho: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 21 de julho de 1925.

Marioscunque

(...). Há noites atrás passei horas agradáveis em casa do Villa. Não havia mais ninguém. E eu não deixei o homem sair da música. Villa é enorme. Com um piano de aluguel arrebentadíssimo, uma técnica à la diable, aquela voz, os olhos de louco e que mais, meu Deus? ele cria um conjunto orquestral inédito, tão admirável como um quarteto de cordas ou um jazz-band!! Eu rio e admiro a valer. Volto pra casa e não posso dormir. Começo a ver uma porção de Villa-Lobinhos, falando, gesticulando...

Abraços do M. [24]
- 13 de setembro: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 13 de setembro de [1925].

Mário

(...).
E o Vila em concubinagem com Coelho Neto??131
Ciao.

M.

Nota 131: O próprio Henrique Coelho Neto (1864-1934), ao fazer publicar a conferência que antecedeu à apresentação de Villa-Lobos no Instituto Nacional de Música, em 22 de setembro, justifica-se do aparente paradoxo: “O nome do audacioso artista, consagrado na Europa, já não desperta o riso: começam a tomá-lo a sério. Se o público o acolheu com simpatia e, por vezes, até com entusiasmo, não fizeram o mesmo certos mocinhos da grei chamada ‘futurista’, porque entenderam que Villa-Lobos traíra convidando-me para figurar no programa do seu festival, a mim, ‘um passadista ferrenho’”. Com ar de superioridade, Coelho Neto, não obstante a confessada ignorância musical, reconhece no compositor o caráter revolucionário, mas prevê um futuro menos tumultuário: “A sua música [...] está, por enquanto, férvida, acachoada, revolvendo-se em turbilhão espumoso [...] Há de chegar à planície e, remansada e límpida, correrá em rio, cantando docemente, reproduzindo todos os sons da Pátria.” Ainda pela letra do “passadista” encontra-se a alma do “modernista”: “Mas será Villa-Lobos futurista? Não! Disse-m’o ele próprio, com energia. Nem futurista, nem passadista – Eu sou eu!” (“Villa-Lobos”, s. ind., Arquivo MA, Série Matéria Extraída de Periódicos).[25]
- Em setembro, 22, Villa realiza concerto no Salão do Instituto Nacional de Música, Rio de Janeiro. Coelho Neto, a convite do maestro, foi o apresentador do concerto. 30 de outubro: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 30 de outubro de 1925.

Mário.

(...). Escrevi duas crônicas sobre o Villa, uma prao Brasil Musical, outra pra Idea Illustrada. Naquela é só elogio porque o italianão quando me pediu pra escrever alegou que não escrevia porque se escrevesse era pra meter o pau. História. Ele não escreve porque não sabe escrever. E como no concerto ele andou se rindo com um sujeito muito burro chamado Octaviano Gonçalves158, eu resolvi no artigo pra ele tratar o Villa de gênio. Na crônica da Idea como eu estava meio safado com o Villa homem, que reputo mau caráter, e safado com certas burrices e presunções de Villa artista e filosquetroque, resolvi esculhambar, reconhecendo aliás o mérito genial dele159. Também achei estupendo o Septimino160.
(...).
Ciao!

M.

Notas:
- 158: João Octaviano Gonçalves (1892-1962), ou J. Octaviano, como assinava, colaborou em periódicos musicais e lecionou no Instituto Nacional de Música, sucedendo a Francisco Braga na cadeira de compositor, a partir de 1938. (...).
- 159: As duas críticas de MB ao concerto de Villa-Lobos para pequenos conjuntos realizado no Instituto Nacional de Música do Rio, em setembro de 1925, foram coligidas em Andorinha, andorinha, sem indicação de periódico (“Villa-Lobos: um concerto em duas críticas”, p. 89-92). Ambas, realmente, manifestam entusiasmo pela obra do músico, ao concebê-la como “expressão de uma surpreendente vitalidade espiritual”. Diferem estrategicamente. Na crítica da primeira quinzena de outubro, MB não mede elogios: “um músico que sem favor podemos colocar entre os seis ou sete nomes mais fortes da atualidade musical” e, a certa altura da análise, constatando a audácia de Villa-Lobos, explode: “[...] genial. Genial, sim senhores. Acabamos com essa covardia pequeníssima de só falar em gênio quando o homem já morreu ou é estrangeiro!” No outro texto, também de outubro, MB a propósito de declarações do músico na imprensa argentina, encontra espaço para “esculhambar”: “Villa-Lobos para mim é músico e nada mais. Pensamento? Nunca vi mentalidade mais confusa. Temperamento? Ouvido? Isso Sim”.
- 160: A mais forte [das peças novas de Villa-Lobos] nos pareceu o Septimino (Choro nº 7), onde a par daquela prodigiosa riqueza de ritmos e de efeitos de timbres que formam a ambiência natural da música de Villa-Lobos [...] se encontram também deliciosos motivos melódicos, tão frescos, tão isentos de rebusca como de vulgaridade, comovendo a um tempo pelo que há neles de brasileiro e de universal. O Septimino é uma obra forte e leve, forte pela rica  timbres, pelas suas proporções formosíssimas. Isso era bem sensível, apesar de alguns senões da execução que carecia de mais ensaios.” (Andorinha, andorinha, “Villa-Lobos: um concerto em duas críticas”, p. 89).[26]
Adendo Cultural: Ano de fundação da Escola de Belas Artes de São Paulo. Ano também de fundação da Biblioteca Municipal de São Paulo, à Rua Sete de Setembro, 37. Foi aberta ao público em 1926. Tarsila do Amaral regressa ao Brasil, em fevereiro e retorna a Paris em dezembro. Tarsila Ilustra o livro Pau Brasil (poesia), de Oswald de Andrade. Da. Olívia Guedes Penteado cria em seu palacete, localizado entre a Avenida Duque de Caxias e a Rua Conselheiro Nébias, São Paulo, o Salão de Arte Moderna, com a reforma de uma antiga cocheira. Lasar Segall realizou a decoração do local, que ficou conhecido como “Pavilhão Modernista”. No Rio de Janeiro, em agosto, acontece a 32ª Exposição Geral de Belas Artes. Mário de Andrade publica a Escrava que não é Isaura. Vicente do Rego Monteiro realiza em Paris, na Galerie Fabre, sua primeira exposição individual. Di Cavalcanti retorna ao Brasil. 30 de junho: nasce em Campinas, SP, Anna Stella Schic, pianista. Foi amiga de Villa. Veio se consagrar como a “grande intérprete de Villa”, gravando toda a obra pra piano do Maestro. Escreveu o livro: Villa-Lobos – O Índio Branco. (Faleceu em 1º de fevereiro de 2009, em Nice, França). Lorenzo Fernandez lança sua primeira obra orquestral: a Suíte Sinfônica, sobre temas populares brasileiros. 18 de novembro: nasce em S. Paulo o maestro, compositor, tenor e jornalista Diogo de Assis Pacheco.
Adendo Brasil: Acontece na cidade de São Paulo a primeira edição da corrida de São Silvestre, iniciativa do jornalista Cásper Líbero (1889-1943). Em julho: a Coluna Miguel Costa-Prestes inicia sua marcha pelo Brasil. Washington Luís assumiu o posto de Senador por São Paulo.

1926 – Compõe durante o ano as dezesseis Cirandas para piano. São elas: Nº1: Teresinha de Jesus; Nº 2: A Condessa; Nº 3: Senhora Dona Sancha; Nº4: O Cravo Brigou com a Rosa; Nº 5: Pobre Cega; Nº 6: Passa, Passa Gavião; Nº 7: Xô, Xô, Passarinho; Nº 8: Vamos atrás da Serra, Calunga; nº 9: Fui no Tororó; Nº 10: O Pintor de Canaí; Nº 11: Nesta Rua, Nesta Rua; Nº 12: Olha o Passarinho, Dominé; Nº 13: À Procura de uma Agulha; Nº14: A Canoa Virou; Nº 15: Que Lindos Olhos; Nº 16: Có-Có-Có. 12 de abril: MB escreve a MA mencionando:

“Villa sofreu operação safada na bexiga”.[27]
- 15 de abril: MB escreve novamente a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 15 de abril de [1926].

Mário.

(...).//(...); de tarde fui me encontrar com o Dante pra irmos jantar com o Villa que eu imaginava ainda de cama cheio de ataduras e atamoles, e dei com ele de braço dado com o Dante na Avenida. Fomos pra rua Didimo. (...)//Depois do jantar Villa cantou duas coisas de uma série Serestas que ele está compondo. A 1ª é pra “Pobre cega” do Álvaro Moreyra. A 2ª é prao “Anjo da guarda”. A música do Anjo está matane parece uma tarde que não acaba mais. Fiquei com os olhos cheios d’água me atraquei com o Villa, beijei-o. Que bruta comoção, puta merda! Quando ele diz “um anjo moreno violento e bom – brasileiro” é tal e qual a minha irmã, Mário! A música é de uma simplicidade e de uma elevação, toda consonante mas de técnica bem moderna e imagine, o acompanhamento é um tema sincopado popular, antes de começar o canto o piano faz um floreio de violão. Começa o canto e quanto chega “ao pé de mim” há um ah! E o piano faz um intermezzo movimentado depois volta a baita melancolia do canto completando a melodia que tinha ficado suspensa. Eu senti uma felicidade... Vai demorar a se publicar porque Villa já vendeu a suíte ao Sampaio Araujo que manda imprimir na Alemanha. Porém eu arranjeit com o Villa mandar tirar uma cópia pra mim. Depois eu tirarei uma pra você, pois estou doido que você conheça.
Está aí, Mário. Uma abraço do Manu.[28]
- 18 de Abril: MA responde a carta a MB:

São Paulo, 18 de abril de 1926.

Manu.

Vivi o seu dia feliz. (...)//Me mande a coisa do Villa porque estou curioso de ver coisa nova dele pra canto e que tenha comoção além de musicalidade pura que nem a últimas. Toda a série de coisas pra violino e canto que ele fez ultimamente é esplêndido como musicalidade, como música pura, porém não tem nenhum sentido além do que nasce indeciso das impressões sensoriais. Estupendo porém sob o ponto-de-vista união de poesia e som me parece indeciso e mesmo defeituoso. Eu sei que a voz pode ser considerada como um instrumento e nada mais, como no Quarteto simbólico, até gosto muito disso, porém desque se trate de poesia e música acho que a música tem que ver com a poesia pra que a ligação seja íntima. (...). Em geral não gosto da música pra canto do Villa. Gosto muito das coisas recentes porém não considero isso música pra canto, é música pra dois instrumentos: violino e voz. Estou pois impaciente pra ver o Anjo-da-guarda, não se esqueça de me mandar. (...).//Ciao, Manu do coração. Em junho bem possível que vá passar uma semana no Rio. Não conte pra ninguém.

Mário
O pai do Gui acaba de morrer. Razão por que esta carta só vai hoje, segunda.[29]
- 1º de maio: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 1º de maio de [1926].

Mário.

Com esta lhe mando sob registro uma cópia da música que o Villa escreveu prao “Anjo da Guarda”. Não garanto muito que a cópia esteja fiel. O que garanto é que foi obra de amor pois me deu um trabalhão safado e desanimei duas vezes. O Villa musicou também a poesia do Dante. Embora a melodia seja muito bonita, acho que não condiz com o espírito da letra. Me parece que à poesia do Dante devia ser aplicada aquela maneira claramente expositiva a que você se referiu em sua carta: aqueles versos tem um tom expositivo, não cantante, e a melodia que o Villa arranjou é cantantíssima. Tenho entendido e gostado das últimas coisas de canto do Villa; os estudos e leituras que ele tem feito para a obra de folclore que o Arnaldo Guinle encomendou a ele adoçaram, simplificaram, clarificaram o Villa, é a primeira impressão45. A série das Cirandas para piano são tão bonitas, tão brasileiras e tão pianísticas. É uma gostosura, como você diz. Achei graça que no dia de receber a sua carta estive à noite em caso do Villa e ele, indignado porque os acompanhadores das músicas de canto dele maltratam a parte de piano, disse que de agora em diante vai pôr nas músicas: para piano com acompanhamento de canto.
(...)
Um abraço do

Manu.
(...)

Nota 45: O empresário e dirigente desportista carioca Arnaldo Guinle (1884-1964), encontrando-se com Villa-Lobos em Paris, convida-o para organizar material de feição popular coligido no Nordeste pelos compositores Pixinguinha, Donga e João Pernambuco. Em 8 de janeiro de 1925, Villa-Lobos, entrevistado por Alcântara Machado, explana o projeto: "Pus-me então a elaborar a grande obra em que estou empenhado e que compreenderá 3 volumes. O primeiro, sobre música [...]. O segundo e o terceiro volumes sobre poesia e dança, serão divididos em 3 capítulos: folclore das matas, dos serões e das capitais [...]. Tive necessidade de classificar, de maneira absoluta, todas as músicas e todos os dados e documentos, que vão além de mil.” (“Villa-Lobos e o folclore nacional”, Arquivo MA, Série Matéria Extraída de Periódicos). Gorando o projeto, parte dessa documentação – os folhetos de cordel – foi parar nas mãos de MA, possivelmente em 1929, que passou a utilizá-la como objeto de pesquisa nos planejados Dicionário Musical Brasileiro, Zoofonia, etc. (TERRA, Ruth B. Lêmos. A literatura de folhetos nos Fundos Villa-Lobos).[30]
- 17 de setembro: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 17 de setembro de [1926].

Mário.

(...).//Ainda a respeito do Xangô: a melodia chim é mesmo a quem vem na Enciclopédia do Lavignac mas preciso contar que foi o Villa quem deu com ela e batucou-a no piano pra nós ouvirmos. Anteontem voltei à casa do Villa, ele ainda não tinha chegado e eu fui verificar o caso no piano Confesso que achei muito menos analogia e perguntei ao Villa: “É essa mesmo?” ao que ele respondeu: “É. É o Xangô. Os mesmo intervalos”. Não disse nada a ele desta nossa conversa. Não adiantava. Com o Villa quase que não adianta conversar sobre nada. A respeito da maxixe quis aprender com ele. Depois verifiquei que ele repetia mal o que ler no Guilherme de Melo86. Você conhece a obra dele? Ele dá o maxixe como variante moderna do lundu de origem africana. O Villa me disse que o Cardoso de Menezes velho possui em casa o primeiro maxixe, - o maxixe original que apareceu nos clubes carnavalescos. Estou com vontade de procurar esse homem e conversar com ele. A minha idéia é que a palavra “maxixe” vem do título de algum lundu de sucesso onde apareceu pela primeira vez em ritmo mais peculiar. (como o Charleston saiu do fox-trot)87.
(...).
Não posso mais. Ciao.

M.

Notas:
- 86: Guilherme T. Pereira Melo (1867-1932), autor de A Música no Brasil – Desde os tempos coloniais até o primeira decênio da República, a primeira abordagem histórica da música brasileira. (...).
- 87: No envelope que MA destinou para guardar informações do verbete “maxixe” do planejado Dicionário musical brasileiro, uma folha de papel jornal com informações sobre o termo mostra a caligrafia de MB. Esse manuscrito, sem assinatura, informa: “Villa descobriu, julga ter descoberto a origem do maxixe. Um afinador da Casa Artur Napoleão que tem 84 anos e um certo comendador de igual idade assistiram ao nascimento do maxixe num clube carnavalesco, o 1º que se fundou no Rio. ‘Maxixe’ era o apelido do sujeito que nesse clube dançou o lundu de um certo jeito particular que imitado depois por outros deu no maxixe. A música do  lundu evoluiu da mesma forma, impulsionada pelo movimento rítmico da dança. Os dois velhos conhecem o 1º lundu-maxixe. Villa tomou nota de tudo. Será mesmo assim? Pelo menos é razoável./[à margem] O clube parece que se chamava Altenberg ou coisa parecida”.[31]
- 15 de novembro: Villa participa no Teatro Lírico do Rio de Janeiro, do “O Grande Concerto de Coros e Orquestra”, um espetáculo de gala em homenagem ao Governo da República. O coral teve a participação de cerca de 200 figurantes. Em 24 de Novembro, o programa foi repetido no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, com pequenas alterações. Realiza ainda três festivais sinfônicos para a Associação Wagneriana de Buenos Aires, antes do seu retorno à Europa. Compõe o Choros n.º 4, o n.º 5 e o n.º 6. Compõe também as Cirandas, para piano. Segundo José Maria Neves (Villa-Lobos, o choro e os Choros), renomado mestre e profundo conhecedor da obra villalobiana, o Choros nº 10, “estreado no Rio em 15 de novembro, representa a síntese da síntese – uma vez que os Choros se constituem na síntese do pensamento musical de Villa-Lobos”.[32] No final do ano viaja novamente para a Europa com Lucília. Em Paris hospeda-se no apartamento dos Guinle, na place St. Michel. Com data de 30 de novembro, MB escreve o artigo “Villa Regendo” [Bandeira, Manuel. Andorinha, andorinha. Edição comemorativa do Centenário de Nascimento do Bardo. Seleção e coordenação de textos de Carlos Drummond de Andrade. Editora José Olympio, RJ, 2 ed. 1986, pp. 92/93], referindo ao concerto do Villa de 15 de novembro:
O grande concerto de coros e orquestra realizado em 15 de novembro por iniciativa do maestro Villa-Lobos, foi um dos mais belos espetáculos de arte brasileira que já se ofereceu ao nosso público. (...)A música nacional há muito tempo que vem repontando, balbuciando na obra dos nossos compositores. Agora tem-se a impressão que começou a falar. Pelo menos este concerto do maestro Villa-Lobos já nos deu uma sensação acabada e gostosa de coisa bem nossa.
(...).
No dia do concerto havia mais luz, havia menos ingenuidade, não havia o cansaço. No dia do concerto havia em toda a gente, no palco e na plateia, entusiasmo, satisfação, gostosura, como se todo o mundo estivesse chupando manga numa varanda de fazenda. (...).
No “Choro nº 3” de Villa-Lobos a parte do Pica-pau é estupenda: a unidade do choro me pareceu duvidosa com o “Nozanina-Orekuá” no começo, e aquele estapafúrdio “Brasil! Brasil!” do fim. (...). Acho que ficava melhor “barril”.
(...).
Villa-Lobos foi aclamado pela plateia unânime, como de fato merecia, estendendo-se os aplausos aos seus numerosos colaboradores, entre os quais se contava a fina flor dos nossos professores, cantores e amadores, que o presentearam em cena aberta com uma baita batuta de ouro. [30.XI.1926]
Adendo Cultural: Tarsila do Amaral faz a 1ª exposição individual em Paris, na Galerie Percier, em 7 de julho, apresentado 17 obras feitas entre 1923 e 1926. Após a exposição Tarsila retorna ao Brasil. Mário de Andrade começa a escrever Macunaíma. Anita Malfatti expõe no Salão da Sociedade dos Artistas Independentes – aberto em março. Primeira vinda do criador do Manifesto Futurista (1909), o escritor, poeta, político egípcio-italiano, Felippo Godoy Tommaso Marinetti, no Brasil. Chega ao Rio de Janeiro e faz palestra no Teatro Lírico, sendo apresentado por Graça Aranha. Blaise Cendrars faz sua segunda viagem ao Brasil. Mário de Andrade publica Primeiro Andar e Losango cáqui. Oswald de Andrade e Tarsila casam-se em 30 de outubro. De 20 de novembro a 5 de dezembro, Anita Malfatti realiza exposição individual na Galerie André, rue des Saints-Pères, que foi inaugurada com uma vernissage no dia 19, com a presença do embaixador brasileiro Luís Martins de Souza Dantas (1876-1954). Ano de fundação da revista Terra Roxa, em São Paulo. Victor Brecheret faz sua primeira exposição individual em São Paulo, Rua São João, 187-A, iniciada em 4 (ou 7?) de dezembro. Ano do lançamento do Manifesto Regionalista, no Nordeste, tendo na liderança: Gilberto Freyre (1900-87).
Adendo Brasil: Washington Luís assume a presidência no dia 15 de novembro.

1927 – Em companhia de Lucília, parte novamente para Paris e se instala na Place St. Michel n.º 11. Em 13 de março, exibe com Souza Lima, na Salle Gaveau, música para um filme mudo – documentário sobre o Brasil. Trabalha como revisor na casa Max Esching. Abril: Na Europa, Villa negocia a publicação das suas partituras com a editora Max Eschig. Existe uma vasta correspondência entre Villa e Carlos Guinle versando sobre os contratos com a editora Max. Essa correspondência faz parte do acervo do Museu Villa-Lobos. Em 24 de outubro realiza concerto na Salle Gaveau, em Paris. Assim foi anunciado pelo Le Courrier Musical, em 15 de outubro:
“Um importante concerto consagrado à audição de obras de Villa-Lobos, um dos líderes da escola musical sul-americana contemporânea, terá lugar na segunda feira, 24 de outubro, em soirée, na grande Salle Gaveau. Os famosos pianistas sr. Arthur Rubinstein, sra. Aline van Barentzen, sr. Tomás Terán, a notável cantora sra. Elsie Houston prestarão sua prestigiosa colaboração, enquanto que a orquestra, composta exclusivamente de artistas dos Concerts-Colonne, será regida pelo sr. Villa-Lobos”.[32.1]
- Em 5 de dezembro rege ainda na Salle Gaveau: Concerts Colonne e L’Art Choral;

Ilustração 3 - Capa do cartaz de apresentação em Paris.

