FELIPE D'OLIVEIRA
E A REVISTA
LANTERNA VERDE
Recebi, em agosto de 2011, solicitações para que postasse algo a respeito da revista “Lanterna Verde”. Confesso que não foi esquecimento, mas somente agora consegui disponibilidade para a postagem. Acontece que o material disponível é escasso. Grande parte do disponível encontra-se no Rio de Janeiro, dificultando a pesquisa para quem reside no interior de São Paulo. Mesmo assim, aproveitando o pouco material disponível na NET e no acervo da biblioteca do Retalhos, no texto que segue, os solicitantes e leitores poderão ter uma ideia oficial da “Lanterna Verde”. A autoria do texto é de Roselis Oliveira de Napoli, publicado no livro “Lanterna Verde”, pelo IEB/USP, em 1970, resultado de intensa pesquisa orientada e projetada pelo professor Dr. José Geraldo Castello, catedrático de Literatura Brasileira da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
O texto está descrito conforme original. Concluo a postagem com uma biografia resumida do empresário, esportista, jornalista e poeta “Felipe d’Oliveira”.
O texto está descrito conforme original. Concluo a postagem com uma biografia resumida do empresário, esportista, jornalista e poeta “Felipe d’Oliveira”.
Luiz de Almeida
Lanterna Verde foi um boletim anual, ilustrado, que a Sociedade Felipe d’Oliveira publicou no Rio de Janeiro, de 1934 a 1938, e de 1943 a 1944, num total de oito números. Não há indicação de corpo de redatores ou de direção; é citada apenas a Comissão Diretora da Sociedade Felipe d’Oliveira, constituída por Rodrigues Otávio Filho, Otávio Tarquínio de Souza, Ribeiro Couto e João Daudt d’Oliveira.
A Sociedade Felipe d’Oliveira foi fundada “em lembrança de Felipe d’Oliveira e culto à sua memória”, como nos esclarece o artigo 1.º de seus Estatutos, em 23 de agosto de 1933, data de nascimento de seu patrono. Entre os objetivos principais, visava a edição de inéditos ou a reedição de obras de Felipe d’Oliveira, a edição de obras de autores brasileiros e a publicação de um boletim anual que recebeu o nome da obra mais conhecida do poeta gaúcho, Lanterna Verde. Era composta por quinze membros: Augusto Frederico Schmidt, Álvaro Moreyra, Rodrigo Otávio Filho, Otávio Tarquínio de Sousa, Tristão da Cunha, Rui Ribeiro Couto, Renato Almeida, Renato de Toledo Lopes, Manuel de Abreu, João Daudt d’Oliveira, Edmundo da Luz Pinto, João Neves da Fontoura, José de Freitas Valle (Jacques d’Avray), Assis Chateaubriand e Ronald de Carvalho, que foi substituído, após seu falecimento, por Alceu Amoroso Lima.
O boletim não obedeceu à linha unificadora, mas procurou ser ponto de convergência dos intelectuais brasileiros, sem se prender a tendências, correntes ou opiniões dominantes. Esse propósito, expresso na página de apresentação do boletim, explica a presença de colaboradores de várias tendências e de artigos sobre diferentes manifestações da atividade cultural.
Otávio Tarquínio de Sousa, com o título de “Explicação deste Boletim”, in LVI, pp. 5-6, disserta sobre alguns objetivos do boletim “Lanterna Verde”:
“LANTERNA VERDE, nome com que se apresenta o Boletim da Sociedade Felipe d’Oliveira, em memória do grande livro do seu patrono, não precisa expor, em artigo solene, o programa, o roteiro, os fins a que se destina.
Nem essa explicação mesma, na sua singeleza, se fazia mister.
Porque a Sociedade Felipe d’Oliveira, em pouco tempo de vida, passando das simples promessas, já iniciou vitoriosamente a sua ação em prol das obras da inteligência.
A recente concessão do seu primeiro premio anual de literatura, de cinco contos de réis, ao romance de Amando Fontes, e a pensão ao escultor Antônio Caringi, para que continue a estudar na Europa, são a prova incontestável. Lanterna Verde continua a estudar na Europa, são a prova incontestável. Lanterna Verde continua essa série de realizações.
Lâmpada votiva dedicada ao culto do poeta Felipe d’Oliveira, quer ser o ponto de convergência de todos quantos em nossa terra não traem o Espírito.
Em vez de revista hermética, reservada exclusivamente aos companheiros da Sociedade, trata-se de mais livre das tribunas, aberta, franca, acessível a todas as tendências, correntes e opiniões.