Adendo Cultural: A 15 de janeiro, Antonio Gomide fez uma de suas poucas exposições individuais: “Exposição Antonio Gomide - Afrescos e Pinturas”, em antiga galeria da Avenida São João, 187.  25 de janeiro: nasce no Rio de Janeiro o maestro, compositor, cantor, pianista e violonista, Antônio Carlos Jobim. Anita Malfatti participa do Salão dos Independentes, em janeiro e fevereiro. Participa também do Salão da Tuileries, em abril e do Salon D’Outomme, em Paris. MA, Da. Olívia Guedes Penteado, Dulce (filha de Tarsila) viajam ao Nordeste e Norte do Brasil, chegando até Iquitos, no Peru. Oswald de Andrade publica Primeiro Caderno de Poesias de Oswald de Andrade, com capa de Tarsila do Amaral. Em São Paulo, na Rua Santa Cruz, nº 325, Vila Mariana, o arquiteto Gregori Warchavchik (1896-1972) constrói a primeira Casa Modernista do Brasil, que passa ser sua residência. Os jardins da casa foram projetados pela esposa do arquiteto, Mina Klabin (1896-1969). MA entra como crítico de arte no Diário Nacional, de São Paulo. Lasar Segall naturaliza-se brasileiro e realiza exposição individual em São Paulo, à Rua Barão de Itapetininga, 50. MA publica o romance: Amar, Verbo Intransitivo. René Thiollier, o mecenas da Semana de 22, publica O Homem da Galeria: ecos de uma época. Flávio de Carvalho (1899-1973) apresenta projeto ao concurso para o palácio do governo, em São Paulo. Cícero Dias (1907-2003) realiza sua primeira exposição individual no Rio de Janeiro. 25 de janeiro: nasce no Rio de Janeiro o maestro, compositor, cantor, pianista e violonista, Antônio Carlos Jobim. 24 de novembro: falece, em Bauru (SP), o poeta Rodrigues de Abreu. Em Cataguases, MG, surge a revista Verde com o Manifesto do Grupo Verde de Cataguases, com intuito principal de “Abrasileirar o Brasil”. No Rio de Janeiro, Tasso da Silveira (1895-1968) lança a revista Festa.
Adendo Brasil: Getúlio Vargas (1883-1954) é eleito deputado federal. 27 de abril: falece o presidente do estado de São Paulo, Carlos de Campos. Nesse mesmo dia, Antonio Dino da Costa Bueno, então presidente do senado estadual, assume o poder até 14 de julho, quando Júlio Prestes de Albuquerque torna-se Presidente eleito. Seu governo terminará em outubro de 1930. Fundação do Partido Democrático, com a participação de MA. A Constituição do Rio Grande do Norte concede, pela primeira vez no país, o direito de voto às mulheres.    

1928 – Em Paris, compõe o Choros Bis, o Choros n.º 11. Em junho, no Diário da Noite, é publicada a matéria A Música Brasileira em Paris, transcritos na sequência apenas os dois primeiros parágrafos, onde menciona Villa:
As origens da nossa música-Confronto com a américa – O samba de um século mais antigo que o foxtrot, segundo Villa-Lobos.
O sucesso de Villa-Lobos em Paris não é um sucesso de agência telegráfica. É autêntico. O interesse despertado pela audição de suas obras não foi passageiro. Foi profundo, e perdura. Pode-se dizer que, graças ao nosso grande compositor, a música brasileira foi e ainda é a grande revelação musical da atualidade.
(...).[32.2]
Adendo Cultural: Lasar Segall realiza exposição individual, em julho, no Rio de Janeiro, no Palace Hotel. Segall viaja e passa a residir em Paris. Tarsila pinta Abaporu e presenteia a Oswald de Andrade, no aniversário deste. Foi essa obra que deu ideia a Oswald de Andrade, juntamente com Raul Bopp (1898-1984), elaborar um manifesto denominado Antropófago, publicado no primeiro número da Revista de Antropofagia, em 1º de maio, que contava também com a participação do escritor Alcântara Machado (1901-35). Tarsila realiza, em Paris, sua terceira exposição individual na Galerie Percier. Anita Malfatti participa da 39ª Exposition Societé des Artists Indépendantes, em Paris, no Grand Palais. Em setembro: Anita retorna ao Brasil, partindo de Marselha, a bordo do “Mendoza”, em 10 de setembro, aportando no Brasil no dia 27. Vicente do Rego Monteiro realiza sua segunda mostra individual em Paris. Mário de Andrade publica Ensaio sobre a Música Brasileira e seu livro mais famoso e polêmico: Macunaíma. Paulo Prado publica Retrato do Brasil. Cassiano Ricardo publica Martim-Cererê. Alcântara Machado publica Laranja da China. Anita Malfatti realiza mostra em São Paulo.
Adendo Brasil: 25 de janeiro: Getúlio Vargas toma posse como governador do Rio Grande do Sul. 3 de dezembro: “Cobriu a manhã gloriosa de hoje o luto do maior desastre da aeronáutica brasileira” – essa era a manchete da edição vespertina do Globo de 3 de dezembro de 1928, que relatava uma tragédia ocorrida no Rio de Janeiro: a queda de hidroavião da Kondor Syndicate, ocupado por amigos de Santos Dumont. Em homenagem ao Pai da Aviação, que voltava da Europa para o Brasil, o grupo resolvera sobrevoar o navio SS Cap Arcona que trazia Dumont a bordo para despejar pétalas de rosas. Mas o aparelho caiu perto do chamado Parcel das Feiticeiras, na altura da Ilha das Cobras, e afundou. Entre passageiros, tripulantes e socorristas, morreram 14 pessoas.[32.3]

1929 – Janeiro: Suzanne Demarquez, em Paris, publica na revista Musique, artigo sobre os Choros, de Villa. Compõe o Choros n.º 9, os 12 Estudos para violão. No início do segundo semestre, volta ao Brasil. 12 de agosto: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 12 de agosto de 1929.

Mário

(...)//A novidade é a chegada do Villa. Não fui ao desembarque. Esperei encontrar-me com ele na rua, o que se deu logo no dia seguinte. Ele me levou pra frisa dele no concerto do Borovsky. De noite fui à rua Didimo ver Lucília. Villa vai dar já 3 concertos – canto (serestas) e música de câmara (sonatas e trios). Falando muito num Varèse35, cuja música aliás ele não aceita nem compreende. Tentei fazer que ele me explicasse o que era essa música de Varère (reação contra Strawinsky – dizia Villa). Villa disse que são “blocos sonoros”. Mais encore? Grande atrapalhação, muito gesto, uma porção de asneiras e ficou por isso mesmo. O Villa continua “uma novidade”, como diz o Dodô. Não dá aqui o Pai do Mato para fazer a vontade de você que pediu a 1ª audição para São Paulo. Isto é sacanagem! Diz que foi um sucesso em Paris. Adeus.

Abraço do M.

Nota 35: O compositor francês, naturalizado norte-americano, Edgard Varèse (1883-1965), (...).[33]
- Villa organiza concertos no Rio de Janeiro, dia 26 de Agosto, no Teatro Lírico, e em S. Paulo, em 2 de outubro, rege: Grande Concerto Sinfônico. Em 4 de outubro, volta à Europa. É professor de composição no Conservatório Internacional de Paris e faz parte do Comitê d’Honneur. Para termos uma ideia da perseguição do crítico Oscar Guanabarino, segue uma publicação no Jornal do Commercio, edição de 26 de junho:
“Se formos expor aos olhos estrangeiros todas as nossas vergonhas – ai de nós. Basta o que acaba de fazer em Paris o “Barulhista” Villa-Lobos com a sua música carnavalesca. Esse brasileiro que se proclama propagandista do que é nosso, em matéria de arte nacional, publicou o Choro nº 10, composição cujo ritmo é africano e a letra tola ou africana, não sabemos de que nação, mas que o célebre introdutor de reco-reco brasileiro em Paris nos dirá se é cabinda ou nagô. E é por essa forma que o propagandista nos desmoraliza em Paris, procurando fazer crer que somos um povo de negros e que a nossa arte não vai além da borracheira africana”. [34]
- 26 de outubro: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 26 de outubro de 1929.

Mário.

Recebi o seu bilhete acusando recebimento das coisas do Villa. Sobre esse caso me entendi o cunhado dele que me perguntou se era a matéria referente ao folclore do Brasil ou aos outros também. Respondi que era tudo. (...)//Não tive com o Villa. Ele chegou daí no dia 5 e embarcou no dia seguinte para Barcelona, de onde foi chamado por telegrama. Não se despediu de ninguém38. Está tudo danado com ele: Téran39, Nascimento, Elsie, etc. Ele não deu entrada de favor nem para a mãe do Nascimento que tomava parte do concerto! Francisco Braga40 teve de comprar bilhete. Resultado: vazantes desoladoras e antipatias gerais. A gente vai, aplaude, admira, mas reserva-se o direito de esculhambar o gênio... Mas o Villa não faz caso de afeições e simpatias: ele quer é o cobre e a admiração. Coitadinho do Villa, como diz o Nestor Vítor!...

Abraços do M.
(...)

Notas:
- 38: Villa-Lobos e Lucília remetem a MA em 18 de outubro cartão postal de Barcelona onde se realizava a Exposição Internacional: “Boa Viagem. Brilhante recepção, hospedagem num lindo hotel em frente à Exposição que é uma maravilha! Concerto dia 25, 400 vozes e grande orquestra que o Villa dirigirá, e ele começou a ensaiar no mesmo dia. Escreverei logo e enviarei notícias e programas [...]”. Logo depois, de Paris, Lucília relata os sucessos do marido no concerto “num salão que comporta 15 mil pessoas” (7 nov. 1929. Arquivo MA, Série Correspondência). MA tinha divulgado no Diário Nacional críticas sobre Villa-Lobos; no artigo de 25 de setembro escreve: “Possuidor de uma musicalidade prodigiosamente fecunda, os seus desenvolvimentos melódicos são talvez dos mais ricos e variados que conheço.” (“Villa-Lobos”, Brasil 1º tempo modernista, p. 373).
- 39: O pianista espanhol Tomás Téran (1895-1964) foi apresentado a Villa-Lobos em Paris, possivelmente em 1924. Desde então, ajudou a difundir a obra do compositor brasileiro. Visitando o Brasil em diversas ocasiões, só em 1930 aqui fixou residência, acabando por se naturalizar. (...).[35]
- Em outubro, vários comentários sobre Villa foram publicados na imprensa espanhola. Seguem, parcialmente, algumas dessas publicações[35.1]:
As obras de Villa-Lobos foram as mais salientes, não só deste concerto, mas, dos quatro festivais libero-americanos. Na música desse jovem compositor brasileira há um poderoso instinto musical, uma força rítmica extraordinária, um grande alento e um positivo dom de orquestração.
As obras dele estão cheias de fantasias harmônicas e de complicações inúteis e de excessiva orquestração, mas dentro de todas essas notas corre uma torrente de vida e vibra um sopro musical que impõe. Não se pode duvidar disto depois de se ter ouvido os Choros X, especialmente desde a e entrada do coro até o final, todo em um ritmo contínuo e uma melodia que corre seguindo uma grande linha.
(J. Pahissa, no ‘Los Notícias’, em 26 de outubro).
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Estamos convencidos que Villa-Lobos é um artista originalíssimo e genial. Possui um conhecimento dos recursos técnicos admirável e para se libertar, sem dúvida, da denominação de “selvagem” dada às suas obras de vanguarda, pôs no programa o prelúdio sinfônico de Yzaht, de escrita claríssima e perfeita e de amplas e belas harmonias engendradas nos mais puros procedimentos clássicos.
(...).
O compositor Villa-Lobos tem inspirações geniais, é realmente um caso extraordinário, de forte temperamento, nervos de verdadeira força emocional, dentro dos atrevimentos e audácias da música contemporânea.
(Alfredo Romea, no ‘El Noticiero Universal’, em 28 de outubro).
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O que ouvimos deste compositor brasileiro foi bom, muito bom, o melhor que nos deram estes festivais libero-americanos.
Assim pensava e continuei pensando quando na noite de ontem ouvi a este admirável Heitor Villa-Lobos que para mim é um compositor perfeito. O ímpeto é o que mais me surpreende neste músico, tão separado da Europa e que tanto interessa aos europeus. Não crio que a América conte hoje em dia com outro compositor do talhe de Villa-Lobos.
(Rafael Moragas, no ‘La Noche’, em 26 de outubro).
Adendo Cultural: 1º de Fevereiro: Anita Malfatti abre sua mostra individual numa sobre loja na Rua Libero Badaró, nº 20, em São Paulo, permanecendo até 9 de março. Tarsila do Amaral realiza sua primeira exposição individual em São Paulo, no edifício Glória, início da Rua Barão de Itapetininga, nº 6 e no Rio de Janeiro, no Palace Hotel. Mário de Andrade, Paulo Prado e Antônio de Alcântara Machado (1901-1935) rompem amizade com Oswald de Andrade. Oswald de Andrade separa-se de Tarsila e inicia relacionamento com Patrícia Galvão, Pagu (1910-62). Em maio, Portinari faz sua primeira exposição individual, no Palace Hotel do Rio de Janeiro. Em junho, embarca para a França. No Rio de Janeiro, Ismael Nery realiza exposição. O artista plástico Alberto da Veiga Guignard (1896-1962) retorna ao Brasil. Cândido Portinari realiza sua primeira exposição individual, com 25 retratos, no Palace Hotel do Rio de Janeiro e em seguida embarca para a França retornando ao Brasil somente em 1931. 7 de setembro: Ismael Nery realiza sua primeira exposição individual no Palace Theatre, em Belém do Pará.
Adendo Brasil: Acontece o Crack da Bolsa de Nova York e o preço do café no mercado internacional cai, provocando a falência de inúmeros fazendeiros brasileiros. Lançamento da candidatura de Getúlio Vargas à presidência da República, em julho, pelo vice-governador do Rio Grande do Sul, João das Neves.

1930 – Janeiro, 25, Villa está na Europa, em Paris. Em 3 de abril e 7 de maio rege dois festivais: Festival Villa-Lobos, ambos na Salle Gaveau, em Paris. Retorna ao Brasil chegando em Recife no dia 1 de junho, em companhia do violonista belga Maurice Raskin. Realiza concertos nos dias 6 e 10, no Teatro Santa Isabel. Dia 29 de junho, já está em S. Paulo, a convite de d. Olívia Guedes Penteado. Elabora um plano de educação musical que é apresentado à Secretaria de Educação de S. Paulo. Getúlio Vargas (1882-1954) chega ao poder à frente de uma revolução. Nomeado interventor para S. Paulo, João Alberto convida Villa para discutir o plano de educação musica. Ainda nesse ano compõe Bachianas Brasileiras nº 1, 2 e 4. Segundo os críticos, a Bachiana nº 2 é a mais célebre de todas as Bachianas. Ela é composta por: Prelúdio (O Canto do Capadócio), Ária (O Canto da nossa Terra), Dança (Lembrança do Sertão) e Tocata (O Trenzinho do Caipira). Sobre O Trenzinho do Caipira, uma peças mais conhecidas de Villa, assim expressou o maestro russo André Kostelanetz (1901-80), tradução de MB:
O “Trenzinho do Caipira” é uma das mais belas e imaginativas páginas de Villa-Lobos. Nós a admiramos tanto que a gravamos duas vêzes, sendo que a última vez com a New York Philharmonic completa.
(...).[35.2]


Ilustração 4 - Villa-Lobos com a soprano Nair Duarte,
a pianista Antonieta Rudge e, à direita, sua esposa Lucília, em 1930.

- Consta que a situação financeira de Villa, nessa época, era precaríssima. MA escreve nesse ano vários artigos enfocando Villa. Na sequência: descrição parcial de alguns desses artigos, conservada a ortografia original:

Artigo A – 2 de Julho, Diário Nacional de S. Paulo:

Que Villa-Lobos tenha enfim no Brasil uma consagração digna dele é o que desejo. Nós ainda não presenciamos com clareza o que ele representa para o Brasil. Por mais que as transcrições de artigos sobre ele publicados no estrangeiro provem a importância dele, essas transcrições não bastam para mostrar a formidável propaganda do Brasil que Villa-Lobos faz lá fora. Ele não fixa cartazes nas paredes do mundo, mostrando que o café é gostoso, enquanto a Colômbia planta mais café valorizado pela nossa estupidez. Mas em compensação ele tornou o Brasil uma coisa humana de permanência viva na consciência de milhares de estrangeiros. Ele humaniza o Brasil lá fora. Às vezes uma revista musical estrangeira repete nas páginas de um só número, em artigos, notícias, programas, quatro, cinco e até mais vezes o nome dele. E não são apenas elogios de uma consagração acarneirada e pacífica. Deus te livre! São irritações, ataques, discussões, procuras de compreensão, notícias cuja importância os diários aproveitam em títulos e subtítulos com grandes letras. (...).
Porque se deu essa coisa benéfica e importante. Villa-Lobos e Brasil tornaram-se uma coisa só na compreensão do mundo. Se é certo que essa espécie de juízo crítico é por muitas partes falso, pois há na obra do grande compositor um número enorme de invenções exclusivamente pessoais, que são dele e não do Brasil, ou por outra: que são do Brasil apenas porque são exclusivamente de Villa-Lobos e ele é nosso – não tem dúvida que essa unificação absoluta da obra de Villa-Lobos e do Brasil veio nos beneficiar imenso como propaganda. Propaganda que incontestavelmente jamais nenhum outro artista brasileiro realizou com tanta eficácia a favor do Brasil.
Mas esse artista, de uma genialidade que ninguém discute embora possam lhe discutir uma ou outra criação, esse realmente grande compositor de uma atividade assombrosa, de quem o Brasil está se beneficiando imensamente, nós deixamos que se debata num angustiosa vida de aventuras musicais, virando empresário aqui, virando virtuose de violoncelo em outra parte, se prendendo a empresas editoras que o exploram a valer. É certo que todas essas atrapalhações de vida jamais impedem o verdadeiro artista de produzir obras geniais. E de fato, a essa desproteção vergonhosa, Villa-Lobos responde nos dando o Choros nº 10, o Amazonas, as Cirandas, as Serestas e outros monumentos com que o Brasil enriquece a música universal.[36] 

ARTIGO B - VILA LOBOS VERSUS VILA LOBOS

(Todos os artigos, de I a VII, da série com o título: “Vila Lobos versus Vila Lobos, de Mário de Andrade, poderão ser lidos na íntegra em: Andrade, Mário de. Musica, Doce Musica. Coleção: Obras Completas de Mário de Andrade, Vol. VII. Livraria Martins Editora, S. Paulo, 1963 – pp. 143 a 164. Mesmo na descrição parcial que segue, poderemos verificar a postura de MA relacionada com os concertos realizados por Villa, na cidade de S. Paulo, em 1930):

I

Como já muitos sabem o número de novembro da “Revue Musicale”, de Paris, estourou gratamente pelo Brasil a dentro, homenageando Vila Lobos com dois artigos e retrato. Dois artigos excelentes.
Mas o que me deixou muito imaginando é a pequena biografia com que a sra. Suzana Demarquez inicia o artigo dela. É uma página apreensiva, com muitas coisas verdadeiras, algumas leves inexatidões, e fantasia “charmante”. Aí se conta, por exemplo, que o nosso grande musico, no periodo de 1909 a 1912, realizou afinal a sua desejada viagem através das terras inda habitadas por indios, incorporado a várias missões cientificas, principalmente alemãs. Foi assim que poude viver da vida amerindia, observar longamente os seus colegas musicais de tacape, assistir festas de feitiçaria, colher temas e penetrar intimamente a psicologia dessas gentes e mais a ambiencia das nossas terras inda... não direi que virgens, mas pelo menos ainda naquela mesma disponibilidade nupcial das moças indígenas depois da cerimonia de nubilidade.
Todas essa viagens de Vila Lobos através de sertões botocudissimos, seguindo pacientes missões germânicas, me lembraram mais uma vez a apaixonada imaginativa da sra. Delarue Mardrus, que uma feita, espaventada com as aventuras de Vila Lobos, em Paris, escreveu sobre êle um artigo tão furiosamente possuido de agua possivelmente alcoolica de Castalia, que o nosso musico virou plagiario de Hans Staden. Foi pegado pelos indios e condenado a ser comigo moqueado. Prepararam as indias velhas a famosa festa da comilança (o artigo não diz se ofereceram primeiro ao Vila a india mais formosa da maloca) e o coitado, com grande dansa, trons de maracás e roncos de japurutús, foi introduzido no lugar do sacrifício. (...).
Afinal, eu não culpo muito esta senhora que acredito mui sincera, apesar da sua imaginação. (...).
Pois também na vida de Vila Lobos as mulheres têm penetrado intimamente. Umas lhe são de grande auxilio, como é o caso da esposa do musico, dona Lucilia Vila Lobos, cujo maravilhoso devotamente desperta admiração em quantos se acercam do inventor dos Chôros. Outras, direi, que lhe serão de curiosa vulgarização, como é o caso desta sra. Delarue Mardrus. E que Deus as conserve a todas pra que facilitem ao grande artista a escalada nem sempre espinhosa da glória.
(1930).

II

Vila Lobos inaugurou no sabado passado a série de concertos sinfonicos que veio dirigir em S. Paulo. Antes de mais nada, carecemos compreender bem toda a extraordinaria importancia dessa temporada. Os oito programas estão repletos de novidades e só por isso têm um valor excepcional. Mas além disso teremos uma demonstração especial do temperamento de Vila Lobos como regente. (...). Vila Lobos tem dirigido algumas das milhores orquestras europeas. AS suas interpretações interessam sempre e nelas, aliás, se revela o mesmo temperamento viril, audacioso, impetuoso, com que as composições dele já nos familiarizaram. Nada de preciosismos e de subtilezas barrocas: uma concepção global das obras, sempre decisiva e sempre inventiva. Isso provou mesmo a interpretação do Primeiro Concêrto Brandenburguês, de Bach, sabado, com a curiosa substituição do violino pequeno por um violinofone. O efeito ficou curiosissimo, e especialmente o timbre no segundo tempo, casando-se admiravelmente o timbre do violinofone com o de certos instrumentos de sôpro.
Do programa constavam ainda, em primeira audição, as Saudades do Brasil de Dario Milhaud, que já fizeram a volta ao mundo.
(...).
Acabaram o espetaculo as já célebres Dansas Africanas de Vila Lobos. Não tenho mais o que dizer sobre essas tres peças que estão entre o que de milhor existe na primeira fase do grande musico. Sempre é curioso notar porêm que entre os indios de Mato Grosso, (pelo menos é o que conta Vila Lobos...), êle tenha encontrado uma escala maior com a quarta aumentada, escala essa que freqüenta o populario musical nordestino, como já demonstrei no “Ensaio”. Será pois mais um dos raros elementos que ficam da influência amerindia dentro do homem brasileiro atual.
(15 – VII – 1930).