Animada da mesma isenção sem infalibilidade com que confere os seus prêmios, a Sociedade não terá neste Boletim preferências pessoais, nem se subordinará a grupos, escolas ou igrejinhas.
Aqui encontrarão acolhida todas as manifestações da atividade intelectual, todos os valores espirituais e culturais.
Temos certeza de que não pregaremos no deserto. Por muito desolador que seja o ambiente intelectual do país, uma obra como a que se propõe levar avante a Sociedade Felipe d’Oliveira há de vingar sem dúvida, produzir frutos e florescer, embora o terreno pareça pouco propício.
Há indícios seguros de que na geração que ora se inicia algumas grandes figuras se marcarão. Não é necessário indicar nomes, que estão na memória de todos.
A esses, e outros que surjam, o Boletim franqueia as suas páginas, num trabalho de renovação constante que é o sinal da eterna mocidade da inteligência.
O Brasil não deve continuar a ser apenas o campo de estéreis brigas, nem é possível que entre nós só prosperem as sociedades esportivas. Sob o signo do Espírito há nobres coisas a realizar. É o que pretendemos”.
O boletim apresenta o formato de 18 x 23 cm, sendo o espelho de 13 x 17 cm, com indicação da página na parte inferior à direita. Na página de rosto temos o título, LANTERNA VERDE, em caixa alta, tipo florete, corpo 36; no centro, à esquerda, o subtítulo, BOLETIM / DA / SOCIEDADE FELIPE D’OLIVEIRA, em caixa alta, tipo kaber normal, corpo 24, 8 e 16 respectivamente; na parte inferior, à direita, indicação do número, data (mês e ano) e local de publicação, em caixa alta, kabel meio preto, corpo 8 e para os subtítulos antiga oficial, corpo 8; para a matéria, antiga oficial corpo 8 e excelsior grifo corpo 8 para as citações.
Nos números 1, 2, 3, 5 e 6 temos encartes a cores ou em preto e branco, reproduzindo pinturas, esculturas, maquetes de arquitetura, cenas teatrais, fotografias de escritores e escultores, monumentos.
Embora não obedeça a um critério rígido, apresenta geralmente duas seções, a primeira com os artigos e a segunda com o noticiário sobre letras e artes e informações sobre a Sociedade Felipe d’Oliveira (relatórios, estatutos, relação dos membros com os respectivos endereços, regulamento do prêmio Felipe d’Oliveira).
A colaboração é heterogênea e distribuída sem sistematização pelas páginas de LANTERNA VERDE. Teremos, ao lado de colaborações especificamente literárias – poesia, ficção, crônica, memórias, oratória, ensaios literários – artigos pertencentes aos diversos ramos da cultura: ensaios filosóficos, científicos, políticos, música e cinema; biografia, história, geografia e folclore. Apresenta ainda entrevistas, resenhas literárias, bibliografias e uma seção de noticiário com informações sobre as atividades da Sociedade Felipe d’Oliveira e de seus membros.
Dos oito números publicados, três foram especiais: o quarto, preocupado em fazer o inventário do Modernismo; o sétimo, dedicado aos Estados Unidos; e o oitavo, ao Rio Grande do Sul.
Ao fazer a revisão geral do Modernismo, no seu número quatro, de novembro de 1936, declara-o extinto, e apresenta as tendências da literatura brasileira após 1930. O interesse principal do Boletim está justamente nessa visão crítica do Modernismo e na apresentação, difusa através de seus números, de dados importantes para o estudo da segunda fase modernista, chamada por Tristão de Ataíde “pós-modernismo” (Ataíde, Tristão de. – Síntese – in LV4, pp. 85-98).
Entre seus colaboradores encontraremos alguns dos mais representativos escritores do período modernista, ao lado de outros que desapareceram completamente do cenário artístico e cultural. Há extensa colaboração de escritores gaúchos, posto que não particularmente significativa. Poderíamos salientar, entre os colaboradores, incluindo alguns gaúchos, os seguintes nomes: Afonso Arinos de Melo Franco, Álvaro Moreyra, Astrogildo Pereira, Atos Damasceno Ferreira, Augusto Frederico Schmidt, Augusto Mayer, Darci Azambuja, De Sousa Júnior, Érico Veríssimo, Ernâni Fornari, Gilberto Freyre, Graciliano Ramos, Ivan Pedro de Martins, Jorge Amado, Jorge de Lima, José Lins do Rêgo, Lúcia Miguel Pereira, Lúcio Cardoso, Manoel de Abreu, Manoelito de Ornellas, Manuel Bandeira, Mário de Andrade, Mário Quintana, Marques Rebêlo, Murilo Mendes, Otávio de Faria, Raul Bopp, Renato Almeida, Ronald de Carvalho, Rubem Braga, Telmo Vergara, Tristão de Ataíde, Vargas Neto, Vianna Moog, Vinícius de Morais e outros.
Podemos falar em “grupo de Lanterna Verde?”. Cremos que não, se como grupo entendermos reunião de escritores que seguem as mesmas tendências, tendo um mesmo ideário e atitudes.
O Boletim foi publicado na segunda fase modernista, depois de superado o período polêmico; o movimento já havia alcançado conquistas definitivas que se incorporaram à literatura brasileira e cada escritor traçava independentemente o seu caminho. Se bem que LANTERNA VERDE tenha sido fundada por amigos e admiradores do poeta gaúcho Felipe d’Oliveira, em parte remanescentes do grupo que se formara em torno de Graça Aranha e Ronald de Carvalho, abriu suas páginas, como dissemos anteriormente, a seguidores de todas as tendências, não se limitando a assuntos artísticos e literários, mas pretendendo ser uma publicação de caráter cultural, na acepção mais ampla. Não é possível agrupar seus colaboradores em torno dos mesmos princípios, que os consideremos globalmente, quer parcialmente. Pode-se notar a predominância de colabores do Rio de Janeiro, local de publicação do Boletim, o que justifica a ênfase dada a Graça Aranha e Ronald de Carvalho em suas páginas.
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No sítio http://w3.ufsm.br/literaturaehistoria/, o dileto leitor poderá encontrar alguns números reunidos e disponíveis da revista: LANTERNA VERDE (Anos de: 1934, 1935, 1936, 1937, 1938 e 1944). Ainda que a conservação física do material não seja de alta qualidade, na página virtual, é possível ler a íntegra dos textos. Vale a pena conferir.
SOBRE FELIPE D’OLIVEIRA
Felipe d'Oliveira - Portinari (Óleo s/ tela) |
1890 – 23 de Agosto: Nasce, em Santa Maria (RS), Felipe Daudt de Oliveira, ou Felipe D'Oliveira, filho do pernambucano Filipe Alves de Oliveira e de Maria Adelaide Daudt - seu pai foi assassinado em conflitos políticos da cidade, antes de seu nascimento;
1906 - Aos 16 anos já escrevia críticas musicais para o Correio do Povo;
1908 - Formou-se farmacêutico, pela Faculdade Livre de Medicina e Farmácia, em Porto Alegre e passou a auxiliar o tio, na Daudt, Oliveira & Cia., que se transferiu para o Rio de Janeiro. Colaborou para o jornal Correio do Povo, Gazeta de Notícias e para a Revista Fon-Fon, onde assinava com o pseudônimo Gavarni. Nessa época integrava o “Grupo dos Sete” (Homero Prates, Francisco Barreto, Carlos Azevedo, Antônio Barreto, Eduardo Guimaraens, Álvaro Moreyra e Felipe), todos gaúchos que chegam ao Rio de Janeiro, onde foram acolhidos pelos gaúchos da geração anterior que lá se haviam estabelecido: Alcides Maya, Zeferino Brasil, Marcelo Gama e outros, todos Simbolistas. Felipe também colaboraria para a revista Ilustração Brasileira, publicação de Álvaro Moreira;
1911 – Publica seu primeiro livro de poesias: Vida Extinta;
1926 – Publica seu segundo livro de poesias: Lanterna Verde. Passa a incorporar elementos das vanguardas modernistas. ;
1930 – Passou a integrar o grupo Tríade Indissolúvel, com seu tio paterno João Daudt de Oliveira e com João Neves da Fontoura, no trabalho para a vitória da Aliança Liberal. Tem o seu poema Magnificat citado, em virtude do sentimento de continentalidade americana, na conferência Poesia Moderníssima do Brasil, pronunciada na Faculdade de Letras de Coimbra pelo professor da Cadeira de Estudos Brasileiros, Dr. Manuel de Sousa Pinto;
1931 – O Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, publica na sua edição de 11 de janeiro (domingo), na página 3, a Conferência Poesia Moderníssima do Brasil;
1932 – Apoia a Revolução Constitucionalista, mesmo estando no Rio de Janeiro, pelo qual foi frequentemente procurado pela polícia, sem sucesso. Em 12 de outubro, após ter se asilado em uma embaixada, foi para o exílio na França;
1933 – 17 de fevereiro: Morre de acidente automobilístico, Auxerre, próxima a Paris, França. Foi enterrado no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro;
1933 - Em 23 de Agosto é fundada a Sociedade Felipe d’Oliveira, “em lembrança de Felipe d’Oliveira e culto à sua memória”, conforme está esclarecido no artigo primeiro de seus Estatutos;
1934 – Publicada em maio, no Rio de Janeiro, a revista LANTERNA VERDE, pela Sociedade Felipe de Oliveira. Nessa primeira edição, o primeiro texto é o prefácio, elaborado por Felipe de Oliveira para o livro que tencionava publicar: Livro Posthumo. O texto em questão data de 1925 e constitui, na prática, uma explicação concernente ao seu projeto. Sob determinado aspecto, este prefácio não deixa de lembrar a obra de Machado de Assis que, didaticamente, inaugura o Realismo no Brasil: Memórias Póstumas de Brás Cubas. Publicação de Terra Cheia de Graça;
1937 – Publicação das suas obras Alguns Poemas;
1938 – Publicação da obra em prosa Livro Póstumo.