III

Realizou-se ontem o sexto concêrto mensal da Sociedade Sinfonica de S. Paulo. Regencia de Vila Lobos.
A vinda de Vila Lobos a S. Paulo pra esta temporada sinfonica, levantou um certo número de problemas.
Estabeleçamos desde logo algumas verdades sobre o genial compositor como regente. Vila Lobos é um grande regente? Para uma porção de espiritos faceis que vivem dentro da rotunda felicidade ou da inveja, a resposta é simples. Um adorador de Vila Lobos diz logo: é um grande regente. Um “inimigo” responderá com a mesma certeza: é um pessimo  regente. Mas por infelicidade nossa o problema é bem mais complexo que êsse b-a-bá de sordidos despeitos e entusiasmos desculpaveis.
Esta claro que não podemos comparar Vila Lobos regente com um Furtwaengler, um Toscanini, um Nikish. Simplesmente porquê êsses são profissionais da regencia, fizeram dela uma carreira de virtuosidade, e nada têm mais que fazer na vida que conceber um Beethoven deles e em seguida arranjar todos os fás sustenidos.
Ora o que explica Vila Lobos regente, é justo essa circunstancia dele não ser virtuose profissional de orquestra. O que faz não são tolices, são invenções, dados característicos de personalidade. E sempre explicados e defendidos com uma paixão que é só mesmo dêsse homem extraordinario, inteiramente destituido da prática da vida, e que vive em familia com os vesuvios. Disso vem serem sempre interessantissimas as interpretações dele. Chegam mesmo a ser ás vezes notaveis, como a execução da Protofonia do Guaraní o ano passado, e o Pacific de ontem. E mesmo quando certas “invensões” dele possam ser discutiveis, como por exemplo, a substituição do Violino Pequeno por um Violinofone, no Concêrto de Bach, nem por ser discutivel, a substituição deixou de ser curiosa.
O que distingue Vila Lobos como regente é a sua mesma personalidade de compositor, já falei na crítica passada e sou obrigado a repetir, Violento, irregular, riquissimo, quase desnorteante mesmo na variedade dos seus acentos, ora selvagem, ora brasileiramente sentimental, ora infantil e delicadissimo, (As Cirandinhas como perfeição de infantilidade musical encontram rarissimos rivais na literatura universal). Está claro que um temperamento desses não pode dar um cinzelador. De todos os artistas que conheço Vila Lobos é o mais incapaz de fazer crochê.
As peças que interpreta, êle as concebe em blóco, numa totalidade que não deixa de ser insatisfatoria, eu sei, mais que é perfeitamente legítima.
Na concepção que Vila Lobos tem que interpretação sinfonica, o que o prejudica em S. Paulo é a propria constituição ainda atual das nossas orquestras. Na Europa a direção dele tem sido sempre eficiente porquê as orquestras de lá são mecanismos já tradicionalizados e maleaveis que podem seguir perfeitamente as intenções dele. E a prova é que, si ainda discutido por muitos como compositor (e isso apenas o honra e distingue em meios europeus ainda mais subservientes ao anúncio e ao pagamento que os nossos), não sei que se tenha registrado ataque à regencia dele.
Mas é que lá Vila Lobos é respeitado como merece e lida com professores de orquestra arregimentados. Aqui, infelizmente os professores de orquestra ainda não compreenderam o pouco caso que fazem deles, alguns dos que os manejam. Vivem sendo vítimas de pequenas decepções, de vaidadinhas ofendidas, e principalmente instrumentos duma porção de interesses que não são os deles. (...).
E não se diga que Vila Lobos não tem paciencia pra pormenorizar uma execução. Não foi isso que quis dizer afirmando que êle concebia as obras em bloco. Sabe sim, basta ver a maneira respeitosa com que pretendeu executar a Setima de Beethoven. (...).
Muito leitor ha-de estar sarapantado com estas discussões que parecem extemporaneas. Não são não. Esses leitores não sabem que inferno é o meio musical paulista. Não sabem que nos bastidores se trava uma luta de interesses e vaidades, de que, no caso presente, são protagonistas alguns músicos importados, muitos de nacionalidade duvidosa, cujo fito um dia foi fazer America. (...).
(...).
A Sociedade Sinfonica, em cujos átos não influo de especie alguma, fez muito bem em tomar o maestro Lamberto Baldi pra seu regente. Era o que S. Paulo possuía de milhor, infinitamente superior a qualquer outro daqui, e com valor legítimo em qualquer terra. Mas S. Paulo tem perfeitamente lugar para mais um regente. Tanto mais quando se trata de Vila Lobos, uma gloria nacional, incontestavelmente mais legítima que o sr. Presidente da República ou o conde Matarazzo...
Infelizmente não é mais possivel qualquer crítica ao concêrto de ontem. Não posso assim falar da peça de Cools, que é a obra-prima... dêse autor, nem da “Burlesca” de Copola que foi o milhor momento da noite como execução. Interessava ainda mais falar sobre o Curuçá de Camargo Guarnieri, um bocado prolixo não tem dúvida, mas com momentos deliciosos de invenção, e equilibrio polifonico excelente.
(29-VII-1930).

IV

(...).
A temporada Vila Lobos, que devido á complacencia honrosa de varias sociedades, o grande compositor está realizando em S. Paulo, é um dêsses momentos em que desejaria ser um livre espectador de vida, pra poder me divertir á vontade. Porquê é incontestavel: nunca o meio musical paulista sofreu um malestar mais divertido que o despertado nele pela temporada Vila Lobos. Mas não quero dizer já tudo o que sei e sinto sobre essa temporada. Só no fim dela estudarei com esta minha franqueza que tanto sarapanta este magno pomar de hipocisias que é o nosso meio musical, as consequencias, os defeitos, os erros e os valores desta já famigerada série de concertos.
O festival Florent Schmidt, realizado ontem sob os auspicios da Sociedade Sinfonica de S. Paulo, foi o momento em que culminou o malestar em que estamos.
O que foi o festival de ontem? Um fracasso. Por um mundo de razões. Florent Schmidt é uma das personalidades mais curiosas, mais nitidas, mais apaixonantes da musica viva. Mas, como tantas vezes se dá, a personalidade de Florent Schmidt é muito mais interessante que a música dele.
(...).
O programa também era defeituosissimo. Longo, destestavelmente longo. Mato o público. (...).
Mas a falsificação do programa não consistia apenas no tamanho. Consistia na escolha das peças centrais. (...).
Tudo isso é muito triste e vou tocar nas falsificações comicas. Houve pelo menos duas. Uma foi a do público, pelo menos parte do público, que se retirou depois do intervalo, deixando o teatro semivazio. Isso é duma inocencia deliciosa!
Porquê ser retiraram? Se retiraram muitos porquê Vila Lobos é considerado um musico “futurista”. Logo: música dirigida por êle é logicamente futurista e necessariamente incompreensivel. Mas que riso gosado havia de ter o cultissimo Florent Schimidt sabendo que em S. Paulo, muita gente... julgou (!) não entender essa delicia de sabedoria, tão á Rimsky pela sensibilidade, que é a Tragedia de Salomé! Aquilo não tem nada de futurista. Aquilo é facil de entender, como beber agua. Aquilo é bem feito, é gostoso e não fez adiantar um passo á evolução musical. E por sinal que esteve bem dirigida. Orquestra sonora, equilibrada, até com vivacidade de colorido, coisa que sob a direção de Vila Lobos ela tanto vai perdendo.
A ultima falsificação que desejo apontar é a dos que gosaram com o fracasso de ontem. São seres despreziveis, está claro, mas vale a pena a gente se apoiar sobre êsse chão pra se sentir mais elevado. (...). A temporada Vila Lobos que ela coadjuva em maxima parte, ainda é um ato admiravel de benemerencia, com que a Sociedade [Sinfonica de S. Paulo] não hesitou em ir de encontro a muitas concessões imbecis da vida musical paulistana, para demonstrar as intenções firmes com que vem alargando os horizontes musicais curtissimos desta nossa desvairada Paulicéa. Ora uma sociedade assim, está claro que terá muitos inimigos. (...). Não porquê êste fracasso “tenha sido um triunfo”, como se costuma dizer em futeból, quando a gente está de cabeça inchada. Não foi triunfo pra ninguem não. Mas foi uma manifestação de vitalidade, vitalidade capaz de julgar por si, de se apaixonar, de reagir. Esse é um benefício imenso num meio musical que tem vivido de venalidade, de carneirice, de professorado fazedor de America, de trusts editoriais capitalistas, de ignorancia, de improvisação e recitais de alunos. E esse benefício nos deram a Sociedade Sinfonica de S. Paulo por todos quantos a compõem, a temporada Vila Lobos.
(27-VIII-1930).

V

A Sociedade de Cultura Artistica ofereceu domingo passado aos socios, no Municipal, mais um concêrto sinfonico, sob a regencia de Vila Lobos.
O programa, tão interessante como todos os outros que o grande compositor nos vai proporcionando, tinha como principais momentos a revelação de várias obras ineditas de Homero Barreto e o reaparecimento de Antonieta Rudge como solista.
(...).
(2-IX-1930).

VI

AMAZONAS

A Sociedade Sinfonica de S. Paulo cuja vida, apesar de tudo, continúa duma intensidade magnifica, nos deu ontem o último concêrto que lhe competia nesta temporada Vila Lobos. O programa culminava em interesse pela apresentação do poema sinfonico Amazonas do proprio Vila Lobos. Hão-de me permitir pois que fale exclusivamente sobre essa obra importantissima que está entre as mais completas e principalmente entre as mais perfeitas do grande compositor. No geral as obras longas de Vila Lobos nunca chegam a me satisfazer integralmente. Está claro que diante de manifestações tão novas, tão inusitadas como por exemplo o Noneto, o Mono Precoce, muito provavelmente a insatisfação pelo total, apesar das belezas numerosas que encontro nessas obras, provirá de insuficiencias minhas, que não me permitem seguir inteiramente o pensamento e as intenções de Vila Lobos. D’aí, nessas obras, certas passagens me parecem inexplicaveis, certas quedas bruscas de movimento criador, certas faltas de logica no sentido musical, que não consigo digerir inteiramente. (...). Ha realmente dentro da personalidade musical de Vila Lobos uma permanente falta de autocritica, uma perigosa complacencia para consigo mesmo, que lhe permite aceitar com facil liberalidade tudo o que lhe dita a imaginação criadora. (...). Em geral nas peças grandes de Vila Lobos são raras as que não apresentam assim longueurs desnecessarias, desenvolvimentos que não adianta nada á arquitetura ou valor expressivo, momentos enfim que uma severidade crítica acordada não permitiria existissem. E por isso me é gratissimo saudar obras como os “Chôros nº 8”, ou nº 10 e êste Amazonas que chego a compreender e a admirar integralmente.
(...).
Um detalhe critico que não quero silenciar é que com o Amazonas, Vila Lobos se afirma nessa música-natureza em que dum certo tempo prá cá êle vinha se desenhando. (...).
Esses elementos, essas fôrças sonoras são profundamente “natureza”, e o pouco que retira da estetica musical amerindia, não basta para localiza-la como música indigena. É mais que isso. Ou menos, si quiserem. Não é brasileiro também: é natureza. Parecem vozes, sons, ruidos, baques, estralos, tatalares, simbolos saidos dos fenomenos meteorologicos, dos acidentes geologicos e dos sêres irracionais. É o despudor bulhento da terra-virgem que Vila Lobos representa, milhor nesta obra que em nenhuma outra. Representação de que o Noneto creio foi a primeira em data das tentativas, e de que já os Chôros nº 7 foram uma exposição excelente.
Música aprendida com os passarinhos e as féras, com os selvagens e os tufões, com as aguas e as religiões primarias. Música da natureza, junto da qual a 6ª Sinfonia ou o Siegfried (não como beleza, está claro, mas como significação cosmica) não passam de amostras bem educadinhas de natureza, pra expor nas vitrinas, natureza já comercializada, limpinha e vestida na civilização cristã.
Nada conheço em música, nem mesmo a barbara “Sagração da Primavera” de Stravinski (aliás de outra e genialmente realizada estetica) que seja tão, não digo “primario”, mas tão expressivo das leis verdes e terrosas da natureza sem trabalho, como a música ou pelo menos, certas músicas de Vila Lobos.
E paro exausto sem ter enumerado todas as belezas e particularidades que julgo ver e pude amar neste poema. Todo êle é duma logica musical estupenda e duma qualidade alta que não desfalece, todo tão habilissimo que atinge a virtuosidade de composição. Me sinto feliz por demais em saudar obra tão bonita pra estar agora lascando algumas indiretas pesadas aos que negam a Vila Lobos a ciencia de composição. Não vale a pena. Ele tem antes de mais nada a preciencia, que poucos podem ter... Fossem os compositores que possuimos agora outros tantos Vila Lobos e a música brasileira seria a maior do mundo, isso é que eu sei.
(25-IX-1930).

VII

Realizou-se o último concêrto da temporada que Vila Lobos organizou êste ano em S. Paulo. Chegou o momento de observar com calma os resultados do movimento interessantissimo que o grande musico levou a cabo com uma pertinacia inconcebivel. Sentindo pela frente dificuldades e oposições ás vezes ferozes, Vila Lobos, pra conseguir o que pretendia, não hesitou mesmo em sufocar os movimentos mais expontaneos de amor-proprio, agüentando desacatos penosos. Mas tenho que constatar: nem sempre a razão esteve com êle. O grande compositor, como em geral toso os artistas excessivamente artistas, é uma personalidade complexa por demais. Dentro dele as violencias, os erros, as grandezas, os defeitos, os valores, se realizam sem controle, sem nenhuma organização social, Vila Lobos, é um bicho do mato.
Não tem dúvida pois que um temperamento dêsses é dificil de manejar no terreno das relações práticas. Não só da parte dele os erros de procedimento se acumulam, como da parte dos outros toda reação que não seja ditada pela própria admiração ao compositor, é duma tolice vergonhosa. E uma impiedade, que ás vezes chegou êste ano a ser infamante pra quem agiu contra o músico. Só foram realmente nobres os que, sem porventura lhe ignorar os defeitos, souberam defender Vila Lobos, auxilial-o, condescender com êle na medida em que isso não importava em nenhuma desvalorização ou prejuizo social. Porquê só assim um artista do temperamento de Vila Lobos, bicho do mato, anjo maluco ou criança genialissima, como quiserem, póde realizar a obra que nos herdará e da qual o Brasil já está beneficiando enormemente.
A temporada que Vila Lobos realizou aqui foi realmente grandiosa nas suas proporções. Como resultado, quer socialmente, quer no dominio desinteressado da arte, foi um conjunto desnorteante de belezas, aguas-mornas, valores e prejuizos. Não é possivel enumerar todos. No geral as execuções foram insatisfatorias. Vila Lobos não é um bom regente. Pelo menos para as nossas orquestras que, além de desorganizadas, são compostas de professores muito irregulares, alguns chegam a ser otimos, outros chegam a ser absolutamente insuficientes. Pra reger orquestras assim é preciso ter, além duma grande tecnica de regente, a paciencia, a habilidade diplomatica. E isso então o autor dos Chôros jamais teve nem jamais terá. Haja vista o artigo feio que, homenageador de Julio Prestes, escreveu sobre a Música Revolucionaria... Revolucionaria falo, de João Alberto.
Faltam a Vila Lobos várias qualidades que se tornam imprescindiveis a um regente. A sua propria vida angustiosa e variada não lhe permite se dedicar ao estudo minucioso das partituras. Isso ás vezes o escreviza de tal forma á leitura das obras, durante a execução que êle não pode ter aquele dominio indispensavel do regente sobre os regidos. É psicologico: os musicos não têm confiança, não se deixam dominar por quem está sendo dominado por uma partitura. Perdida a confiança, pode-se bem compreender que já não é mais possivel execução perfeita.
Mas não é apenas nisso que a regencia de Vila Lobos se vê prejudicada. A redondeza de gesticulação, a audição-absoluta irregular, a insegurança interpretativa de movimento que êle tem, como Beethoven tambem tinha, são ainda circunstancias prejudiciais a um regente bom.
Mas si confesso com franqueza estas coisas, estou longe de afirmar que Vila Lobos esteja impossibilitado de reger.
Póde reger perfeitamente, e mesmo, pela originalidade excepcional do seu temperamento, póde nos dar ás vezes interpretações interantissimas. E nos deu várias. Porêm pra que possa reger com eficacia, um artista nessas circunstancias tem de contar, antes de mais nada, com a dedicação dos musicos de orquestra. E com esta Vila Lobos conta na Europa, porquê lá o respeitam e as aparições dele como regente são episodicas. Mas aqui, terra desabusada, ninguem respeita ninguem. E, fôrça é confessar, o conhecimento de que a regencia de Vila Lobos não era episodica, mas duraria por oito concertos, desculpa em grande parte a má-vontade dos musicos.
Mas si a má-vontade dêstes é, pois, mais ou menos explicavel, é indesculpavel o que muitos deles fizeram. Houve de tudo. Não teve quasi desacato que possa fazer a um regente, que muitos musicos da orquestra não tivessem praticado.
Recusaram-se a tocar músicas determinadas pelo regente. Grande parte da culpa aqui cabia tambem ao regente, querendo impor as professores a execução dum compositor paulista por eles todos, e parece que com razão repudiado. Mas tambem o resto da culpa é dos professores, que colocam seus odiosinhos pessoais como criterio de julgamento de obras-de-arte. O compositor podia ser odioso como personalidade, mas valiosa a música.
Não pararam aí, porêm, os desacatos que alguns musicos da orquestra fizeram Vila Lobos sofrer. Era incrivel nas execuções públicas, os olharezinhos que muitos dêsses professores se trocavam a cada erro ou vacilação; alguns chegaram a rir francamente! E isso ainda é pouco si se souber que o violino espala chegou a derrubar o arco quando estava em execução! Eu quero saber no mundo qual foi até agora o musico que se preze, que tenha derrubado o arco em execução pública. Si não me apontarem nenhum, eu afirmo que a um, não posso dizer artista, a uma pessoa dessas está esgotada a consideração. E isso ainda é pouco (!!!) si se souber que outra... pessoa da orquestra se gabou de durante uma peça qualquer, ter executado em surdina o Hino Nacional brasileiro, sem que o regente percebesse! Não é possivel a gente classificar uma coisa dessas. Esse pobre moço, que aliás é de pouquissimo ou nenhum valor, tão vaidoso é tambem, que imagina ter conquistado Tripoli? Se engana. Conquistou apenas a sua propria desmoralização.
(...).
Bastam êsses casos lamentaveis pra indicar o grupo com que Vila Lobos tinha que... lutar. Está claro que muitos musicos na orquestra não incorrem nestas censuras particulares, porêm mesmo assim houve de todos o que chamei de falta de dedicação.
Tivessem na regencia quem quer que fosse (e Vila Lobos não é um qualquer), infelizmente incorrem na censura da indisciplina.
Mas a culpa não era só deles não. Vila Lobos, nem que morres de fome, não devia se conservar na regencia. Não é feio ceder quando isso resulta em bem comum. Todos viamos entristecidos que a Sociedade Sinfonica de S. Paulo, iniciada gloriosamente, cujos primeiros concertos foram dos mais belos que já se conseguiu no Brasil, todos viamos entristecidos a degringolada em que ela ia. Fuga de socios, combate mesquinho de pseudo-compositores, abatimento na orquestra, impossibilidade dos jornais perseverarem numa critica pragmatica, injustiça de programas que só muito mal representavam a música brasileira, sem nomes como os de Henrique Osvaldo, de Lourenço Fernandez, de Luciano Gallet. Porquê infelizmente nem o proprio Vila Lobos se isenta da acusação de crítica partidaria. A Sociedade, que Vila Lobos recebeu em plena pujança, em unanimidade vitoriosa, êle a deixa nas portas da morte. Isso em grande parte por culpa da pertinacia nem sempre razoavel dele.
(2-XII-1930).

- 16 de novembro: MA escreve a MB mencionando Villa:

São Paulo, 16 de novembro de 1930.

Manu,

(...).//Queria muito conversar com você sobre o Villa que inda está aqui e cuja nem voz por telefone posso aturar mais, ôh sujeito cansativo! Se fosse só cansativo. Mas você não imagina o homem que ele virou depois que não sei se o traquejo das viagens e dificuldades duras o desnaturaram por completo. Por causa dele afinal é que a Sociedade Sinfônica levou com os burros n’água. Prejuízos que parece Dona Olívia pagou, dissensões lá dentro entre a dedicada secretária e a presidenta, fadiga nos demais irritados com o procedimento dos músicos de orquestra que aliás, afora o conceito de disciplina, tinham todas as razões pra desrespeitar o Villa. Que gênio esquisito! Pois o certo é que nem afinação fixa ele tem! E imagine o que é isso pra quem pretende dirigir orquestra. Enfim uma miséria. Fico é pensando que quando ele enxerga uma criança cai em êxtase quando tem dinheiro no bolso gasta com o companheiro que estiver junto, enfim fico pensando que das maiores misérias sai flor e está claro que falo estas coisas pra você e que continuo defendendo embora com mais reserva o grande músico brasileiro.
(...).

Mário[37]
- 20 de novembro: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 20 [de novembro de 1930].

Mário.

(...).//A propósito do Villa há um trecho de sua carta que achei engraçado, o que se refere à falta de afinação do Villa. Você vai ver porquê. Lembra-se de um meu amigo velhinho, o “seu” Vasconcellos? Tenho uma vaga lembrança de que o apresentei uma vez a você. Vaga lembrança nada! Certeza, foi com ele que fomos à casa do Mota (o da boa vitrola e uma porção de filhas). Foi com o bom Vasconcellos que aprendi a tocar violão. Pois Vasconcellos conheceu o Villa quando nele nem se sonhava que um dia pudesse dar nada. Naquele tempo o Villa era tocador de violão e foi tocar em uma casa onde também esteve o Vasconcellos. Diz o Vasconcellos que durante todo o tempo o Villa tocou com o mi-bordão desafinado clamorosamente. Por causa desse bordão desafinado o Vasconcellos nunca quis tomar a sério a genialidade do Villa. Toda vez que eu catequizava o Vasconcellos eu sentia que no labirinto do Vasconcellos estava teimosamente assentada no débito do Villa o quarto de coma que faltava ou sobrava a aquele mi do violão do Villa. Eu sempre pensei que fosse talvez defeito do ouvido do Vasconcellos, mas agora que você está falando nisso já estou mais disposto a acreditar que o Vasconcellos tinha razão. E a tirar também como consequência que o que faz o músico não é só o ouvido, como dizem,, pois se pode ser um grande músico e ter mau ouvido.
(...).
Ciao. Abraços do

M.[38]
Adendo Cultural: A Casa Modernista, de Gregori Warchavchik, à Rua Itápolis 119, no bairro Pacaembu, em São Paulo, é aberta à visitação pública, em março, com a “Exposição de uma Casa Modernista”. Tarsila do Amaral é indicada por Júlio Prestes como conservadora da Pinacoteca do Estado de São Paulo, permanecendo até outubro, perdendo o emprego após a queda do governo de Prestes. Lúcio Costa (1902-98) assume a direção da Escola Nacional de Belas Artes. Drummond de Andrade (1902-87) publica seu primeiro livro Alguma Poesia. Brecheret realiza Mostra Individual em São Paulo. Vicente do Rego Monteiro participa na Galerie Zak, em Paris, da Première Exposition du Groupe Latino-Américain de Paris. Manuel Bandeira publica: Libertinagem. O Poeta Guilherme de Almeida é eleito para a Academia Brasileira de Letras. Ano da fundação da Associação Brasileira de Música, por Luciano Gallet (1893-1931).
Adendo Brasil: Em 1º de maio ocorrem eleições para presidente e vice-presidente da República. O vice-presidente, João Pessoa, na chapa formada pelos opositores dos paulistas que tinha Getúlio Vargas como candidato principal, foi assassinado na Paraíba no dia 26 de julho, agravando a crise política. O movimento de insurreição que saiu do Rio Grande do Sul fez com que o ainda presidente Washington Luís fosse deposto pelas forças armadas no dia 24 de outubro, colocando uma Junta Governativa Provisória formada por Tasso Fragoso, Mena Barreto e Isaías de Noronha no poder. Assim, em outubro deflagra-se a Revolução, que encerra a República Velha. Júlio Prestes (1882-1946) é eleito Presidente do Brasil. A 15 de novembro instala-se o Governo Provisório, presidido por Getúlio Vargas que assume o poder através de Golpe permanecendo até 1945. Em novembro, 14 e 21, foram criados os Ministérios da Educação e do Trabalho.

1931 – Inicia em janeiro, extensa turnê artística pelo interior de S. Paulo (mais de 50 cidades), juntamente com outros artistas: os pianistas Souza Lima (1898-1982), Guiomar Novaes (1894-1979), Antonieta Rudge (1885-1974) e Lucília Villa-Lobos, e ainda o violonista belga Murice Raskin e a cantora Nair Duarte Nunes. A primeira cidade que recebeu a chamada “Excursão Artística” foi Campinas - SP, em 20 de janeiro. 9 de maio: Villa promove um ensaio geral com mil vozes, no Teatro Municipal de S. Paulo. 31 de maio: na cidade de S. Paulo, organiza a primeira concentração orfeônica, sob o nome de Exortação Cívica, que teve a participação de mais de 12 mil vozes. 21 de outubro: realiza outro concerto em S. Paulo, regendo uma orquestra com 500 executantes. Compõe as Bachianas Brasileira n.º 4 e Quarteto de Cordas n.º 5. Yan de Almeida Prado se encontrava em Paris e recebeu carta de MA, datada de 7 de março, narrando o episódio do Villa que mantinha contato com a ala política de Getúlio Vargas. Segue trecho da referida carta:
“(...). //Mas quem você carecia estar aqui para gosar agora é o Vila. Está uma delicia da gente chorar por si de vergonha do mundo. Nem bem revolução venceu, Vila deitou entrevista contando que sempre fora revolucionário, que Julio Prestes e tutti quanti eram uns safadões, que sempre escrevera música revolucionária, que até tinha uns hinos de 1924 e em 18 centos e não sei quantos que já eram revolucionários e que a Polícia do Rio, tinha proibido. Mas que agora ia lançar os tais hinos. Virou assecla de João Alberto e famulo musical do Palacio. Mandou dona Olívia às urtigas e a delicia é que ela, já sabe, por elegância de espírito, continua gostando muito dele e achando que a gente precisa de proteger ele. Mas uma feita num teatro em que o Vila estava numa frisa em frente da dela, eu falando que os músicos eram todos uns canalhas de merda, ela perguntou: “Até aquele que está lá em frente?” Eu esgotado: Até aquele. Isso ela perdeu as estribeiras de gentildama, deu uma gargalhada que se ouviu no abaixopiques, de tão gosada. Percebi tudo. Sou perspicaz. Mas o mais engraçado é que o Vila mandou publicar imediatamente os tais hinos e foi se ver... não era ninguém: umas bobaginhas apressadas, que não valem nada musicalmente e com os textos mais inocentes deste mundo. Sube até que ele depois percebeu isto e isso num discurso na Escola Normal, porquê ele está preparando uma cantoria dos tais hinos por 25 mil pessoas! Ele disse que os hinos foram proibidos pela Policia porquê tinham nacionalismo por demais, podia ofender estrangeiro!!! Esta é autêntica e guardo pra seu goso. Outras ainda ele tem feito e a última parece que é ter brigado comigo pelo que me falaram. Bota a boca em mim, diz o diabo não sei si é verdade. Está claro que não brigo com ele, fico na maciota contemplando e gosando. No fundo com um imenso dó porquê parece mesmo (e foi confissão dele pra mim num dia de confissões e vinho) parece mesmo que ele não dá mais nada. Tinha chegado o momento de erudição ajudar e suprir a invenção, como está fazendo com Stravinsky e tantos mais, mas cadê erudição? E o coitado tem feito umas musiquinhas pra agradar, duma bestice palmar. Enfim... (...)”.[39]
- MA, no seu Musica, Doce Musica, mencionado na descrição de 1930, em A Música no Brasil, p. 19, assim escreve sobre Villa:
     Os nossos compositores atuais têm trabalhado por reforçar a tradição indigena em nossa música artística. De todos, quem mais se salientou nessa orientação foi Heitor Vila Lobos, cuja fama hoje é universal, incontestavelmente a mais forte de todas as manifestações musicais do homem brasileiro (“Serestas”, “Ciranda”, “Cirandinhas”, edições da Casa Arthur Napoleão). Aspero, verdadeiramente barbaro como temperamento, Vila Lobos assimilou perfeitamente as fôrças primarias da música indigena, e delas tirou uma riqueza excepcional de inspiração, quer sob o ponto-de-vista de invenção ritmico-melodia, quer como riqueza de efeitos de orquestração. São numerosos os temas originais indigenas de que o grande compositor tem se utilizado nas suas obras sinfonicas. E ainda são notaveis as harmonizações que fez para cantos conservados em fonogramas do Museu Nacional do Rio de Janeiro (“Nozani na Orekuá”, “Teirú”, “Uirô Mokocê ce-maká”, ed. Max Eschig, Paris).
Adendo Cultural: 26 de janeiro: morre no Rio de Janeiro o escritor Graça Aranha. 15 de março: MA, Paulo Prado e Alcântara Machado lançam a Revista Nova. Através do Decreto nº 4.965, de 11 de abril, em São Paulo, é dissolvido o Pensionato Artístico e criado o Conselho de Orientação Artística. 9 de junho: morre no Rio de Janeiro: Henrique Oswald, carioca nascido em 14 de abril de 1852, pianista, compositor, concertista e diplomata brasileiro. Em 15 de junho, Tarsila do Amaral, que estava em Moscou juntamente com o médico Osório César (1895-1979), realiza exposição individual e a conferência “A Arte no Brasil”, no Museu de Arte Moderna Ocidental. 28 de junho: morre no Rio de Janeiro o musicólogo e compositor: Luciano Gallet. O arquiteto Lúcio Costa assume a direção da Escola Nacional de Belas Artes. Em setembro: Anita Malfatti, MB, Portinari e outros, participam do júri da 38º Exposição Geral de Belas Artes, inaugurada em 1º de setembro, denominado Salão Revolucionário ou Salão de 31 e ainda Salão dos Tenentes, no Rio de Janeiro, com organização do arquiteto Lúcio Costa. Oswald de Andrade e Patrícia Galvão (Pagu), fundam o jornal O Homem do Povo. Em novembro: Lasar Segall realiza Exposição Individual na Galeria Vignon, em Paris.
Adendo Brasil: 18 de abril: através do Decreto nº 19.890, institui-se o ensino obrigatório de Canto Orfeônico nas escolas do Município do Rio de Janeiro. 12 de outubro: inauguração da estátua do Cristo Redentor, Rio de Janeiro.

1932 – A convite de Anísio Teixeira (1900-71), radica-se no Rio de Janeiro. É nomeado para o cargo de Diretor da Superintendência de Educação Musical e Artística das Escolas Públicas do RJ (SEMA), especialmente criada para ele. À frente da entidade, coloca em prática suas ideias educacionais: a instituição do ensino obrigatório de música e canto orfeônico nas escolas. Cria o Curso de Pedagogia de Música e Canto Orfeônico, de onde surgiu o Orfeão de Professores do Distrito Federal. Compõe o Guia Prático, com harmonizações de temas folclóricos. Escreve um Memorial ao Presidente da República Getúlio Vargas, em 12 de fevereiro, reproduzido no Jornal do Brasil,  mencionando o quadro horrível em que se encontrava o meio artístico brasileiro. Solicitava do Presidente estudos para encontrar um meio prático e rápido para suavizar a situação. Nos dois últimos parágrafos daquele memorial, assim escreveu Villa:
“Mostre Vossa Excelência senhor presidente, aos derrotistas mentirosos ou aos pessimistas que vivem não acreditando num milagre da proteção do governo às nossas artes, que Vossa Excelência é de fato o lutador consciente e realizador, tornando, incontinenti, uma realidade o Departamento Nacional de Proteção às Artes. //E com isto Vossa Excelência terá salvo nossas artes e nossos artistas, que bendirão toda a existência de Vossa Excelência. – Seu humilde patrício, //(a) H. Villa-Lobos”.
- Junto ao documento Villa anexou uma estatística de mais de 34 mil artistas desamparados, entre os Estados do Brasil. Maio: Villa cria o Orfeão de Professores, coral com alunos do Curso de Pedagogia da Música. Em 24 de outubro, data do aniversário da Revolução, conseguiu reunir no campo do Fluminense Futebol Clube, um coral formado por alunos de escolas e do Instituto de Educação e do Orfeão de Professores, num total de 18 mil vozes. Villa foi duramente criticado por vários intelectuais da época que condenavam essa sua atitude de estar apoiando Vargas. Oscar Guanabarino não perdeu a oportunidade de criticar. Guilherme Figueiredo foi outro que condenou Villa pelo apoio a Getúlio (Ver no ano de 1942 desta postagem, carta de MA a Guilherme Figueiredo sobre esse assunto). MA foi outro que se indispôs com Villa nessa ocasião e pelo mesmo motivo. Sabemos que boa parcela dos paulistas era contrária ao governo de Vargas. Em carta de 20 de janeiro de 1933, de MA para Prudente de Moraes, neto, podemos ter uma noção mais exata dessa postura de MA – (O original dessa carta pertence ao acervo Fichário Analítico: 1813, Villa-Lobos. Arquivo MA - IEB-USP, como segue:

“S. Paulo, 20-1-33

“Pru.

“Talvez seja melhor assim, não falarmos no assunto vivo que interferiu conosco, a revolução. Não que pudesse haver briga entre nós por causa dele: se da minha parte, que é a apaixonada, sinto a impossibilidade dessa briga, da sua que é a do intelectual, é justo que ela seja impossível também. Mas é assunto que, com você, me causaria um sofrido malestar, e eu via com verdadeira desgraça o momento em que carecesse falar nele com você. Sei que, embora estejamos intelectualmente pertíssimo um do outro, uma diferença irremovível de atitude nos separa irremediavelmente. Afinal chegou a tão esperada e bem temida carta de você. Você é carioca, Pru, fagueiro e da substância do ar. Não de água, que toma a forma de qualquer recipiente: de ar, que escapole à modalidade dos recipientes. Eu, que me gritei um dia ‘bailarino brasileiro’ sou bailarino mas é nada, não sei bailar. Peso mil quilos. Não de lealdade, que o ar também é leal, mas de pedra no caminho. Se eu escrevesse pra você, tinha que mover a pedra. Você compreendeu que a única solução era não mover a pedra e não moveu.
“Você me pergunta o que penso do Quarteto Brasileiro nº 5, do Vila, e já não me é penoso falar nesse cachorro. É que um quarteto bem Brasil, não tem dúvida, misturada fabulosa de valores e imundícies, de prazeres reais e promessas que não serão cumpridas.
“Pouco antes da revolução de 30, o Vila Lobos, que aliás, com certa discreção, já lambera o cu do Carlos de Campos, dedicava um concerto a Júlio Prestes. Nem bem a revolução venceu, esse indivíduo publicou uma entrevista de insulto aos vencidos, dizendo que fora revolucionário desde 1500 e até compusera avant-la-lètre um hino da revolução que a polícia carioca proibira. Escreveu algumas musiquices patrióticas, e diariamente, aqui, largava da inocência, para ir lustras as esporas com que João Alberto estragou irremediavelmente os tapetes civilizados dos Campos Elíseos.
“Bem: o Vila, de amoral inconsciente que sempre fora, e delicioso, virara canalha com sistema, e nojento. Mudança tão violenta assim, de contextura moral, havia necessariamente de afetar a criação afetou mesmo. A produção musical do Vila baixou de sopetão ao quase nada, como valor. Compôs uns hinos, uns coros, umas transcrições de fugas de Bach para celo e piano e umas pecinhas pianísticas, tudo simplesmente porco. De vez em longe uma linha, uma invenção de efeito, acusava no meio da porcaria, o gênio despaisado. Aos poucos essas bonitezas vieram se amiudando, prova, eu dizia comigo, que o Vila se acostumava aos poucos com a canalhice consciente. Se acostumou enfim; e desse indivíduo, a quem Deus, em desespero de causa neste deserto brasileiro, deu o gênio que tinha que dar pra algum brasil no momento,  o Quarteto Brasileiro já é fruto maduro.
“O que vale? Vale primeiramente pela técnica. Não daquela técnica mais verdadeira, beethoveniana, que deriva imediatamente da criação. O Vila ignorante, sem cultura, com um conhecimento deficientíssimo dos fatos musicais, sempre tivera essa técnica. As obras dele eram irregularíssimas. Quando grandes, apresentavam quase sempre formas desengonçadas, sobretudo compridezas irritantes, e canhestrices pueris. Mas o Vila inventava. Não sabendo orquestração, criava instrumentações admiráveis. Não sabendo o que é voz humana, deixa uma série impressionante de efeitos vocais. Fragílimo na harmonia, a ponto de não poder me definir uma feita o que era uma falsa relação, harmonizava com uma exatidão de caráter, com uma, sim, uma necessidade fatal. Criou obras desengoçadas como o Fausto, atrapalhadas como o Hamlet, irregulares como a Nona Sinfonia, fatigantes pelas compridezas como a Tetralogia, algumas geniais como estas. Me esqueci: completamente incapaz de discernir fatos musicais (principalmente porque a vaidade o tinha como criando do nada), ignorante até a miséria do que é criticamente o Brasil músico, a obra dele se tornou um repositório incomparavelmente rico dos fatos, das constâncias, das sutilezas, das originalidades musicais do Brasil. Não tem quase coisa do nosso populário musical, de que a gente não vá encontrar exemplo na obra do Vila. Coisas que ele absolutamente ignora, como até a espantosa de empregar uma escala assimilável ao hipolídio, dos gregos da Antiguidade (fato que é raríssimo, mas sucede, no Brasil), numa das Danças Africanas.
“Ora o que choca mais, no Quarteto nº 5, é que surgiu um Vila com outra técnica, a técnica que se aprende, a técnica acadêmica! A modernidade é apenas um disfarce ronaldiano, no Quarteto. Em compensação, e ronaldianamente também, a obra é surpreendentemente bem conformada, com os dois tempos propriamente rapsódicos, o 1º e o 4º, enfeixando a parte mais livre interior. O equilíbrio é sem exemplo nas outras obras grandes do Vila: nenhuma hesitação de desenvolvimentos, nenhuma comprideza indiscreta, escolha quase sempre acertada de elementos (pois que só a frase de conclusão do 3º tempo me parece contestável). Apenas se verificará que houve um capachismo servil na pressurosa e indiscreta escolha e abundância de temas da rapsódia infantil, no 1º e 4º tempos. Houve sim, e isso deriva da vontade de servir (por isso que chamei de capachismo servil...) que o Vila nunca teve e agora tem.
“Essa VONTADE DE SERVIR a toda gente é que faz toda a imoralidade repulsiva do Quarteto e que em Ronald, no Guilherme, sempre repugnou a você. O Vila se escondeu. Se disfarçou. Quer conciliar as coisas, e, pois que se tornou um sistematizado lambedor de cus, lambe os ditos do acadêmico criticante como do burguês ouvinte, do modernista embandeirado como do passadista louco pra se rever no novo. É um quarteto ‘gostoso’. E o Vila jamais não foi ‘gostoso’. Os instrumentos estão tratados com um carinho que jamais, estragador de instrumentos e vozes, o Vila teve. Estão bem nas suas tessituras propícias, bem nos seus efeitos brilhantes ou amáveis. Pra soarem bem, como ordena a Academia, e agrada a todos, artistas verdadeiros como o público boçal. Não é tudo. A polifonia, a harmonia, com toques levemente róseos de atualidade, é velharia da mais safada e saborosa, é do excelente quartetismo sensual dos maus românticos, dos românticos banais e acadêmicos, Tschaikowski, Saint-Saens e idênticas chatices de universal aplauso. Pleno domínio da gostosura disfarçada. Não tem aquela desfaçatez, afinal das contas viril, leal, dum Puccini, dum Leoncavallo, que escrevem coisas sensualmente fáceis, com franqueza, confessadamente. Não. É a chatice sub-reptícia, escondida, elegantizada, emoldurada, dum Massenet, dum Turina. E o pulhismo covarde.
“E qual a criação? Na realidade pequeníssima. Nos dois tempos externos, o Vila quase que apenas se limitou a transcrever para quarteto (com infinita ‘arte’, olés!) algumas obras anteriores, do tempo em que esteve em plena floração. Mas quais das obras dessa fase escolheu? As Cirandas? As peças de canto? Não, escolheu as Cirandinhas, menos rebarbativas, menos importantes historicamente, muito mais acessíveis, pois, por serem musiquetas pra criança tocar, ele fora necessariamente obrigado a fazer mais simples, mas agradáveis harmonicamente, pra que não repugnassem à criança. E que por essa suavidade, essa acessibilidade, nas Cirandinhas perfeitamente exata, fizeram já um sucesso público enorme. Que valor de criação posso dar a esses dois tempos, que não passam duma transcrição academicamente felicíssima, com algum efeitinho no meio, pra sossegar o possível rosnido de algum modernista?
“(...).
“Já nos dois tempos internos do Quarteto a criação é maior, e especialmente no 2º tempo, tão feliz, que soa tão bem, mostra bem que o Vila, mesmo nesta nova modalidade de caráter pode fazer coisas deliciosas, embora pouco admiráveis. Porque à primeira vista e por momentos, você se deixa levar pela sensualidade gostosíssima que há no Quarteto inteiro, especialmente, quanto a sonoridalde, no 2º tempo, e vai se esquecendo de tudo pra gozar. A verificação instintiva desse gozo é julgar, falando que o Quarteto é bom. Mas a consciência do julgamento, quando você não é público apenas ‘hearer’, mas ‘listener’, repõe você numa elevação maior que a da sensualidade gostosa. E então você repara espantado que no Quarteto não há quase nada! Nada de novo, porque nos tempos internos, especialmente no segundo, tudo o que Vila pôs já foi dito e com as mesmas palavras. Chega a ser extraordinário mesmo, como nestas linhas e temas bonitões dos tempos internos, não mais aquela primordialidade, aquela primariedade, aquela essência tão cheia de caráter, tão irredutível, da temática vilalbesca da grande fase (Choros, Cirandas, Amazonas). Não estou provocando uma simbologia fácil, dizendo que os temas do Vila agora não têm caráter, agora que ele perdeu o dito. Usei dum galicismo, lembrando que os franceses chamam comumente de ‘remplis de caractère’ aos temas, aos arabescos melódicos que a gente percebe essenciais, embora não consiga especificar bem porque. É mais fácil especificar defeitos que descobrir as causas da beleza, tanto esta deriva de Deus e aqueles da consciência nossa. Na temática propriamente vilabolesca deste Quarteto há um banal... um banal distinto – que infelizmente nem é o ‘vulgar’ mais respeitável, é caracteristicamente o ‘banal’. Tudo é revelho, efeitos como frases, como técnica polifônica e harmônica. E tudo já existiu na pior fase da música, o Romantismo. (...).
“Em resumo: obra falsa. Academismo esplêndido, técnica admirável, forma excelente, nenhuma invenção, disfarce de passadismo, sensualidade epidérmica, e a tal da banalidade sutil – dom de russos e franceses. Será uma obra-prima. Mas é uma obra-prima falsa. Que musicalmente me repugna”.[40]
Nota:
1 – Ver nesta postagem o “Adendo” de 1942, onde está postada outra carta de MA, esta a Guilherme Figueiredo, sobre desavenças com Villa.
- 2 de junho, quinta feira: as professoras do recém-instalado Curso de Pedagogia da Música e Canto Orfeônico do Rio de Janeiro, cansadas de receber maus-tratos do compositor (Villa), redigiram uma carta anônima ao carrasco. No início dos anos 1930, depois de uma década na Europa, ele esbanjava poder e surtos de estrelismo, mas isso não conteve as ofendidas.
'Se continuas a ameaçar-nos com os poderes absolutos de que te prezas faremos uma representação ao Diretor Geral', ameaçam as missivistas. 'Não vês que tudo é contraproducente quando o chefe não sabe ter atitudes? Não percebes que as colegas se podem infiltrar desses teus modos estúpidos e passar a fazer o mesmo com as criancinhas?' Encerram o ataque com a indicação: 'As professoras revoltadas pelo teu trato'.
- A folha, datilografada e sem assinatura, encontra-se na Biblioteca Nacional, no Rio (consta do espólio do maestro Sílvio Salema, assistente de Villa), e só agora vem à luz, com outros papéis - recortes, partituras, cartas e fotografias - arquivados ali e no Museu Villa-Lobos. (Fonte: Luís Antônio Giron).
Adendo Cultural: 1º de fevereiro: criado o Serviço Técnico e Administrativo de Música e Canto Orfeônico, através do Decreto Municipal nº 3.763, subordinado à Diretoria Geral de Instrução do Distrito Federal. Tarsila do Amaral, em março, regressa a São Paulo. É presa por dois meses no Presídio do Paraíso (São Paulo), por sua viagem à União Soviética no ano anterior. Di Cavalcanti também é preso durante a Revolução Paulista, permanecendo preso por três meses. Fora acusado de apoiar Getúlio Vargas. Portinari faz mostra individual no Palace Hotel, Rio de Janeiro. Lasar Segall, depois de viagem, retorna ao Brasil, São Paulo, onde fixa residência, à Rua Afonso Celso. 23 de novembro: Em São Paulo, na residência do arquiteto Gregori Warchavchik, Anita Malfatti participa da fundação da Sociedade Pró-Arte Moderna (SPAM). Além de Anita outros modernistas estiveram presentes na reunião de formação da SPAM, tais como: Mário de Andrade, Victor Brecheret, Tarsila do Amaral, John Graz e Lasar Segall. Dentre os objetivos da SPAM eram: realizar reuniões, conferências e exposições, todos para promoverem as Artes. A primeira exposição acontecerá em abril de 1933. 24 de novembro: inaugurado o Clube dos Artistas Modernos (CAM), à Rua Pedro Lessa, nº 2, em São Paulo, sob a presidência de Flávio de Carvalho.
Adendo Brasil: 23 de maio: em manifestação na cidade de S. Paulo, morrem os estudantes Mário “Martins” de Almeida (1901-32), Euclydes Bueno “Miragaia” (1911-32), “Dráusio” Marcondes de Souza (1917-32), Antonio Américo “Camargo” Andrade (1901-32) e Orlando de Oliveira “Alvarenga” (1899-1932). As iniciais de seus nomes comporão a sigla “M.M.D.C.A”, estandarte do movimento constitucionalista. 9 de julho: Inicio da Revolução Constitucionalista. 23 de julho: suicídio de Santos Dumont.