Felipe d’Oliveira é um poeta preciso, que escolhe as palavras, que as ordena com rigor quase matemático. Influenciado por Ronald de Carvalho, outro espírito claro e luminoso, busca as “mesmas sonoridades pomposas e cheias de cor e de alegria”, conforme observa Mário de Andrade. Mais apegado ao exterior, ao espetáculo da vida, sua poesia, no geral, ressente-se de profundidade e de mistério. Mas quando se liberta da preocupação objetiva e da visão “cubista das coisas e das emoções”, - nele percebidas por Menotti Del Picchia -, que o levam a virtuosismos de construção, pode atingir plenamente o sentimento, a poesia, sem prejuízo do seu gosto comedido e discreto. É o que ocorre com “O epitáfio que não foi gravado”, que Mário de Andrade chega mesmo a considerá-lo “um dos mais lindos poemas da poesia contemporânea do Brasil”. Felipe pode ser visto como a primeira manifestação, dentro do modernismo, em favor do cuidado formal. Em 1927 foi combatido por João Alphonsus, que acusava serem os seus “poemas bem feitos demais”. Viam, no poeta, nessa época, um neoparnasiano.
1906 - Aos 16 anos já escrevia críticas musicais para o Correio do Povo;
1908 - Formou-se farmacêutico, pela Faculdade Livre de Medicina e Farmácia, em Porto Alegre e passou a auxiliar o tio, na Daudt, Oliveira & Cia., que se transferiu para o Rio de Janeiro. Colaborou para o jornal Correio do Povo, Gazeta de Notícias e para a Revista Fon-Fon, onde assinava com o pseudônimo Gavarni. Nessa época integrava o “Grupo dos Sete” (Homero Prates, Francisco Barreto, Carlos Azevedo, Antônio Barreto, Eduardo Guimaraens, Álvaro Moreyra e Felipe), todos gaúchos que chegam ao Rio de Janeiro, onde foram acolhidos pelos gaúchos da geração anterior que lá se haviam estabelecido: Alcides Maya, Zeferino Brasil, Marcelo Gama e outros, todos Simbolistas. Felipe também colaboraria para a revista Ilustração Brasileira, publicação de Álvaro Moreira;
1911 – Publica seu primeiro livro de poesias: Vida Extinta;
1926 – Publica seu segundo livro de poesias: Lanterna Verde. Passa a incorporar elementos das vanguardas modernistas. ;
1930 – Passou a integrar o grupo Tríade Indissolúvel, com seu tio paterno João Daudt de Oliveira e com João Neves da Fontoura, no trabalho para a vitória da Aliança Liberal. Tem o seu poema Magnificat citado, em virtude do sentimento de continentalidade americana, na conferência Poesia Moderníssima do Brasil, pronunciada na Faculdade de Letras de Coimbra pelo professor da Cadeira de Estudos Brasileiros, Dr. Manuel de Sousa Pinto;
1931 – O Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, publica na sua edição de 11 de janeiro (domingo), na página 3, a Conferência Poesia Moderníssima do Brasil;
1932 – Apoia a Revolução Constitucionalista, mesmo estando no Rio de Janeiro, pelo qual foi frequentemente procurado pela polícia, sem sucesso. Em 12 de outubro, após ter se asilado em uma embaixada, foi para o exílio na França;
1933 – 17 de fevereiro: Morre de acidente automobilístico, Auxerre, próxima a Paris, França. Foi enterrado no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro;
1933 - Em 23 de Agosto é fundada a Sociedade Felipe d’Oliveira, “em lembrança de Felipe d’Oliveira e culto à sua memória”, conforme está esclarecido no artigo primeiro de seus Estatutos;
1934 – Publicada em maio, no Rio de Janeiro, a revista LANTERNA VERDE, pela Sociedade Felipe de Oliveira. Nessa primeira edição, o primeiro texto é o prefácio, elaborado por Felipe de Oliveira para o livro que tencionava publicar: Livro Posthumo. O texto em questão data de 1925 e constitui, na prática, uma explicação concernente ao seu projeto. Sob determinado aspecto, este prefácio não deixa de lembrar a obra de Machado de Assis que, didaticamente, inaugura o Realismo no Brasil: Memórias Póstumas de Brás Cubas. Publicação de Terra Cheia de Graça;
1937 – Publicação das suas obras Alguns Poemas;
1938 – Publicação da obra em prosa Livro Póstumo.