1933 – Compõe uma coleção de modinhas que inclui o Lundu da Marquesa de Santos, Cantilena, Remeiros do São Francisco. 26 de novembro: no Dia da Música, em louvor de Santa Cecília, numa festa promovida pela Associação Orquestral do Rio de Janeiro, com a colaboração do Departamento de Educação da Prefeitura Municipal e sob os auspícios do chefe do governo e de sua Eminência, o cardeal d. Sebastião Leme, Villa participou com um concerto contando com 2 mil músicos civis e militares e mais de 10 mil vozes dos grupos orfeônicos. Cria “Consertos Educacionais e Concertos Sinfônicos Culturais”, chamados por ele de “Consertos da Juventude”. Ainda nesse ano é organizada a “Orquestra Villa-Lobos”. Em setembro, através do Decreto Municipal nº 4.387, o Orfeão de Professores, criado por Villa em 1932, passou a ser Superintendência, uma extensão do Departamento de Educação do Distrito Federal: Superintendência de Educação Musical e Artística (SEMA);
Adendo Cultural: Tarsila do Amaral realiza no CAM (Clube dos Artistas Modernos), palestra sobre “Arte Proletária na União Soviética”. Mário Pedrosa (1900-81) realiza conferência dobre “As Tendências Sociais da Arte e Kaethe Kollwitz”, conferência essa considerada um marco para a moderna crítica de arte brasileira. Mário de Andrade redige a apresentação da “Primeira Exposição de Arte Moderna da SPAM” – Sociedade Pró-Arte Moderna. No Palace Hotel no Rio de Janeiro, em outubro, Tarsila do Amaral realiza uma primeira retrospectiva. 28 de abril: falece em São Paulo, o jornalista Nestor Rangel Pestana. É aprovado o Decreto regulamentando o “Salão Paulista de Belas Artes”, através da Sociedade Paulista de Belas Artes (esta criada em 1921). Em Agosto: Lasar Segall realiza Exposição Individual na Galeria Pró-Arte, no Rio de Janeiro. Em novembro: no auge de sua curta existência, o CAM apresenta o primeiro espetáculo do Teatro de Experiência criado por Flávio de Carvalho – iniciativa inspirada pelo teatro surrealista de Antonin Artaud - era a peça Bailado do Deus Morto, um teatro-dança de grande radicalismo, anticlerical, contestadora da ordem burguesa e de seus valores. Seu elenco incluía atores e sambistas, em um formato altamente inovador, cheio de experimentalismos que misturava técnicas  retiradas do teatro expressionista, dança moderna, e teatro clássico grego. Após apenas três apresentações, o teatro é interditado pela polícia e o espetáculo censurado. O evento marca o fim das atividades do CAM, que sem outras formas de levantar fundos, se dispersa. 

1934 – Rege, no Rio de Janeiro, seu bailado Jurupari (Choros n.º 10), tendo Serge Lifar como protagonista. Villa executa dois concertos no Teatro João Caetano, somente de músicas brasileiras. Escreve artigo para O Jornal: “Novas Diretrizes da Educação Cívico-Artística Musical”, uma síntese das instruções e regulamentos, oficialmente aprovados, do programa do Curso Especializado de Música Instrumental para a formação do Músico de Banda. Villa inicia intensa divulgação do seu projeto que houvesse ensino de música nas escolas, através de cartas para várias instituições educacionais do país. Viaja, em julho, para Recife. Nessa ocasião não executou nenhum concerto – fez palestras e visitou instituições educacionais divulgando seu projeto;
Adendo Cultural: Em janeiro: Acontece o I Salão Paulista de Belas Artes, em São Paulo, na Rua 11 de Agosto. 9 de junho: morre em São Paulo, Da. Olívia Guedes Penteado, vítima de apendicite. Em dezembro, Portinari realiza sua primeira Exposição Individual na Galeria Itá, em São Paulo. 6 de abril: falece no Rio de Janeiro, Ismael Nery, sete meses antes de completar 34 anos. 21 de novembro: morre o escritor Coelho Neto.
Adendo Brasil: 13 de março: no Congresso Nacional, a primeira deputada brasileira ocupa a tribuna, a médica paulista Carlota Pereira de Queiroz (1892-1982). Gustavo Capanema (1900-85) assume o Ministério da Educação e Saúde. 16 de julho: promulgação da Terceira Constituição do Brasil. É instituída, no rádio, a “Hora do Brasil”. Ano de fundação da USP – Universidade de São Paulo, ocasião que foi implantada a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, com a vinda de professores franceses. A Escola Politécnica de São Paulo é incorporada à USP. Em 1934, durante a interventoria de Armando Sales (1887-1945), foi nomeado prefeito da capital de São Paulo, Fábio da Silva Prado (1887-1963).

1935 – Rege três concertos sinfônicos no Teatro Colón de Buenos Aires. No Rio de Janeiro, comemorando o 250.º aniversário de nascimento de Bach, rege em primeira audição a Missa em si menor do compositor alemão. Villa retorna ao projeto de revisão da partitura oficial do Hino Nacional. Foi muito criticado nessa ocasião por ter baixado um edital que proibia a execução do hino até que o trabalho da comissão de revisão, que ele havia formado, concluísse os trabalhos de correção. Esse projeto de corrigir a partitura do Hino Nacional não foi resolvida de imediato, pois permaneceu na pauta das discussões até 1942. Villa viaja à Argentina com a comitiva de Getúlio Vargas em viagem oficial. Nessa viagem Villa dirigiu a estreia do bailado Uirapuru. Aproveitou a viagem e proferiu conferências sobre música. 8 de dezembro: MB escreve a MA mencionando Villa:

Rio de Janeiro, 8 de dezembro de 1935.

Mário,

(...).//Parece que o Villa afundou mesmo. Os jornais elogiaram muito, mas o público “arrepunou”. Saiu do Municipal convencido que Bach é uma estopada. Já tive ocasião de ouvir o orfeão do Villa. Aí a coisa é melhor. Também o que canta são coisas simples quase sempre. Uma ou outra vez o Villa se mete numa fuga de Bach e afunda de novo. E essa mania de massa que ele tem: 500 executantes! 700 executantes! Positivamente a batutinha dele não dá p’ra essas babilônias.
(...).
Abraços do

M.[41]

Adendo Cultural: MA inicia a organização do Departamento Municipal de Cultura de São Paulo e cria a primeira Discoteca Pública. Foi nomeado, a 31 de maio, chefe da Divisão de Expansão Cultura e Diretor do Departamento Municipal de cultura de São Paulo. A equipe que trabalhou com MA: Sérgio Milliet, Diretor da Divisão de Documentação Histórica e Social, e Rubens Borba Alves de Moraes, que ficara com a Divisão de Bibliotecas. 15 de fevereiro: falece no Rio de Janeiro, acidente automobilístico, o escritor Ronald de Carvalho. O crítico de arte, Virgílio Maurício (1892-1937), cria o Grupo Almeida Júnior. Um primeiro Grupo com esta denominação fora criado em 1928 por Torquato Bassi (1880-1967) – e tinha como objetivos: realizar exposições temporárias anuais com obras dos membros da entidade, promover conferências artísticas e ainda perpetuar a memória de Almeida Júnior. Foram feitas no mínimo duas exposições em 1936 e outra no ano seguinte. Alguns dos membros fundadores são: Samuel Ribeiro (1882-1952) – presidente de honra –, Lucy Citti Ferreira (1911-2008), Anita Malfatti, Georgina de Albuquerque (1885-1962), José Wasth Rodrigues e outros. 14 de abril: falece no Rio de Janeiro o escritor Antônio de Alcântara Machado. Cândido Portinari, na exposição do Instituto Carnegie, Pittsburg (EUA), conquista Menção Honrosa com a obra Café.

Adendo Brasil: O levante comunista comandado por Luiz Carlos Prestes (1898-1990) é derrotado pelo governo. A Constituição Estadual de São Paulo altera o título de Presidente do Estado para Governador do Estado. Eleito para o governo de São Paulo, Armando de Salles Oliveira. Seu governo terminara em dezembro de 1926.

1936 – 20 de janeiro: Villa participa da grande celebração da Missa de São Sebastião, ocorrida na praia do Russel. A convite do Governo da Tchecoslováquia, participa do Congresso de Educação Musical Popular, em Praga, como delegado brasileiro. Nesse Congresso, através de uma longa conferência, Villa apresenta um panorama geral do Brasil: geográfico, demográfico, cultural e educacional. Para encerrar sua participação no Congresso, apresenta o “Coral de Crianças da Milicur Dum” de Praga, cantando em português: Alegria de Viver e, em tcheco, Hino ao Sul do Brasil. 28 de maio: de Berlim, envia carta a Lucília desfazendo o casamento[41.1]:
Berlim, 28-5-36
Lucília
Esta minha viagem de três meses à Europa foi mais especialmente para decidir de uma vez a minha vida íntima, do que propriamente desempenhá-la como delegado aos Congressos Internacionais de Educação Musical.
Tenho certeza que não será nenhuma surpresa esta notícia tão decisiva que segue abaixo.
Há muito tempo venho consultando a mim mesmo esta resolução.
As razões são poucas mas justas.
Não posso viver em companhia de nenhuma esposa pela qual eu me sinto inteiramente estranho, isolado, constrangido, enfim sem mais nenhuma afeição, a não ser uma certa gratidão de ter se conservado fiel durante muitos anos em minha companhia.
Proclamo a nossa absoluta liberdade.
Porém com a consciência tranquila que tudo fiz para que não lhe falte nada. Foi pelo meu único intermédio que conseguiu os ótimos cargos que ocupa e que, por isso mesmo, ganha mais do que eu e tem melhores garantias de vitaliciedade.
Desejaria que nunca tivesse rancor de mim nem de ninguém, para que com calma e resignação verificasse que nossa situação não poderia terminar senão desta forma.
Por conseguinte ao voltar não irei mais para a casa da rua Dídimo 10, que desde esta data considero-a unicamente sob a sua responsabilidade.
Naturalmente devo concorrer com todas as despesas necessárias provocadas por esta mudança de nossa vida.
Mandarei um portador de confiança buscar tudo aquilo que me pertence pessoalmente e vou morar sozinho com minha mãe. Desejando muitas felicidades pela sua nova vida.
Villa-Lobos
- Villa passa a morar com a jovem cantora Arminda Neves d’Almeida (1912-85), a “Mindinha”, na Rua Araújo Porto Alegre, n.º 56, apto 54. Compõe o Ciclo Brasileiro, para piano. Dirigiu a ópera Colombo nas comemorações do centenário de nascimento do músico Carlos Gomes;
Adendo Cultural: Em São Paulo acontece o IV Salão Paulista de Belas Artes. Victor Brecheret, em São Paulo, inicia a execução do Monumento às Bandeiras, cujo anteprojeto data de 1920 e que é inaugurado em 1953 na Praça Armando Salles de Oliveira. 4 de fevereiro: Oscar Lorenzo Fernández (1897-1948) funda o Conservatório Brasileiro de Música, que dirigirá até morrer. Segunda vinda de Felippo Godoy Tommaso Marinetti, ao Brasil. É recebido em São Paulo pelos primeiros modernistas. Em 4 de julho, através do Ato Municipal nº 1.146, é criado o Departamento de Cultura de São Paulo, projeto de Mário de Andrade. Luiz Martins, na época parceiro de Tarsila do Amaral, realiza na Associação dos Artistas Brasileiros, Rio de Janeiro, a conferência “A Pintura Moderna no Brasil”. Chega a São Paulo, o artista plástico italiano, Ernesto De Fiori (1884-1945).
Adendo Brasil: 12 de setembro: Entra no ar a Rádio Nacional do Rio de Janeiro.

1937 – Compõe as quatro Suítes do Descobrimento do Brasil e a Missa de São Sebastião. Torna-se membro honorário da Academia de Santa Cecília de Roma. A editora Vitale, edita o “Guia Prático” de autoria de Villa. (Em 1966, esse mesmo Guia Prático foi reeditado pelo Museu Villa-Lobos, consta de um volume de 86 páginas, contendo 138 versões de canções, harmonizadas em estilo autêntico, para canto e piano, piano solo, conjunto instrumental ou coro a duas e três vozes. As letras foram revistas e adaptadas por Afrânio Peixoto, que assina também o prefácio). A Secretaria Geral de Educação e Cultura – RJ, edita o “Programa de Ensino de Música”, elaborado por Villa. Na sequência, parte de um dos depoimentos de Villa, a respeito:
“Em 1932, a convite do Diretor-Geral do Departamento de Educação, fui investido nas funções de orientador de música e canto orfeônico no Distrito Federal, e tive, como primeiros cuidados, a especialização e aperfeiçoamento do magistério, e a propaganda, junto ao público, da importância e utilidade do ensino de música. Reunindo os professores, compreendendo-lhes a sensibilidade e avaliando as possibilidades e recursos de cada um, ofereci-lhes cursos de especialização com acentuada finalidade pedagógica, dos quais, logo depois, ia surgir o Orfeão de Professores, onde, como nos cursos, ingressavam pessoas estranhas, atendendo à complexidade artística das organizações. Procurando esclarecer o público, principalmente certos pais de alunos, sobre os objetivos dessa atividade educacional, moveu-me um duplo objetivo: retira-los do estado de incompreensão em que se encontravam, e desfazer, de vez, as prevenções que nutriam e se refletiam sobre os escolares, ocasionando lamentável resistência passiva aos esforços renovadores da administração. Num ou noutro aspecto, realizava-se uma ação de indiscutível alcance educativo. Nem por mais tempo se poderia retardar a verdadeira interpretação do papel da música na formação das gerações novas e da necessidade inadiável do levantamento de nível artístico do nosso povo. O Canto Orfeônico é o elemento propulsor da elevação do gosto e da cultura das artes, é um fator poderoso no despertar dos sentimentos humanos, não apenas os de ordem estética, mas ainda os de ordem moral, sobretudo os de natureza cívica.
Influi, junto aos educandos, no sentido de apontar-lhes, espontânea e voluntária, a noção de disciplina, não mais imposta sob a rigidez de uma autoridade externa, mas novamente aceita, entendida e desejada. Dá-lhes a compreensão da solidariedade entre os homens, da importância da cooperação, da anulação das vaidades individuais e dos propósitos exclusivistas, de vez que o resultado só se encontra no esforço coordenado de todos, sem o deslize de qualquer, numa demonstração vigorosa de coesão de ânimos e sentimentos. O êxito está na comunhão. O orfeão adotado nos países de maior cultura, socializa as crianças, estreita seus laços afetivos, cria a noção coletiva do trabalho. Só quando todas as vozes se integram num mesmo objetivo artístico, despidas de quaisquer predominâncias pessoais, é que se encontrará a verdadeira demonstração orfeônica. Nas escolas primárias e mesmo nas secundárias, o que se pretende, sob o ponto de vista estético, não é a formação integral de um músico, mas despertar nos educandos as aptidões naturais, desenvolvê-las, abrindo-lhes horizontes novos e apontando-lhes os institutos superiores de arte, onde é especializada a cultura. Oferecendo-lhes as primeiras noções de arte, proporcionando-lhes audições musicais, cultivando e cultuando os grandes artistas, como figuras de relevo da Humanidade, em todos os tempos. Esse ensino, embora elementar, há de contribuir, poderosamente, para a elevação moral e artística do povo. Assim, pois, as três finalidades distintas obedece a orientação traçada para as escolas do Distrito: a) disciplina; b) civismo; c) educação artística”.[42]
- MA, em estudo concluído em 26 de junho, divulgado no Aspectos da Música Brasileira, em Compositores da Língua Nacional, menciona Villa:
(...). Villa Lobos então é um tesouro de expressão psicológica de textos, dentro da mais acentuada música nacional. As suas incomparáveis Serestas, dignas de figurar junto das coleções tão expressivamente psicológicas, dum Schumann, dum Wolff, dum Duparc ou dum Mussorgski, as suas Serestas magistrais são cancioneiras, toadescas, modinheiras principalmente e ao mesmo tempo claramente expressivas do que seus textos dizem. Basta recordar o “Anjo da Guarda” sôbre a poesia de Manuel Bandeira, as “Saudades de minha vida” sôbre Dante Milano, a “Na paz do Outono” sôbre Ronald de Carvalho, a “Cantiga do Viúvo” sôbre Carlos Drummond de Andrade, a “Redondilha” ainda sôbre os apaixonados versos de Dante Milano. Mas na verdade careceria citar todas as Serestas!...
Não. Tanto estas como aquelas são tôdas admiràvelmente expressivas de seus textos, e o nacionalismo inteligente jamais não tirará expressividade a ninguém. Estou mesmo que si fizéssemos um balanço entre as canções das gerações de Villa Lobos pra cá e as das gerações anteriores, a canção moderna ganharia de longe pelo número e valor de obras milhores.
(...).[42.1]
Adendo Cultural: 13 de janeiro: Através da Lei nº 378, é criado o SPHAN – Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Lei que foi regulamentada através do Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro. Victor Brecheret regressa definitivamente ao Brasil, em São Paulo. 25 de maio: inaugurado no grill-room do Esplanada Hotel, o I Salão de Maio, criado por Quirino da Silva (1897-1981), com organização de Geraldo Ferraz (1905-81), Paulo Ribeiro de Magalhães, Flávio de Carvalho e Madeleine Roux. MA promove, pelo Departamento de Cultura de São Paulo, o Primeiro Congresso de Língua Nacional Cantada. Acontece em São Paulo a 1ª Mostra da Família Artística Paulista, constituída majoritariamente com obras do Grupo Santa Helena. Tem origem o Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo, como associação de classe, visando contribuir para a profissionalização da atividade artística. Anita Malfatti realiza Exposição individual no Palace Hotel, Rio de Janeiro. Anita também participa da 1ª Exposição da Família Artística Paulista, ao lado de Bonadei (1906-74), Volpi, dentre outros do Grupo Santa Helena, no Esplanada Hotel de São Paulo. Com música de Villa, Humberto Mauro lança seu filme “O Descobrimento do Brasil”. 4 de maio: morre no Rio de Janeiro, Noel Rosa, vítima de tuberculose.
Adendo Brasil: 5 de janeiro: José Joaquim Cardoso de Mello Neto (1883-1965), assume o governo de São Paulo até 10 de novembro, quando ocorre o golpe de Estado, onde caiu toda situação política dominante em São Paulo. Getúlio Vargas, autorizado pelo Congresso, outorgou nova Constituição – de caráter nitidamente fascista. Nomeou interventores para todos os Estados, extinguiu os partidos políticos e determinou a supressão dos direitos individuais. Instaurado o Estado Novo, que duraria até 1945, apoiado pela classe média e pela burguesia. O Congresso é dissolvido. Francisco Luís da Silva Campos (1891-1968), Ministro da Justiça, foi quem redigiu a nova Constituição, de inspiração fascista.