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O EPITÁFIO QUE NÃO FOI GRAVADO
Felipe d’Oliveira é um poeta preciso, que escolhe as palavras, que as ordena com rigor quase matemático. Influenciado por Ronald de Carvalho, outro espírito claro e luminoso, busca as “mesmas sonoridades pomposas e cheias de cor e de alegria”, conforme observa Mário de Andrade. Mais apegado ao exterior, ao espetáculo da vida, sua poesia, no geral, ressente-se de profundidade e de mistério. Mas quando se liberta da preocupação objetiva e da visão “cubista das coisas e das emoções”, - nele percebidas por Menotti Del Picchia -, que o levam a virtuosismos de construção, pode atingir plenamente o sentimento, a poesia, sem prejuízo do seu gosto comedido e discreto. É o que ocorre com “O epitáfio que não foi gravado”, que Mário de Andrade chega mesmo a considerá-lo “um dos mais lindos poemas da poesia contemporânea do Brasil”. Felipe pode ser visto como a primeira manifestação, dentro do modernismo, em favor do cuidado formal. Em 1927 foi combatido por João Alphonsus, que acusava serem os seus “poemas bem feitos demais”. Viam, no poeta, nessa época, um neoparnasiano.
O EPITÁFIO QUE NÃO FOI GRAVADO
Todos sentiram quando a morte entrou
com um frêmito apressado de retardatária.
A que tinha de morrer, - a que a esperava, -
fechou os olhos
fatigados de assistirem ao mal-entendido da vida.
Os que a choravam sabiam-na sem pecado,
consoladora dos aflitos,
boca de perdão e de indulgência,
corpo sem desejo,
voz sem amargor.
A que tinha de morrer fechou os olhos fatigados,
mas tranqüilos...
Porque os que a choravam nunca saberiam
o rancor sem perdão de sua boca,
o desejo saciado de seu corpo,
o amargor de sua voz,
a sua angústia de arrastar até o fim a alma postiça que lhe fizeram,
o seu cansaço imenso de abafar, secretos, na carne ansiosa,
a perfeição e o orgulho de pecar.
A que tinha de morrer fechou os olhos para sempre
e os que a choravam
nunca souberam de alguém que foi de todos junto ao leito à hora do exausto coração parar
o mais distante,
o mais imóvel,
o que não soluçou
que não pode erguer as pálpebras pesadas,
o que sentiu chamar no sangue o desespero de sobreviver,
o que estrangulou na garganta o grito dilacerado do solitário,
o que depois, sobre a serenidade da morte purificadora,
a redenção do silêncio,
como uma pedra votiva do sepulcro.
(Lanterna Verde – Edição de Pimenta de Melo e Cia. RJ, 1926. Pp. 66-69).
FONTES PESQUISADAS:
- Coutinho, Afrânio. A Literatura no Brasil. Vol. III. 2ª Ed. Livraria São José – Rio de Janeiro, 1964;
- Napoli, Roselis Oliveira de. Lanterna Verde. IEB/USP – São Paulo, 1970;
- Martins, Wilson. A Literatura Brasileira. Vol. VI: O Modernismo (1916-1945). Ed. Cultrix – São Paulo, 1965;
- Moisés, Massaud. História da Literatura Brasileira – Modernismo. Cultrix/Edusp – São Paulo, 10ª Ed. 1995.
- http://asorrir.blogspot.com/2009/06/felipe-daudt-de-oliveira.html
- http://w3.ufsm.br/literaturaehistoria/
- http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/1954/1093
- http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/rio_grade_sul/felipe_de_oliveira.html
- http://www.ufsm.br/editora/catalogo/f.htm
- http://www.scielo.br/pdf/cpa/n23/n23a06.pdf