1938 – Compõe as Bachianas Brasileira n.º 3, n.º 5, n.º 6, e o Quarteto de Cordas n.º 6. Compôs a trilha sonora do filme Descobrimento do Brasil - feito por Humberto Mauro para o Instituto Nacional de Cinema Educativo. 23 de novembro: MA publica a crônica As Bachianas no “Estado”, transcrita em Musica, Doce Musica (livro já citado nesta Síntese), pp. 273 a 277, transcrição parcial a seguir (conservada a ortografia original):
A Sociedade Propagadora de Musicas Symphonicas e de Camara, que acaba de apresentar em audição integras as “Bachianas” de Villa Lobos, teve evidentemente muito maior preocupação de se baptisar bem explicativamente que o proprio Villa Lobos, evocando o nome de Bach para denominar esta sua composição. Que é das mais recentes, aliás. O titulo integral da peça é “Bachianas Brasileiras”, o que fez um jornal, noticiando a audição, corrigir o erro aparente para “Bahianas Brasileiras”, sem reparar que fazia uma lapalissada.
Não. Trata-se exactamente de Bach e de “Bachianas”, e já se está fazendo um pouco de exploração sobre o nome ambicioso que Villa Lobos deu à sua nova série de peças. Em todo caso, parece que a intenção do autor, não foi somente fazer uma homenagem ao grande Bach, nosso deus maximo de todos os musicaes. Pelo que me informou alguem, que ouviu do proprio compositor, Villa Lobos acha muitas analogias entre a invenção musical de Bach e a musica popular brasileira, e disso derivou o seu titulo enigmatico.
Será verdadeira essa parecença? Talvez haja que distinguir entre coincidencia e parecença. (...).
Ha um bocado de Bach na musica brasileira popular, mas o desnorteante é que ha um bocado de tudo. (...).
(...).
E justamente, a primeira das tres “Bachianas Brasileiras” é uma embolada. A obra divide-se em tres peças distinctas, seguindo o córte das sonas: um presto inicial (Embolada), um andante largo central (Modinha) e uma “Conversa” em andamento rapido para acabar. É concebida para uma orchestra exclusivamente de violoncellos, e tem sido sempre executada por oito destes instrumentos. A polúphonia é systematicamente a quatro partes, permittindo a duplicação das vozes nos oito violoncellos, o que não me parece, porém, sufficiente para dar ao conjunto um efficiencia orchestral. Permanece-se num tal ou qual sabor de madrigalismo, que sensivelmente não é o desejo do autor. Imagino estas “Bachianas” executadas, supponhamos, por cincoenta e quatro violoncellos, a peça adquirirá toda a sua efficiencia, e esta será formidavel.
Apesar de uma unica audição, tive a idéa de que se tratava de uma das mais importantes obras de Villa Lobos, e das mais caracteristicas da sua maneira mais original, mais delle. A “Embolada” inicial principalmente é de um caracter, e mesmo de uma virtuosidade de escriptura excellentes. Poucas vezes o grande compositor terá ido mais longe na maneira de tratar eruditamente os themas do nosso populario, destratando-lhes a virgindade analfhabeta, sem com essa transposição perder de vista a essencia nacional. Apesar das deformações eruditas, apesar mesmo da audacia virtuosistica que desenha toda a peça, sente-se em qualquer momento que estamos num Brasil nacional.
Sob este ponto de vista ha que comparar esta Embolada com a “Conversa” de que Villa Lobos fez o final de suas “Bachianas”. Construida com o processo imitativo, num fugato systematico, e apesar do caracter da sua thematica, esta “Conversa” divaga muito por vezes, perdendo muito como nacionalidade. Não será isto um mal quanto á musica, e a peça continua uma curiosa conversa de quatro pessoas, muito afflictas, mas o problema permanece sem solução. Desta vez foi o material que dominou o artista. (...).
E só me falta falar da peça central, a Modinha. Aqui Villa Lobos criou uma melodia de andamento largo, de extrardinaria belleza. Estamos sem duvida a muitas leguas da nossa modinha e por certo muito afastados tambem de Bach. Talvez um exame mais sossegado me faça mudar de opinião, mas esse distanciar-se dos modelos não terá maior importancia. É possivel que o nosso compositor tnha querido se aproximar daquelles largos vetecentistas de que Bach é prodigo e são um dos maiores titulos de gloria da escola de arcos italiana, mas a verdade é que o tomou totalmente a sua esplendida veia melódica pessoal, sempre rara, incapaz da menor facilidade. E Villa Lobos nos deu talvez o seu mais bello andante. Uma intensidade profunda e vigorosa, uma grandeza serenissima de que não se encontrará em nossa musica brasileira outro exemplar.
E assim são, a meu ver, estas “Bachianas Brasileiras”, que o publico de São Paulo ainda desconhece. Se o primeiro tempo me pareceu o mais integralmente bem conseguido, o segundo nada lhe deve em belleza. E o terceiro, talvez que numa execução mais perfeita, com maior claridade nos movimentos das partes, iguale em valor os outros dois. De qualquer forma é sempre interessantissimo, e as “Bachianas Brasileiras”, apesar de toda a ambição do titulo, são uma das obras mais importantes da phase actual de Villa Lobos.
Adendo Cultural: Acontece em São Paulo o II Salão de Maio, em 27 de junho, no Esplanada Hotel. Na ocasião, MA adquiriu a obra de Guignard: “A Família do Fuzileiro Naval”. MA é exonerado do Departamento Municipal de Cultura de São Paulo e muda-se para o Rio de Janeiro, assumindo o cargo de diretor do Instituto de Artes da Universidade do Distrito Federal. Leciona Filosofia e História da Arte. Acontece o IV Salão Paulista de Belas Artes, em São Paulo. Anita Malfatti realiza duas exposições individuais: uma no seu próprio ateliê, na Rua Ceará, 219, São Paulo. Lasar Segall representa oficialmente o Brasil no Congresso Internacional de Artistas Independentes realizado em Paris. 26 de setembro: nasce em S. Paulo, Júlio Medaglia, maestro e arranjador.

1939 – Compõe As Três Marias, para piano. Em outubro, numa entrevista sobre educação, foi relembrada aquela sua famosa frase que dizia: “O futebol fez desviar a inteligência humana da cabeça para os pés”. Villa tratava os aficionados do famoso esporte, os discutidores de times e clubes, de “futebóis” – dizia:
“São uns futebóis...”. E disse mais: “Francamente já gostei do futebol. Cheguei a fazer parte do grupo que fundou o América Futebol Clube. Eu mesmo já joguei futebol. Não me oponho ao futebol, nem a nenhum esporte praticado esportivamente. (...).//É pena que hoje em dia o futebol brasileiro tenha perdido seu caráter de esporte para transforma-se num negócio outro qualquer”.
- 22 de novembro: Cezar Ladeira, na Hora do Brasil, interpreta a Oração a Santa Cecília, Padroeira da Música, escrita por Villa especialmente para o Dia da Música. (A descrição é do Heitor Villa-Lobos – Tradição e Renovação na Música Brasileira, de Maria Celia Machado, Editora Francisco Alves & Editora UFRJ, Rio de Janeiro, 1987, pp.48-49):

Santa Cecília! Divina Protetora da Música!
Ouve, em regozijo à tua santa imagem, em satisfação à influência sacrossanta do teu poder milagroso, em humildade pela grandiosa e eterna obra de Deus, à veneração de uma raça, à evocação de um povo, as preces ardentes, cheias de Alma e Fé, dos artistas sonoros do Brasil!
Tu, que deste ao Brasil o privilégio do amor pela música; que fizeste dos pássaros, rios, cachoeiras, mares, ventos e da gente desta terra uma sinfonia incomparável, cujas melodias e harmonias têm influído na formação da inteligência e bondade brasileiras, auxiliando espiritualmente a disciplina coletiva da mocidade e dos homens para servir às funções úteis e indispensáveis da humanidade, para melhor compreensão do valor consciente ao folclore regional e sentir artisticamente a música nacional;
- Ilumina aos que desejam ajudar a arte do Brasil;
- Protege aos que acreditam no valor e utilidade da música;
- Ajuda aos que anseiam proteger os artistas;
- Inspira aos que cantam o hino da nossa Pátria, a uma execução perfeita, como prova de obediente disciplina cívica;
- Esclarece aos que confundem a manifestação popular nativa, boa mas inculta, com a expressão de arte cultivada;
- Entusiasma os verdadeiros artistas que vivem desanimados pela confusão que a opinião pública estabelece entre o valor autêntico e os falsos artistas;
- Alegra os que imaginam que a música será algum dia a Bandeira Sonora da Paz Universal;
- Encoraja os compositores que, desanimados na carreira da vida musical, vêm satisfazendo o declive do gosto popular;
- Mostra aos indiferentes que vivem em várias camadas sociais a felicidade de quem ama a música;
- Perdoa os que não acreditam na cura dos anormais e na educação dos princípios da disciplina cívico-social pela música;
- Faze com que a opinião pública saiba respeitar o valor das artes e dos bons artistas brasileiros;
- Guia a mocidade pela arte do som;
- Anima aos que consideram a música de interesse nacional por ser um dos fatores que educam o espírito, tal como a educação física fortalece e desenvolve o organismo.
Santa Cecília! Divina Protetora da Música!
Ouve, em regozijo à tua santa imagem, em satisfação à influência sacrossanta do teu poder milagroso, em humildade pela grandiosa e eterna obra de Deus, à veneração de uma raça, à evocação de um povo, as preces ardentes, cheias de Alma e Fé dos artistas sonoros do Brasil!
- Villa sempre lutou para que o sistema educacional no Brasil fosse aprimorado e valorizado, deflagrando um movimento de salvação nacional através da educação artística. Assim dizia:
“Somente a educação salvará o povo brasileiro. Nossa ação foi baseada no educador. Graças ao devotamento desses professores vamos conseguir a elevação do nível cultural do povo”. Andrade Muricy, crítico e musicólogo, escreve artigo para a edição de 19 de julho do Jornal do Comércio (RJ): “//O Brasil deve este imenso serviço a Villa-Lobos. //A campanha, pública ou secreta, feita à ação deste educador, visando diminuí-lo, só diminuiria, se eficaz, a educação nacional. Villa-Lobos tem sido um surpreendente propulsionador da consciência musical e artística brasileira, e, além disso, primacialmente, um coordenador da nossa sincera, porém incerta e dispersiva, consciência cívica. //Só os pósteros poderão aquilatar a valia, a importância, a dificuldade árdua do seu infatigável esforço. Uma resistência orgânica e mental excepcional, uma capacidade de trabalho que se diria sem limite, uma verdadeira incapacidade de desanimar, fizeram deste artista um dos mais fortes construtores do Brasil de amanhã. //Esse criador, cuja obra honra de modo brilhante e impressionante os foros culturais do Brasil no estrangeiro, dá a sua pátria o presente inapreciável de sua abnegada atividade educativa, tão mal compreendida por muitos, porém já estimada por numerosos outros que a julgaram sem espírito preconcebido e com conhecimento de causa.[43]
- Através do Decreto-Lei nº 1.063, de 20 de janeiro, a Universidade do Distrito Federal, na época com um corpo de professores de alto nível, entre eles: Villa, Lorenzo Fernandez, Andrade Muricy e Arnaldo Estrella – foi declarada inconstitucional e extinta pelo então Ministro de Educação e Saúde, Gustavo Capanema, a serviço da ideologia autoritária do Estado Novo;
Adendo Cultural: 18 de fevereiro: nasce em Recife – PE, o músico, pianista e compositor, Marlos Nobre. 25 de junho: nasce em S. Paulo, João Carlos Martins, pianista e maestro. Acontece em São Paulo o Salão Paulista de Belas Artes e o 2º Salão da Família Artística Paulista, no Automóvel Clube. Cândido Portinari trabalha nos murais do Ministério da Educação e participa do V Salão do Sindicato e realiza exposição individual. Mário de Andrade assume, no Rio de Janeiro, a chefia da Seção do Instituto Nacional do Livro. O III Salão de Maio tem sua última edição, devido desavenças entre Flávio de Carvalho e a comissão organizadora.
Adendo Brasil: É criado o DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda, órgão de censura aos meios de comunicação.

1940 – Concentração orfeônica no estádio do Vasco da Gama, reunindo aproximadamente 42 mil vozes de crianças estudantes. Nessa concentração aconteceu uma grande ovação ao presidente Vargas.  Compõe o balé Mandu-Çarará e os Prelúdios, para violão. 4 de fevereiro: no O Jornal do Comércio, há um relado do Dr. Sebastião Barroso sobre Villa:
“Eu acompanhei-o desde a sua meninice; viveu durante anos seguidos metido em orquestras como violoncelista, agarrado sempre aos tratados de harmonia, de contraponto, de orquestrações (sic) e nas suas ousadias instrumentais, rítmicas, melódicas e harmônicas, na há de contrário ao que os grandes mestres determinam de básico e essencial. (...)”.
- Na longa carta a Oneyda Alvarenga, datada de 14 de setembro de 1940, MA relata episódio sobre as “Cirandas” de Villa. Segue o trecho, conf. Andrade, Mário de; Alvarenga, Oneyda. Cartas. Livraria Duas Cidades, SP – 1983.  pp. 282/283:

(...). As “Cirandas” e em consequência as “Cirandinhas”, sem dúvida das coisas mais geniais do Vila, ele as deve a mim. Fui eu que observando certa renitência no Vila em aceitar o aproveitamento folclórico, observando a dificuldade de construção formal dele e outras coisas assim, escrevi uma carta de pura mentira pro Vila, me dizendo encantado com as obras de Allende, um chileno que eu fingia descobrir no momento, observava as peças em forma A-B, uma aproveitando um tema popular, outra de criação livre, quando muito se servindo de constâncias folclóricas, coisas assim, e está claro fingindo uma admiração danada pelo homem, que ia escrever sobre ele, coisas que, eu sabia, deixavam o Vila sangrando em sua imensa vaidade. Mas a esperteza maior foi, em seguida, fingindo amizade subalterna, pedir a ele que me escrevesse umas peças de meia-força pros meus alunos de piano. Como sempre: nenhuma resposta, o Vila só escreve carta precisando da gente. Mas poucos meses depois vim no Rio, não me lembro mais onde, era uma festa, havia muita gente, creio que intervalo de concerto, me encontro com o Vila numa roda. E ele imediatamente: “Olhe, vá lá em casa! tenho umas coisa pra você. Bem! não é nada daquilo que você me pediu!. E sorriu com arzinho superior meio depreciativo. Eu fui e eram as “Cirandas”. E era exatamente o que eu pedira, e que tivera a intenção de provocar no Vila, embora estivesse longe de imaginar “Cirandas”. (...).
Adendo Cultural: Di Cavalcanti retorna de Paris, onde esteve exilado desde 1936 e passa a residir em São Paulo. Suas obras despachadas, cerca de 40 pinturas e desenhos, desaparecem. Em março: Lasar Segall realiza Exposição Individual na Galeria Neumann-Williard, de Nova Iorque. Em São Paulo é fundado o Clube de Cinema São Paulo e a Empresa Cinematográfica Atlântica. MB é eleito membro da Academia Brasileira de Letras. Realiza-se no Rio de Janeiro, a 3ª Exposição da Família Artística Paulista, com apresentação de Sérgio Milliet. Em dezembro, 17, acontece o 7º Salão Paulista de Belas Artes em São Paulo.

1941 – Nova demonstração de canto orfeônico no estádio do Vasco da Gama. Sob a regência de Villa e Sílvio Caldas, canta o Gondoleiro do Amor, de Castro Alves, acompanhado por 30 mil vozes. Conclui a versão orquestral da Bachianas Brasileiras n.º4. Observação de MA, nesse ano:
“Pocos anos depois de finda guerra (de 1914), e não sem ter antes vivido a experiência bruta da Semana de Arte Moderna, de S. Paulo, Villa-Lobos abandonava consciente e sistematicamente o seu internacionalismo afrancesado, para se tornar o iniciador e figura máxima da Fase nacionalista em que estamos”. [44]
Adendo Cultural: Anita Malfatti é eleita presidente do Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo. Mário de Andrade retorna do Rio e inicia seus trabalhos na seção paulista do SPHAN – Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Adendo Brasil: 28 de Agosto: entra no ar, pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro, o jornal “Repórter Esso”, na voz de Romeu Fernandez (?-?), anunciando o ataque de aviões da Alemanha à Normandia, durante a Segunda Grande Guerra.

1942 – Dirige o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, Rio de Janeiro. Esse Conservatório foi oficializado pelo Decreto nº 4.993, de 26 de novembro, assinado por Getúlio Vargas. Villa dirigiu essa entidade até 1957.  Cria a sua própria orquestra sinfônica. Compõe a Bachianas n.º 7, o Poema de Itabira, sobre texto de Drummond de Andrade, e o Quarteto de Cordas n.º 7. Em 8 de junho: MA escreve a Guilherme Figueiredo e faz referências à pessoa de Villa:

S. Paulo, 8-VI.42

Guilherme meu velho

São precisamente 18 horas e vinte minutos. Acabo de ler a sua história da musica. (...).
Está claro que não entro no mérito das opiniões críticas de você, são de você e o livro é de você. Talvez apenas eu pedisse pra você raciocinar um bocado mais na esculhambação que você passa em Vila Lobos(*). Não sugiro que você tire nada do que escreveu, mas não me parece que você equilibrasse bem a sua admiração pelo músico com a sua repulsa justa pelo homem. Ora o homem é coisa particular e Vila Lobos o que é, é músico. E a meu ver, embora irregular nas obras de fôlego porque aí êle não pode suprir aos desenvolvimentos da inspiração com uma tecnica que êle não tem, êle é autor dos Choros nº 10 que você esqueceu de citar e é positivamente um esquecimento grave. Quanto a peças pequenas, piano, canto, o Vila apresenta uma bagagem onde não são raras as obras-primas – perfeitissimas. Acresce ainda que o Vila é uma celebridade de conhecimento internacional e não sei si será muito patriotico (no bom sentido socializador da palavra) essa inflação do homem, na sua página, em detrimento do compositor.
(...).
Decerto vou no Rio a semana que vem, lhe avisarei. O melhor dos abraços do
                        Mario
(*) Minha indignação contra Villa Lobos se devia à adesão ao “Estado Novo”, a cujo serviço colocara o seu nacionalismo musical.[45]
Adendo Cultural: Em março é fundada a “Sociedade Brasileira de Escritores”, sob a presidência de Sérgio Milliet e vice MA. Em Abril: MA realiza a famosa conferência “O Movimento Modernista”, no Salão de Conferências da Biblioteca do Ministério das Relações Exteriores (Itamarati), no Rio de janeiro. 19 de julho: falece em São Paulo, Pedro Alexandrino.
Adendo Brasil: Vargas vai declarar guerra à Alemanha.

1943 – É nomeado Doutor em Música Honoris Causa pela Universidade de Nova Iorque e também pela Universidade de Los Angeles;
Adendo Cultural: Anita Malfatti participa da Exposição de Arte Moderna, em Belo Horizonte (MG), no Edifício Mariana, em maio. Participa também da exposição Anti-Eixo, no Museu Histórico e Diplomático do Salão Itamaraty, no Rio de Janeiro, e na exposição Anti-Eixo, na Galeria Prestes Maia, em São Paulo. Mário de Andrade escreve extenso ensaio sobre o artista plástico Lasar Segall. 3 de outubro: falece em São Paulo, Paulo Prado. Sérgio Milliet assume a direção da Biblioteca Municipal de São Paulo e apresenta projeto de arquivo e documentação de arte sobre papel, dando início a um acervo de desenhos e gravuras originais que pudessem ser guardados em pastas, permitindo o fácil acesso a pesquisadores e historiadores de arte. Segall realiza exposição individual no Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), Rio de Janeiro. Segall publica o álbum de gravuras Mangue, com desenhos feitos em 1924, composto de 42 reproduções em zincografia, três xilogravuras originais e uma litografia, com textos de Jorge de Lima (1886-1953), MA e MB – onde focalizou a zona de meretrício do Rio de Janeiro.  
Adendo Brasil: Implantado, oficialmente, no Brasil, o Curso de Jornalismo, através do Decreto-Lei Nº 5480, de 13 de maio, pelo então presidente Vargas e pelo ministro da Educação, Gustavo Capanema.

1944 – Compõe a Bachianas n.º 8, o Quarteto de Cordas n.º 8 e a Sinfonia n.º 6 (Montanhas do Brasil). Faz sua primeira viagem aos Estados Unidos. Érico Veríssimo serviu de intérprete para Villa que não falava inglês – e consta que Veríssimo passou grandes apuros, pois Villa falava muita asneira e ele tinha que fazer a versão para o inglês inventando outras frases complemente diferentes, como por exemplo: pediram para Veríssimo dizer a Villa:
“O fato de ele não falar inglês não tem a menor importância. Nós o admiramos tanto que só de ficar aqui a olhar para ele sentimo-nos felizes”.
- Após a tradução, Villa responde:
“Diga que não sou papagaio e nem palhaço de circo”.
- E Veríssimo traduz:
“O maestro declara que se sente felicíssimo por estar aqui hoje”.
- Villa realiza concertos sinfônicos na Rádio Nacional, Rio de Janeiro. É eleito Membro Correspondente da Academia Nacional de Belas Artes, Argentina. Realiza excursão ao Chile e aos Estados Unidos. MA, em 19 de outubro, escreve crônica sobre Villa no jornal Folha da Manhã: O perigo de ser maior, in “Mundo Musical”. Aqui podemos verificar a preocupação do cronista em “justificar” suas ponderações a respeito do Villa na época que este se “juntara” ao governo Vargas. Na sequência, descrição parcial:
(...).
Aqui já não estou gostando muito de mim, porque no meu ideário vieram lembranças tristes, e a maldade me enrugou. Eu gostava era daquele Vila Lobos antes de 1930, que ainda não aprendera a viver. Que vivedor maravilhoso era ele então! Fazia uma malvadeza colérica, sem nem de longe saber que estava fazendo uma malvadeza colérica, saía bufando da casa que o hospedava, grosseiro, mal-educado, e logo estava em plena rua se espojando no chão, esquecido, puro, anjo, pasteurizado, brincando com uma criança que passeava... Pobre, numa dificuldade reles de dinheiro, ganhava uma bolada boa, tinha dívidas a pagar, mas convidava a gente pra um restaurante, onde acabava gastando não só o que ganhara, mas uma quantia que os outros precisavam completar. Fazia uma improvisação no violoncelo, completamente ruim e mal-executada, ou se arrepelava porque lhe tocavam errado a ‘Lenda do Caboclo’, exemplificando ao piano de maneira horripilante, pra logo estar ganhando horas empinando papagaio, e vir jogar na pauta os esboços duma Ciranda ou de qualquer outra obra-prima. Depois, tudo mudou e não bom falar... Mas preciso sempre que se afirme que muitos, que a maioria dos músicos verdadeiros do Brasil, repudiam, até envergonhados, quase todos os escritos ‘com palavras’ publicados por Vila Lobos desde então. Desde as suas entrevistas até os seus opúsculos de diretor dos serviços públicos. Mas nada impedirá, nada, que ele seja o criador de numerosas obras-primas musicais, de uma produção imensa que é quase toda do maior interesse de estudo e execução, um dos compositores mais fortes do mundo contemporâneo. Apenas, como poesia, Vila Lobos não é objeto de exportação nacional”.
- A partir desse parágrafo Mário discorre sobre algumas obras para piano e reafirma sua admiração pelas Cirandas. O crítico termina o artigo com fecho de ouro:
“Pois é: cheguei onde desde o princípio desta crônica eu pressentia que iria chegar. Com Vila Lobos não é questão do bom e do ruim, mas de homens bons e de homens ruins. Vila Lobos diz muita tolice e pratica outras tantas. Está certo verificar sempre que ele não é objeto totalitarista de exportação diplomática. Não é um pocket-book, isso não! Mas Vila Lobos é compositor. A música dele anda impressa. E decide que ele está entre os mais fortes compositores da atualidade. Quem, por essas Américas finas e grossas, tirar da pessoa dele conclusões de valor ou qualificação, do Brasil ou mesmo dele: que se enforque”.[46]
- Outra observação importante quando relacionamos MA e Villa é o livro inacabado de Mário, O Banquete – Livraria Duas Cidades, SP, prefaciado por Jorge Coli e Luiz Carlos da Silva Dantas – onde reuniram os artigos publicados no “Mundo Musical”, da Folha da Manhã, já mencionados. No O Banquete, muito provavelmente, Mário tenha “camuflado” Villa no personagem “Janjão”. Outro personagem desse livro, a milionária “Sarah Light”, provavelmente Mário “camuflou” a pessoa da Dª. Olivia Penteado. Não sabemos qual seria o fim projetado por MA, mas Janjão teria um fim triste, pois este seria “jogado na rua”, como podemos verificar no Capítulo X: As Despedidas – A luta moral do compositor. Noturno. Janjão jogado na rua;
Adendo Cultural: Realiza-se, em Belo Horizonte – MG, a primeira Exposição de Pintura Moderna em Minas, no governo do prefeito Juscelino Kubitschek (1902-76). Inaugura-se o Curso de Artes Visuais de Guignard. O Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro realiza exposição de pintura brasileira e norte-americana. Em novembro, em Londres, acontece exposição coletiva de pintores brasileiros. Anita Malfatti expõe no VIII Salão do Sindicato dos Artistas Plásticos. Participa também de outras exposições coletivas: de Artes Plásticas, no ABI, Rio de Janeiro; no Salão do Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo, na Galeria Prestes Maia; na de Pintura Moderna Brasileira & Norte-Americana, também na Galeria Prestes Maia. A Livraria Martins Editora inicia a publicação das Obras Completas de MA.
Adendo Brasil: A Força Expedicionária Brasileira embarca para a Itália, desembarcando dia 16 de julho, com 25 mil homens e o Brasil entra definitivamente na Guerra.

1945 – 14 de julho: Villa funda a Academia Brasileira de Música (ABM) e torna-se seu primeiro presidente. A ABM foi criada nos moldes da Academia Francesa. É uma instituição cultural sem fins lucrativos. Compõe-se de 40 acadêmicos. Compõe a Bachianas Brasileiras n.º 9, a Fantasia para violoncelo e orquestra, o Quarteto de Cordas n.º 9. Nos Estados Unidos, rege a Sinfônica de Boston em programa “só Villa-Lobos”;
Adendo Cultural: Janeiro: Sérgio Milliet inaugura a Secção de Arte na Biblioteca Municipal de São Paulo, o primeiro acervo público de arte moderna brasileira. 22 de janeiro, em São Paulo, acontece o Primeiro Congresso Brasileiro de Escritores. 25 de fevereiro, Mário de Andrade vem a falecer de ataque cardíaco, na sua casa, em São Paulo. 14 de março: morre no Rio de Janeiro, o compositor e regente Antônio Francisco Braga. 24 de abril: falece em São Paulo, o artista plástico italiano Ernesto De Fiori. O palacete de Da. Olívia Guedes Penteado, localizado entre a Avenida Duque de Caxias e Rua Conselheiro Nébias, São Paulo, foi demolido, destruindo uma das obras-primas de Lasar Segall, de 1925. Em novembro: Anita Malfatti realiza exposição individual em São Paulo, na Rua 7 de Abril, no Instituto dos Arquitetos, no Edifício Esther, com algumas obras nitidamente impressionistas.
Adendo Brasil: 21 de fevereiro: Conquista de Monte Castelo pela Força Expedicionária Brasileira (FEB). O Partido Comunista Brasileiro (PCB), única organização que, mesmo na clandestinidade, se identificava com a resistência à ditadura e com as ideias libertárias, catalisa grande parte desse processo. Artistas e intelectuais aglutinam-se em torno de suas propostas transformadoras e lança candidato próprio à presidência da República. O PCB, após 18 anos de ação clandestina, em novembro, consegue registro em termos definitivos. Fim da ditadura Vargas. Extinguiu-se o Estado Novo. Toma posse interinamente, José Linhares (1886-1957). Novas eleições, em 2 de dezembro, eleito presidente o general Eurico Gaspar Dutra (1883-1974).

1946 – Compõe o Quarteto de Cordas n.º 10. Falecimento da mãe, Noêmia. Nesse ano o diplomata Dr. Vasco Mariz, 25 anos, procura Villa com o interesse de escrever a biografia do Maestro. Fato que realmente aconteceu, assim como Mariz viria escrever outros livros sobre Villa. [Até hoje os livros de Vasco Mariz sobre Villa-Lobos são referências indispensáveis para se estudar a vida e a obra do Maestro. Sem desmerecimento aos outros autores, cravo novamente outro nome para os interessados em conhecer Villa-Lobos: Paulo Renato Guérios – e seu mais recente livro: Heitor Villa-Lobos: o caminho sinuoso da predestinação. Ed. do Autor, Curitiba – PR, 2009 – 2ª edição]. Villa recebe Prêmio de Música, que fora concedido pelo Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura. O músico Oscar Lorenzo Fernandez, neste ano, na “A contribuição harmônica de Villa-Lobos para a música brasileira” – In: Boletin Latino Americano de Música. a. 5, nº 6, abril de 1946 – p. 284, assim se refere a Villa:
“Só quem convive com esse grande artista, exteriormente tão desigual, é capaz de compreender a sua evolução lenta e segura, pois Villa-Lobos, desde os seus trabalhos de mocidade, em que se sente uma técnica deficiente e mão incerta, embora já se notem acentos da sua força criadora, começa uma ascensão em que a técnica vai melhorando dia a dia, vai enriquecendo-se até um período em que atinge grande complexidade, para alcançar, no momento atual, uma maior simplicidade de meios e, ao mesmo tempo, grande poder de síntese e de emoção, numa cristalização total de sua poderosíssima personalidade. É esse, geralmente, o quadro lógico da evolução dos grandes mestres: o de um Bach, o de um Beethoven, o de um Wagner e será, sem dúvida, surpresa para muitos saberem que Villa-Lobos, tido pela maioria por louco, não sei porque, é um artista perfeitamente normal, observador, estudioso e, sobretudo um grande trabalhador”.[47]
Adendo Cultural: Em fevereiro: na Biblioteca Municipal do Rio de Janeiro, acontece a “Exposição de Retratos de Mário de Andrade”. Acontece no Chile exposição de Arte Brasileira organizada por Berto Udler. Acontecem em São Paulo o Salão do Sindicato dos Artistas Plásticos e o Salão Paulista de Belas Artes, ambos na Galeria Prestes Maia; e Exposição Homenagem Póstuma a Mário de Andrade, na Galeria Itá. 7 de outubro: a Academia Brasileira de Música foi reconhecida de utilidade pública por Decreto Federal.
Adendo Brasil: 31 de janeiro: posse do presidente Eurico Gaspar Dutra. Inicia-se o período de democratização do país. 18 de setembro: promulgada a quinta Constituição do Brasil. O governo cria o SESI (Serviço social da Indústria) e o SESC (Serviço Social do Comércio). Através de Decreto Presidencial são fechados todos os cassinos no Brasil e a proibição de todo tipo de “jogo de azar”. É criada a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC).

1947 – Faz sua segunda viagem aos Estados Unidos. Ganha o prêmio do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura. Escreve com os libretistas Forest e Wright, a opereta Magdalena;
Adendo Cultural: Os artistas plásticos John Graz e Antônio Gomide expõem em conjunto, em galeria da Rua Barão de Itapetininga, São Paulo. 6 de julho: a Academia Brasileira de Música é instituída como Órgão Técnico Consultivo do Governo Federal, através de Decreto. Cândido Portinari, perseguido pelo governo Dutra, exila-se no Uruguai. 2 de julho: tem início o Museu de Arte de São Paulo (MASP), à Rua 7 de abril, 230, através do empresário e jornalista Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello (1892-1968) e o crítico de arte italiano Pietro Maria Bardi (1900-99). Também em julho, Cândido Portinari realiza sua primeira exposição individual em Buenos Aires (Argentina), no Salón Penser.
Adendo Brasil: 14 de março: Adhemar de Barros (1901-69), toma posse como governador de São Paulo. Seu governo terminará em janeiro de 1951. O Tribunal Superior Eleitoral cancela o registro do Partido Comunista Brasileiro (PCB).

1948 – Em março: Em Roma, rege a Sinfonieta nº 2, composta no ano anterior. A sua ópera Malazarte é estreada nos Estados Unidos. Tem sua saúde agravada e é operado de câncer na bexiga, nos Estados Unidos. Compõe a Canção de um poeta do Século XVIII e o Quarteto de Cordas n.º 11;
Adendo Cultural: Lasar Segall viaja aos Estados Unidos e, em março, realiza Exposição Individual na Galeria Artistas Americanos Associados (Associated American Artists Galleries), Nova York e, em maio, na União Pan-Americana, Washington. É realizada no Teatro Municipal de São Paulo, Exposição Coletiva de Artes Plásticas de Pintoras e Escultoras de São Paulo. Criação do Museu de Arte Moderna (MAM) no Rio de Janeiro. O Museu de Arte Moderna de São Paulo foi constituído oficialmente, por escritura pública, em 15 de julho. 4 de julho: morre o escritor Monteiro Lobato. 27 de agosto: morre no RJ o músico carioca (professor, compositor e regente): Lorenzo Fernandez. 20 de setembro: morre em SP, Ernâni Braga, músico, compositor e intérprete de Villa.

1949 – Reinicia as turnês artísticas pela Europa e Estados Unidos. Em Israel, compõe um poema sinfônico em homenagem ao novo Estado;
Adendo Cultural: 8 de março: abertura da sede oficial do Museu de Arte Moderna de São Paulo, à Rua 7 de abril. O MASP da Av. Paulista será inaugurado em 7 de novembro de 1968, projetado pela arquiteta italiana Lina Bo (1914/92), esposa de Pietro Maria Bardi. Acontece a Primeira Retrospectiva de Anita Malfatti no MASP, São Paulo. Acontece em Salvador (Bahia), o 1º Salão Baiano de Belas Artes, no Hotel Bahia. Em 19 de junho, em São Paulo, falece o desenhista e arquiteto Antônio Garcia Moya. Tem início o acervo da Pinacoteca da Associação Paulista de Medicina que será inaugurada em 1951.

1950 – Compõe o poema sinfônico Erosão; o Assobio a Jato, para flauta e violoncelo, e o Quarteto de Cordas n.º 12;
Adendo Cultural: Tarsila do Amaral realiza retrospectiva no Museu de Arte Moderna de São Paulo, a convite de seu diretor, Sergio Milliet. Cândido Portinari participa da XXV Bienal de Veneza, com seis obras.  
Adendo Brasil: 18 de setembro: às 22 h, em São Paulo, foi ao ar o primeiro programa da televisão brasileira, TV Tupi. 3 de outubro: Getúlio Vargas é eleito presidente, obtendo 3.849.040 votos (49% dos votos válidos). Os outros dois concorrentes, Eduardo Gomes (1896-1981), 30%, e Cristiano Machado (1893-1953), 22%.

1951 – Viaja para o Texas, Escandinávia, Estocolmo, Copenhague, Paris. Compõe o Quarteto de Cordas n.º 13, o Concerto para violão e orquestra e a Sinfonia n.º 9. Na sua passagem pela capital da Paraíba, João Pessoa, Villa faz conferência se posicionando diante da realidade musical brasileira. Algumas das suas colocações na Conferência:
- “O Brasil tem uma forma geográfica de um coração. Todo brasileiro tem este coração. A música vai de uma alma a outra. Os pássaros conversam pela música. Eles têm coração. Tudo que se sente na vida se sente no coração. O coração é o metrônomo da vida, e há muita gente na humanidade que se esquece disso. (...). //Meus amigos, foi com esse pensamento que eu me tornei músico. Foi por isso que eu me tornei um escravo profundo e eterno da vida do Brasil, das coisas do Brasil. (...). Eu estou tão contente, cada vez mais, de ser brasileiro! (...). //Eu fui pela música. E, se por acaso o meu exemplo puder servir de alguma coisa a todos os meus patrícios, façam o mesmo. Sejam livres. Lembrem-se do coração. Lembrem-se que este é que é o metrônomo da realidade. Com ele terão a razão econômica de tudo, das coisas. Terão a medida exata da realidade da própria vida. Lembrem-se de que é a arte que vem do coração para um coração, de uma alma para outra alma, e a música é a primeira arte que conduz às outras artes. Eu não digo isto porque sou música, não. Mas ela tem um poder positivo, digamos um poder biológico. //Ela é uma terapêutica para a alma doente. A música é um consolo para o sofredor. A música é um embalo para o pequenino no colo de suas mães, seus pais. A música é o alento do desventurado. A música é a alegria daqueles que são alegres. A religião, qual das religiões que existem sobre a Terra e que não usou a música como elemento de atração aos seus crentes? Essa música que Santo Ambrósio utilizou para formar depois os cânticos litúrgicos definidos. É com essa música, senhores, que nós precisamos compreender que o Brasil vive, e que ninguém percebe. //Ninguém percebe que o país musical que existe sobre a Terra deixa passar, vagamente, indiferentemente, essa música tão pura, música da alma, música do coração. Que importa que haja duas espécies de música: a música da manifestação espontânea, a música popular, e a música da alma elevada, da alma intelectual, a música da arte. O folclore é o intermediário desses dois elementos, é a ciência da pesquisa, é o traço de união de que se utiliza o criador para, tirando do povo essa música, essa arte espontânea, burilar no seu coração, na sua alma, e trazer outra vez para o povo. (...).[48]
Adendo Cultural: Acontece em São Paulo o 1º Salão Paulista de Arte Moderna. 20 de outubro: inaugurada em S. Paulo a I Bienal de São Paulo, no edifício Trianon (atualmente o edifício do MASP), na Avenida Paulista, com obras de vários artistas modernistas.
Adendo Brasil: 18 de janeiro: Vargas toma posse.

1952 – Recebe do Governo do Estado de S. Paulo encomenda para obra comemorativa do IV Centenário da capital paulista – será a Sinfonia n.º 10, Sumé Pater Patrium. Viaja para Paris. Torna-se Membro Correspondente do Instituto da França. Volta aos Estados Unidos;
Adendo Cultural: Acontece em São Paulo a “Exposição Coletiva comemorativa da Semana de Arte Moderna de 1922”. O artista Plástico Alberto da Veiga Guignard organiza o 7º Salão de Belas Artes da Cidade de Belo Horizonte, na Prefeitura de Belo Horizonte – MG. Tarsila do Amaral recebe o 2º Prêmio Nacional de Pintura, no valor de Cr$ 50.000,00, quando da participação na I Bienal do Museu de Arte Moderna de São Paulo. 27 de setembro: morre na via Dutra o cantor Francisco Alves, chamado de “Chico Viola, Rei da Voz”. O velório foi realizado na Câmara Municipal, na Cinelândia (RJ).
Adendo Brasil: 1º de janeiro: Lucas Nogueira Garcez (1913-82) assume o governo do estado de São Paulo. Seu governo terminará em janeiro de 1955. Vargas cria o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), a fim de incentivar a indústria nacional.

1953 – Compõe o Quarteto de Cordas n.º 14, a Odisséia de Uma Raça, dedicada ao Estado de Israel; o Concerto n.º 2, para violoncelo e orquestra. Rege em Buenos Aires, a Orquestra Sinfônica Nacional. Na 4ª edição do Pequena História da Música, da Livraria Martins Editora, MA menciona Villa:
(...) (Vila-Lôbos, Schoenberg, Stravinski, Wiener, etc.), usam constantemente efeitos novos de voz na canção. Efeitos que, si enriquecem a música, são golpes duros no bel canto e ainda no conceito da canção. Vila-Lôbos, a êsse respeito, servindo-se de elementos do populário brasileiro, construiu uma série genialíssima de obras pra canto e piano (“Sangô”, “Estrêla é Lua-Nova”, “Canidê Ilune”, “Nozani-Ná” etc.).[48.1]
Ilustração 5 - Villa-Lobos é homenageado
na Câmara Municipal de Caracas – 1953
Adendo Cultural: Zina Aita volta ao Brasil, Teresópolis, por curto período e retorna para a Itália. 20 de março: morre o escritor Graciliano Ramos, consagrado como o maior romancista brasileiro depois de Machado de Assis. Em maio, concorrendo com a produção cinematográfica de 26 países, o filme brasileiro: “O Cangaceiro” é premiado no Festival de Cannes, na França, dirigido por Vitor de Lima Barreto. O Brasil todo canta: Mulher Rendeira.
Adendo Brasil: Vão para o ar a TV Rio (Canal 13) e a TV Record (Canal 7), de S. Paulo. Através da Lei n.° 2.004, Vargas cria a Petrobrás, em­presa estatal que detinha o monopólio de exploração e refino do petróleo no Brasil.

1954 – Visita Israel a convite do governo de Tel-Aviv. Compõe o Quarteto de Cordas n.º 15, a Sinfonia n.º 11 (encomendada pela Sinfônica de Boston), o Quarteto de Cardas n.º 16. Recebe, nos Estados Unidos, o título de Doctor Of Music. Escreve a sua Décima Sinfonia, Sumé pater patrium, escrita para o 4º Centenário da Cidade de S. Paulo. Nessa obra, Villa adaptou os versos de Anchieta no poema Beata Virgine, composto quando Anchieta se achava em Iperoig, como refém nas mãos do selvagens. Esta obra, também chamada de Sinfonia ameríndia, foi composta para orquestra, coro misto e solistas, sendo dividida em cinco tempos: Alegro (A terra e os seres), Lento (Gritos de guerra e a voz da terra), Allegretto Scherzando (Yurupichuna e a vida dos silvícolas), Lento (Aparição de Anchieta e Poco Allegro (S. Paulo de Piratininga). Embora composta para o 4º Centenário de S. Paulo, esta obra, dedicada a Mindinha, teve sua estreia em Paris, no Teatro dos Campos Elíseos, com a Orquestra e o Coro da Radiofusão Francesa, sob a regência do autor, a 4 de abril de 1947;[49]
Adendo Cultural: Por ocasião das comemorações do IV Centenário da cidade de São Paulo, foi construído o Palácio das Exposições, no Parque do Ibirapuera, onde acontece a Exposição de História do Brasil. 22 de outubro: morre o escritor Oswald de Andrade, na cidade de S. Paulo. Acontece em São Paulo, no Museu de Arte Moderna, a Exposição Coletiva de Arte Contemporânea.
Adendo Brasil: 24 de agosto: Vargas recebe um ultimato do ministro da guerra, exigindo seu afastamento. Isolado no Palácio do Catete, Getúlio Vargas redige seu testamento e suicida-se. Posse de João Café Filho (1899-1970), vice-presidente.

1955 – Está em Paris. A imprensa francesa faz referências elogiosas a concertos na Salle Gaveau. Compõe Yerma (ópera em três atos) e o balé Emperor Jones. Recebe a medalha “Richard Strauss, da Sociedade Alemã de Proteção aos Direitos Autorais dos Músicos”. Recebe também do Presidente da República, Café Filho, a Comenda “Ordem do Mérito”;


Ilustração 6- Villa-Lobos dirigindo
a Orquestra de Filadélfia, em 1955

Adendo Cultural: Anita Malfatti apresenta no MASP, a convite de Pietro Maria Bardi, a exposição “Tomei a liberdade de pintar a meu modo”. Acontece o 4º Salão Paulista de Arte Moderna, exposição coletiva, na Galeria Prestes Maia, em São Paulo. Em julho: acontece em São Paulo a III Bienal Internacional de São Paulo. No Rio de Janeiro, sob a coordenação do Itamaraty, em 27 de fevereiro, foi aberta no Teatro Municipal do Rio, uma das maiores exposição de artes até então. 17 de dezembro: falece em São Paulo, Victor Brecheret.
Adendo Brasil: Café Filho adoece e é afastado do cargo de presidente. Carlos Luz (1894-1961) assumiu o cargo interinamente do dia 8 de novembro a 11 de novembro. Foi deposto. Nereu Ramos (1888-1958) governou de 11 de novembro a 31 de janeiro de 1956. 3 de outubro: Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-76) é eleito Presidente, obtendo 36% dos votos válidos.

1956 – Em Paris, Villa, no Teatro dos Campos Elíseos, apresenta o seu Descobrimento do Brasil. Em Nova York, escreve a ópera Yerma, baseada na peça teatra de Garcia Lorca; escreve o balé Emperor Jones, também baseado em texto teatral de Eugene O’Neill. De volta ao Brasil, vê morrer na Justiça o processo de plágio que lhe movia o espólio de Catulo da Paixão Cearense por sua utilização, no Choros n.º 10, da letra para Schottisch Yara, de Anacleto de Medeiros;
Adendo Cultural: Acontece em São Paulo, no Museu de Arte Moderna, a exposição “50 anos de Paisagem Brasileira”. Di Cavalcanti participa como representante do Brasil na XXVIII Bienal de Veneza e recebe o I Prêmio da Mostra Internacional de Arte Sacra de Trieste, Itália.
Adendo Brasil: 31 de janeiro: posse de Juscelino Kubitschek, como presidente do Brasil.

1957 – O The New York Times traz editorial saudando os 70 anos do compositor. Seu aniversário foi comemorado o ano todo – o “Ano Villa-Lobos”, declarado pelo Ministro da Educação e Cultura, Clóvis Salgado: com palestras, debates e concertos. Em S. Paulo é promovida a “Semana Villa-Lobos” e o compositor recebe o título de Cidadão Paulistano. A entrega do título aconteceu na Câmara Municipal de S. Paulo, em 25 de setembro. Compõe o Quarteto de Cordas n.º 17. Trabalha na partitura do filme Green Mansions, que se transformará na Floresta do Amazonas;
Adendo Cultural: Zina Aita realiza a exposição individual “Ceramiche di Zina Aita”, na Galleria d’Arte Vanvitelli, em Nápoles – Itália. Participa também da exposição coletiva “Mostra do Presépio”, no Palácio Braschi, em Roma, e da exposição coletiva “Manifestação de Arte Nacional”, no Palácio Real, em Nápoles. 2 de Agosto: Lasar Segall, vítima de enfermidade cardíaca, falece em sua casa, na Rua Afonso Celso, em São Paulo. Foi sepultado no Cemitério Israelita da Vila Mariana. Em setembro: acontece na 4ª Bienal do MASP, em São Paulo, a Exposição Comemorativa Lasar Segall. Em São Paulo, a exposição de Anita Malfatti, de 1917, foi comemorada com uma mostra individual no “Clubinho” com desenhos e algumas experiências abstratas. Anita Malfatti participa da exposição coletiva: “Arte Moderna no Brasil”, em Buenos Aires (Argentina), no Museu de Arte Moderno; ainda na Argentina, em Rosário, no Museu Municipal de Bellas Artes Juan B. Castagnino; em Santiago do Chile, no Museu de Arte Contemporáneo; em Lima (Peru), no Museu de Arte de Lima. Rego Monteiro retorna ao Brasil. Os poetas paulistas Décio Pignatari (1927-2012), Haroldo de Campos (1929-2003) lançam o "Manifesto Concretista".
Adendo Brasil: Fevereiro: inicia-se a construção da nova capital, Brasília, sob a direção dos arquitetos Oscar Niemeyer (1907-2012) e Lúcio Costa, autor do plano piloto da cidade.

1958 – Rege a Orquestra Sinfônica Brasileira, no Rio de Janeiro, na primeira audição do Magnificat Alleluia. Compõe a Bendita Sabedoria, para coro misto, a Fantasia Concertante para orquestra de violoncelos;
Adendo Cultural: Janeiro: o escritor, desenhista e pintor modernista Flávio de Carvalho, escandaliza a elite moralista da cidade de S. Paulo, desfilando pelo centro da cidade com saiote e meias rendadas de bailarina, alegando estar criando uma “nova moda masculina” mais adequada ao clima do país. Março: acontece na Galeria de Artes das Folhas, São Paulo, exposição Retrospectivas de desenhos e gravuras de Lasar Segall. Como destaque na música: Surge a Bossa Nova, sob a liderança de João Gilberto (1931), Roberto Menescal (1937), Chico Feitosa (1935-2004), Tom Jobim (1927-94) e Nara Leão (1942-89). Estreia no Teatro de Arena a peça “Eles Não Usam Black-Time”, de Gianfrancesco Guarnieri (1934-2006). Falecimento do artista plástico Ignácio da Costa Ferreira (Ferrignac). 14 de fevereiro: falece, em São Paulo, um dos mecenas dos modernistas, o senador Freitas Valle.

1959 – 12 de julho: rege o seu último concerto em Nova York, no Empire Music, ao ar livre (Festival de Verão de Nova York). 7 de setembro: assiste, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, a uma execução do Magnificat Alleluia, sob a regência de Edoardo Guarnieri (1899-1968). Recebe a Medalha Carlos Gomes. A doença que o acometera em 1948 volta a agravar-se. É internado no Hospital dos Estrangeiros, voltando para casa depois de uma surpreendente recuperação;


Ilustração 7 - Villa em seu último aniversário, 
em maio de 1959.

– 17 de novembro, 16 horas: Heitor Villa-Lobos morre em seu apartamento da Rua Araújo Porto Alegre, no Rio de Janeiro. Foi velado no Salão Nobre do Ministério da Educação e Cultura, e sepultado no dia seguinte, no cemitério de São João Batista.

Adendo pós-falecimento de Villa-Lobos:

No adeus a Villa-Lobos, (...), centenas de pessoas acompanharam o seu velório e o cortejo pelas ruas do Centro e da Zona Sul. Durante toda a noite até a tarde do dia seguinte, o corpo do compositor – vestido de fraque, gravata branca e rubi na lapela – foi velado no auditório do Ministério da Educação e Cultura (MEC) por amigos, parentes e admiradores, entre eles o presidente Juscelino Kubitschek.
- Era uma das mais altas expressões da alma brasileira, um dos mais autênticos interpretes do nosso povo e da nossa terra. Sua obra engrandeceu e revelou o Brasil, tornou maior o nosso país. Dele se poderá dizer que continuará realmente vivendo através dos tempos, com a força do seu gênio – afirmou JK na época.
(...). Do MEC, o cortejo com o caixão levado por um carro do Corpo de Bombeiros seguiu até Teatro Municipal, na Cinelândia. Ali a orquestra do teatro, sob a regência do maestro Edmundo Blois, executou para o povo, a “Marcha fúnebre”, de Beethoven. Depois passou pelo Obelisco a caminho do Cemitério São João Batista, em Botafogo, onde foi sepultado “O índio de casa” (nome do documentário de Roberto Feith sobre o músico).[50]

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De longe e de perto, nós brasileiros estamos continuamente em grande luto, com a perda do nosso inesquecível Villa-Lobos: glória da nossa terra, glória de todas as Américas, glória de um mundo civilizado que, consternado, sente sempre a falta da sua gigantesca personalidade!
Seu espírito, porém, não morrerá nunca; seu nome e seu trabalho ficarão eternamente na história da civilização humana.
Minha alma saudosa chora pelo amigo que perdi e pelo Maestro que venerava. [Bidu Sayão (1902-99)].[51]

1960 – Criado o “Museu Villa-Lobos”, através do Decreto nº 48.379, de 22 de junho, com sede no “Palácio da Cultura”, Rio de Janeiro, dirigido por Mindinha até sua morte, em 1985;


Ilustração 8 - Villa-Lobos com Arminda,
sua segunda esposa, fundadora do Museu Villa-Lobos. (sd)

1961 – O prefeito de Nova York, Robert F. Wagner, proclama o dia 5 de março como o Dia Villa-Lobos;
1967 O Conservatório Nacional de Canto Orfeônico do Rio de Janeiro, criado e dirigido por Villa-Lobos, é transformado em “Instituto Villa-Lobos”, através do Decreto nº 61.400, de 1º de Outubro;
1987 Em 5 de março: Quando das comemorações do 1º Centenário de Nascimento de Villa-Lobos, O Conselho Universitário da Universidade Federal do Rio de Janeiro, por solicitação do Departamento de Instrumentos de Arco e de Cordas Dedilhadas da Escola de Música, decidiu, por unanimidade, outorgar-lhe o título de “Doutor Honoris Causa – post-mortem.

DEPOIMENTOS

Arminda Neves d’Almeida (Mindinha):
(...).
Villa-Lobos, o incompreendido de muitos que não privaram de sua intimidade, foi a figura humana mais extraordinária que conhecemos. Amigo leal, companheiro dedicado, músico intransigente mas reconhecido aos seus fiéis intérpretes, foram as facetas admiráveis de seu caráter.
Lutou vigorosamente contra a mais feroz das enfermidades; trabalhou até o seu último alento. Não limitou sua existência às precárias fronteiras da condição humana. A golpes de gênio, criando mesmo nos momentos de maior angústia e dor, Villa-Lobos construiu, sozinho, o próprio monumento de sua glória. Jamais correu atrás de louvores graciosos.
Os instantes de mais puro prazer de seus últimos anos de vida foram aqueles em que, nas suas tournées pelo mundo afora, pôde ouvir suas obras, recolhendo as multidões o frêmito afetuoso e entusiasta do aplauso. Recebia consagrações e honrarias com a simplicidade dos gênios e sentia-se feliz de ver sempre ao seu redor os amigos sinceros e verdadeiros.
Foi extremamente reconhecido àqueles que, de qualquer modo, procuraram ajuda-lo no início de sua carreira artística. Com ele aprendemos a querer bem e a ser gratos a Gilberto Amado, aos Penteado, aos Guinle, a Laurinda Santos Lobo, a Paulo Prado, a Rubinstein, ao Bouças e muitos outros.
Sem o calor de sua presença irradiante e amiga, conforta-nos, no entanto, haver concorrido com uma pequenina parcela de nossa dedicação, nosso profundo respeito e admiração e, sobretudo, nosso amor puro e sincero, par a sua tranquilidade de produzir e ser feliz.
Não fomos a sua Musa Inspiradora. Villa-Lobos possuía dentro dele mesmo a fonte inesgotável de inspiração.
Estamos convencidos, isso sim, de ter sido a sua companheira e colaboradora de todas as horas; que não temeu as convenções humanas e enfrentou, sem esmorecimentos, todas as barreiras de incompreensões, visando sempre a sua felicidade pessoal.
Com que emoção nos recordamos, vê-lo escrevendo como primeiras notas de uma nova criação musical, a carinhosa dedicatória “Á Mindinha”. Esse é o tesouro inestimável que nos foi legado e que guardaremos no fundo de nossa alma com infinita saudade.
Depoimentos. Presença de Villa-Lobos, 1º V. Museu Villa-Lobos. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1965, pp157/158.

Luís da Câmara Cascudo:
Um dos mais eminentes compositores de universal projeção contemporânea. Sua imaginação prodigiosa, a surpreendente originalidade das soluções técnicas, a beleza envolvente e sempre nova de sua melodia, a riqueza inesgotável dos recursos da expressão, o domínio soberano em qualquer dos gêneros, a graça, irradiante e natural simpatia de sua figura, fizeram-no personalidade de invulgar e rara presença na legitimidade do gênio indiscutível. Sua obra, vasta e soberba de solidez e força sugestiva, mantém o sabor musical acentuadamente brasileiro, mormente do folclore, fonte predileta da inspiração magistral, valorizando rondas infantis, bailados indígenas que viviam a mitologia ameraba, danças e cantos negros, modinhas e choros dos seresteiros românticos, numa elevação de ritmos da tradição e aproveitamento dos efeitos instrumentais populares. Não os estilizava, mas recriava, ampliando em sonoridade as simples células motoras que existem na dinâmica do instinto musical brasileiro. O interesse, devotamento, alegria do convívio humano para com todas as manifestações de cultura coletiva do Brasil, integram Villa-Lobos como uma das égides naturais na campanha de pesquisa e estudo do folclore nacional.
Cascudo, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. Global Editora, São Paulo, 12ª ed. 2012, pp. 719/720.

Edoardo Guarnieri:
Conheci Villa-Lobos, como compositor, muitos anos antes de eu vir para o Brasil. Suas obras eram muito mais conhecidas na Europa do que na sua pátria. Eu, que vivi na França e Itália, conheci o Brasil através da música desse grande compositor, isto durante a primeira grande guerra.
Guarnieri, Edoardo. In: Entrevista ao Diário da Noite – 1949. Disponível em:

Anna Stella Schic:
Como é difícil falar de Villa-Lobos!. (...). No fundo, tudo é importante quando se trata dessa imensa criatura, dessa força da natureza, desse ser, tão grande e tão simples. Villa-Lobos foi o mestre exigente e o amigo de todos os momentos: foi ingênuo como uma criança e “rusé” ao extremo na sua profunda intuição ao contato das pessoas. Que ninguém imaginasse que poderia conquista-lo com mesuras, elogios rasgados ou homenagens. Ele sorri por trás do enorme charuto e ficava flanando bem por cima de tudo, quando não arrasava, pura e simplesmente, qualquer atitude afetada.
(...).
Villa-Lobos, o imenso Villa-Lobos, o criador inesgotável, que em seus últimos dias ainda se preocupava com o penteado da afilhada, representa aos olhos do mundo o que o Brasil possui de autêntico e de pujante. Passou, assim, Villa-Lobos, a habitar o céu e a irradiar a beleza de sua arte sobre a terra.
Depoimentos. Presença de Villa-Lobos, 1º V. Museu Villa-Lobos. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1965, pp. 15 e 17.

Clovis Salgado:
Reverenciamos em Heitor Villa-Lobos o gênio musical mais poderoso dos músicos, em todos os tempos.
Sua vibrante sensibilidade foi beber inspiração na fonte prodigiosa da tradição popular e buscava força na assombrosa fertilidade da terra virgem. Por isso, suas criações têm o vigor, a solidez e o sabor das peças autêntica.
Em suas melodias canta a própria alma da nossa gente. Em suas harmonias vibram os clamores da terra, das florestas, das cachoeiras, dos mares e dos céus do Brasil.
Depoimentos. Presença de Villa-Lobos, 1º V. Museu Villa-Lobos. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1965, p. 55.

NOTAS:

[1] Azevedo, Sânzio de. A Padaria Espiritual e o Simbolismo no Ceará. Casa de José de Alencar, Fortaleza, CE, 2ª ed., 1996 – p. 59.
[1.1] Kiefer, Bruno. Villa-Lobos e o Modernismo na Música Brasileira. 2ª Ed. Editora Movimento (Porto Alegre) & INL: Fundação Nacional Pró-Memória (Brasília), 1986, p. 123.
[2] Nóbrega, Adhemar. Presença de Villa-Lobos. MEC/Museu Villa-Lobos, RJ, 4º vol., 1969, p. 17.
[2.1] Pinto, Maristela Barros. In: “Lucília Guimarães Villa-Lobos (1894-1966) – História de vida de uma mulher musicista e artista e seu trabalho silencioso junto ao mestre Villa-Lobos”. Pesquisa apresentada por Maristela Barros Pinto como mestranda pela Universidade Severino Sombra, Vassouras/RJ, no XIV Encontro Regional da ANPUH-RIO – Memória e Patrimônio, de 19 a 23 de julho de 2010. Pdf disponibilizado na Internet, p. 4. Acesso em 2012.
[3] Estrela, Arnaldo. Os Quartetos de Cordas de Villa-Lobos. MEC/Museu Villa-Lobos, RJ, 1970, p.10.
[4] Guimarães, Luiz. Villa-Lobos Visto da Plateia e na Intimidade. RJ, 1972, p. 224.
[5] Horta, Luiz Paulo. Villa-Lobos – Uma Introdução. Jorge Zahar Editor, RJ, 1ª ed., 1987, p. 42.
[6] Kiefer, Bruno. Villa-Lobos e o Modernismo na Música Brasileira. 2ª Ed. Editora Movimento (Porto Alegre) & INL: Fundação Nacional Pró-Memória (Brasília), 1986, pp. 59 a 61, 100.
[6.1] Wisnik, José Miguel. O Coro dos Contrários: a música em torno da semana de 22. Livraria Duas Cidades, SP, sd, pp. 71/72.
[6.2] Boaventura, Maria Eugênia (Org). 22 por 22: A Semana de Arte Moderna vista pelos seus contemporâneos. Edusp, São Paulo, 2000. pp. 77 a 79.
[6.3] Batista, Marta Rossetti; Lopez, Telê Porto Ancona; Lima, Yone Soares de. Brasil: 1º Tempo Modernista – 1917/29 – Documentação. Instituto de Estudos Brasileiro, São Paulo, 1972, pp. 304 a 306.
[6.4] Boaventura, Maria Eugênia (Org). 22 por 22: A Semana de Arte Moderna vista pelos seus contemporâneos. Edusp, São Paulo, 2000. pp. 453/454.
[6.5] Wisnik, José Miguel. O Coro dos Contrários: a música em torno da semana de 22. Livraria Duas Cidades, SP, sd, p. 91.
[7] Idem, pp. 74/75.
[8] Rezende, Neide. A Semana de Arte Moderna. Editora Ática, SP, 1ª Ed., 2000, p. 43.
[9] Wisnik, José Miguel. O Coro dos Contrários: a música em torno da semana de 22. Livraria Duas Cidades, SP, sd, p. 75.
[9.1] Idem, pp.78/79.
[10] Villa-Lobos. Coleção A Vida dos Grandes Brasileiros. Editores: Domingo Alzugaray e Cátia Alzugaray. Editora Três Ltda, Cajamar – SP, (edição exclusiva para assinantes das Revistas “Isto É”: Gente e Dinheiro), sd, pp. 82/83.
[10.1] Boaventura, Maria Eugênia (Org). 22 por 22: A Semana de Arte Moderna vista pelos seus contemporâneos. Edusp, São Paulo, 2000. pp. 259/260.
[10.2] Idem, pp. 131/132.
[10.3] Batista, Marta Rossetti; Lopez, Telê Porto Ancona; Lima, Yone Soares de. Brasil: 1º Tempo Modernista – 1917/29 – Documentação. Instituto de Estudos Brasileiro, São Paulo, 1972, p. 312.
[11] Andrade, Mário de & Bandeira, Manuel. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP & IEB, SP, 2ª ed., 2001 – pp. 87/88; Notas p. 89.
[11.1] Wisnik, José Miguel. O Coro dos Contrários: a música em torno da semana de 22. Livraria Duas Cidades, SP, sd, pp. 142/143.
[12] Andrade, Mário de & Amaral, Tarsila do. Correspondência Mário de Andrade & Tarsila do Amaral. Org. Aracy Amaral. EDUSP & IEB, SP, 1ª ed., 2001 – p.64/67.
[13] Prado, Yan de Almeida. A Grande Semana de Arte Moderna. Edart – Livraria Editora Ltda. – SP, 1976 – pp. 67/68.
[13.1] Idem, pp. 72/73.
[14] Idem, pp. 75/76.
[15] Bandeira, Manuel. In: Ariel – revista de cultura Musical, ano II, out. 1924, nº 13, SP.
[16] Andrade, Mário de & Bandeira, Manuel. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP/IEB, SP, 2ª ed., 2001 – p. 135.
[17] ________. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP & IEB, SP, 2ª ed., 2001 – p. 142; Notas p. 143.
[18] Idem - pp. 148/149.
[19] Idem – p. 163.
[20] Idem – p. 164; Nota: p. 165.
[21] Idem – p. 164; Nota: p. 172.
[22] Idem – pp. 176/177.
[23] Andrade, Mário de. Cartas de Mário de Andrade a Prudente de Moraes, neto – 1924/36. Organizado por Georgina Koifman e apresentação de Antonio Cândido. Nova Fronteira, RJ, 1985 – p. 74.
[24] Andrade, Mário de & Bandeira, Manuel. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP & IEB, SP, 2ª ed., 2001 – p. 220.
[25] Idem – p. 238 – Nota 131: p. 239.
[26] Idem – pp. 251/252 – Notas 158: p. 251; Notas 159/160: p. 253.
[27] Idem – p. 284.
[28] Idem – pp. 285/286.
[29] Idem – pp. 286/287.
[30] Idem – p. 288 – Notas 45: p. 289.
[31] Idem – pp. 310/311 – Notas 45 e 87: p. 311.
[32] Machado, Maria Célia. Heitor Villa-Lobos – Tradição e Renovação na Música Brasileira. Ed. Francisco Alves & UFRJ, RJ, 1987, p. 72.
[32.1] Kiefer, Bruno. Villa-Lobos e o Modernismo na Música Brasileira. 2ª Ed. Editora Movimento (Porto Alegre) & INL: Fundação Nacional Pró-Memória (Brasília), 1986, p. 137.
[32.2] Batista, Marta Rossetti; Lopez, Telê Porto Ancona; Lima, Yone Soares de. Brasil: 1º Tempo Modernista – 1917/29 – Documentação. Instituto de Estudos Brasileiro, São Paulo, 1972, pp. 336/337.
[33] Andrade, Mário de & Bandeira, Manuel. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP & IEB, SP, 2ª ed., 2001 – pp. 431/432 – Nota 35: p. 433.
[34] Guérios, Paulo Renato. Heitor Villa-Lobos: o caminho sinuoso da predestinação. Edição do Autor, Curitiba - PR, 2009, p. 186.
[35] Andrade, Mário de & Bandeira, Manuel. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP & IEB, SP, 2ª ed., 2001 – pp. 433/434 – Notas 38 e 39: p. 435.
[35.1] Batista, Marta Rossetti; Lopez, Telê Porto Ancona; Lima, Yone Soares de. Brasil: 1º Tempo Modernista – 1917/29 – Documentação. Instituto de Estudos Brasileiro, São Paulo, 1972, pp. 385/386.
[35.2] Depoimentos. Presença de Villa-Lobos, 1º V. Museu Villa-Lobos. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1965, p. 12.
[36] Machado, Maria Célia. Heitor Villa-Lobos – Tradição e Renovação na Música Brasileira. Ed. Francisco Alves & UFRJ, RJ, 1987, pp. 3/4.
[37] Andrade, Mário de & Bandeira, Manuel. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP & IEB, SP, 2ª ed., 2001 – pp. 466/467.
[38] Idem – p. 469.
[39] Prado, Yan de Almeida. A Grande Semana de Arte Moderna. Edart – Livraria Editora Ltda – SP, 1976 – pp. 81/82.
[40] Revista do IEB/USP – SP, 27, 1987 - pp. 53/57.
[41] Andrade, Mário de & Bandeira, Manuel. Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. Org. Intr. e Notas: Marco Antonio de Moraes. EDUSP & IEB, SP, 2ª ed., 2001 – p. 620.
[41.1] Franco, Afonso Arinos de Mello; Lacombe, Américo Jacobina. A Vida dos Grandes Brasileiros – Villa-Lobos. Texto de Francisco Pereira da Silva. Grupo de Comunicação Três S.A., São Paulo, 2003, pp. 143/144.
[42] Villa-Lobos. Programa de ensino de música. Departamento de Educação do Distrito Federal. Programas e Guias de Ensino. RJ, Secretaria Geral de Educação e Cultura, 1937. p. VIII.
[42.1] Andrade, Mário de. Aspectos da Música Brasileira. Obras Completas de Mário de Andrade – Vol. XI. Livraria Martins Editora, São Paulo, 1965, p. 115.
[43] Machado, Maria Célia. Heitor Villa-Lobos – Tradição e Renovação na Música Brasileira. Ed. Francisco Alves; UFRJ, RJ, 1987, pp. 43/44.
[44] Andrade, Mário de. Aspectos da Música Brasileira. Martins, S. Paulo, 1965, p. 32.
[45] _________. A Lição do Guru (Cartas a Guilherme Figueiredo) – 1937/1945. [Copyright by Guilherme Figueiredo]. Civilização Brasileira, RJ, 1989 – pp. 51 a 54.
[46] Toni, Flávia Camargo. Mario de Andrade e Villa-Lobos. Conferência apresentada no IEB/USP, a 26 de março de 1987. Revista do IEB-SP, nº 27:43-58, p. 51, 1987.
[47] Revista do IEB/USP, SP, nº 42, 1997, pp. 59/63.
[48] Machado, Maria Célia. Heitor Villa-Lobos – Tradição e Renovação na Música Brasileira. Ed. Francisco Alves; UFRJ, RJ, 1987, pp. 92 a 95.
[48.1] Andrade, Mário de. Pequena História da Música. Obras Completas de Mário de Andrade – Vol. VIII. Livraria Martins Editora, São Paulo, 1953, pp. 206/207.
[49] Idem, pp. 58/59.

[50] Vilela, Gustavo. Matéria: Multidão se despediu de Villa-Lobos em cortejo pelas ruas do Rio em 1959. In:  http://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/multidao-se-despediu-de-villa-lobos-em-cortejo-pelas-ruas-do-rio-em-1959-14582483 – acesso em setembro de 2017.

[51] Depoimentos. Presença de Villa-Lobos, 1º V. Museu Villa-Lobos. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1965, p. 41.

ILUSTRAÇÕES:

1 – Reprodução do Acervo Museu Villa-Lobos - http://www.museuvillalobos.org.br/
2 – Reprodução do livro: “Villa Lobos por Alejo Carpentier” – IMESP, 1991, P. 33.
3 – Idem, p. 43.
4 – Idem, p. 35.
5 – Idem, p. 54.
6 – Reprodução do jornal Letras & Artes – Matéria “Villa e o poeta da Vila”, de Eurico Nogueira França. Março de 1987, p. 6.
7 – Reprodução da Folha Ilustrada. Folha de S. Paulo. Edição de 27/3/1997, p. 10.
8 – Reprodução do livro: “Villa Lobos por Alejo Carpentier” – IMESP, 1991, P. 67.

bibliografia:

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- Rezende, Neide. A Semana de Arte Moderna. Editora Ática, SP, 1ª Ed., 2000;
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- Wisnik, José Miguel. O Coro dos Contrários: a música em torno da semana de 22. Livraria Duas Cidades, SP, 1977.

PESQUISA NA Internet:

VÍDEOS IMPORTANTES SOBRE VILLA-LOBOS

- Oliveira, Márcia de. Professora de Literatura e Língua Portuguesa - Graduada em Letras pela Universidade Federal do Ceará – UFC.

NOTA FINAL:
– Última atualização da Síntese Biográfica e Histórica de Villa-Lobos: Outubro de 2017, por Luiz de Almeida.

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